A Civilização Lambayeque (ou Sicán) floresceu entre c. 750 e c. 1375 na costa setentrional do Peru, abrangendo os períodos do Horizonte Médio e Intermediário Tardio dos Andes Centrais. Com uma incrível produção de objetos artísticos, máscaras e trabalho em ouro, os lambayeques fizeram uma contribuição significativa para o progresso da arte andina e seu legado, incluindo algumas das mais famosas iconografias da América antiga.
Panorama Histórico
O fundador da dinastia lambayeque, segundo a tradição, foi Naymlap, que, com uma comitiva de guerreiros, veio do sul navegando em jangadas ou balsas e colonizou os vários vales da região, uma lenda apropriada pela Civilização Chimú, que dominou a região posteriormente. A primeira cidade chamava-se Chot (atualmente identificada como Huaca Chotuna) e a dinastia teria governado por 12 gerações, até o último líder, Fempellec. Na verdade, o período da cultura lambayeque provavelmente começou no século VIII, quando emergiu das sombras do grupo dominante anterior, a Civilização Wari. Em vez de um império unificado, os governantes lambayeques supervisionavam, através de laços de parentesco, uma rede mais ou menos autônoma de cidades.
Um dos sítios mais importantes dos lambayeques, Batán Grande ('Grande Bigorna'), está localizado no Vale La Leche. Ele contém um sistema de canais de irrigação, além de 17 enormes túmulos, o maior dos quais, chamado Huaca Corte, abrange uma área de 250 metros quadrados. Nestes outeiros piramidais existem tumbas com fardos contendo múmias, além de vítimas de sacrifícios e artigos de luxo feitos com ligas de cobre, prata e ouro. Por exemplo, encontraram-se centenas de taças ou copos de ouro com figuras em relevo de governantes. Batán Grande foi abandonada por volta de 1100, provavelmente devido a crises relacionado ao fenômeno climático El Niño (inundações seguidas de secas prolongadas), ainda que os edifícios também mostrem sinais de destruição deliberada pelo fogo. Túcume tornou-se então a nova capital religiosa e cresceu para cobrir 370 hectares, transformando-se no maior centro cerimonial já construído nos antigos Andes.
O núcleo de produção de artigos de metal dos lambayeques situava-se em Cerro Huaringa, onde as escavações arqueológicas revelaram fornos de fundição e oficinas. Deve-se destacar em especial os lingotes de cobre em forma de I (naipes), empregados como moeda no auge da cultura lambayeque, entre 900 e 1100, um exemplo raro de moeda corrente nas antigas Américas.
Os líderes lambayeques parecem não ter feito nenhuma tentativa de conquista regional, mas acabaram sendo derrotados e assimilados ao império chimú, por volta de 1375, e seus artesãos foram transferidos à força para Chan Chan, a capital chimú. Desta forma, a arte andina manteve sua continuidade através de sucessivas culturas e iconografias típicas, como os governantes com cocares em forma de crescente, formas de cerâmica e técnicas de metalurgia.
Arte Lambayeque
A enorme riqueza da sociedade lambayeque transparece claramente em sua arte e arquitetura. Seus palácios eram construídos como recintos maciços numa vasta área de terreno e o ouro predomina em todos os tipos de mercadorias, desde ornamentos corporais até máscaras. Certamente sem timidez em exibir sua riqueza, a elite usava túnicas bordadas com painéis de ouro; um exemplo sobrevivente tem 2000 deles, além de grandes brincos em ouro e turquesa, magníficos cocares de penas e até luvas douradas. O termo "consumo conspícuo" parece ter sido cunhado com a elite lambayeque em mente.
A típica cerâmica lambayeque inclui louça negra esculpida e polida e o uso de moldes para produção em massa. A decoração em relevo tem aspectos elaborados, com rostos humanos adicionados perto do bico, assim como figuras de animais. As vasilhas inspiradas na Civilização Moche, com bico duplo, estão em maioria, mas com uma alça esculpida de maneira intrincada e pés largos característicos. Descobriram-se também exemplares feitos com prata.
Os lambayeques se especializaram na metalurgia, particularmente o trabalho com ouro, no qual a liga com este metal era gravada, batida em moldes, cortada, colada ou soldada e então incrustada. Algumas das mais famosas obras de arte dos Andes provêm dos lambayeques como, por exemplo, as facas cerimoniais em ouro (tumi), com o cabo representando um senhor sicán. Incrustada com turquesa, a figura do cabo, como na vida real, usa um adorno de cabeça majestoso e vários brincos, além de pequenas asas nos ombros, um nariz parecido com um bico, às vezes com garras, sempre com os típicos olhos em forma de lágrima característicos desta cultura. A figura talvez represente Naymlap, já que, segundo a lenda, o primeiro governante teria criado asas e voado em direção ao pôr do sol. As facas tumi eram usadas para cerimônias de sacrifício humano envolvendo decapitação e as versões funcionais possuíam afiadas lâminas de bronze.
Um dos mais famosos objetos de arte lambayeque é a magnífica máscara de ouro e o conjunto de cocares descobertos na Tumba 1 do túmulo Huaca Loro, em Batán Grande. A máscara pintada de vermelho tem brincos e uma cabeça de morcego tridimensional dourada na testa, enquanto o grande cocar contém penas douradas e 15 discos de ouro suspensos. A máscara pertencia a um homem sentado, com idade variando entre 40 e 50 anos, sepultado no fundo de um poço com 11 metros de profundidade, numa tumba de nove metros quadrados. O líder estava acompanhado em sua próxima vida com um vasto conjunto de objetos preciosos e cotidianos, vestimentas e cerâmicas.
Também deve-se fazer uma menção especial às liteiras lambayeques descobertas nas tumbas. Feitas de madeira e decoradas com ouro, elas contêm, com frequência, estatuetas de governantes e, originalmente, estavam enfeitadas com plumas. Os têxteis dos lambayeques são um tanto excêntricos se comparados com a delicadeza de outros tecelões andinos, com bordas cortadas de forma irregular e fios soltos na parte de trás, talvez indicando a pressão para se produzir quantidade em lugar de qualidade. Os motivos decorativos populares incluem animais, peixes e o líder em pé, semelhante ao que pode ser visto em outras obras de arte. Finalmente, as conchas (especialmente a da ostra espinhosa da costa do Equador) estão entre as mais populares formas de joalheria e material de incrustação, uma tradição mantida pelos chimú após a conquista do Vale de Lambayeque.