Guerra do Antigo Egito

Definição

Joshua J. Mark
por , traduzido por Ramon Garcia
publicado em 03 outubro 2016
Disponível : Inglês, francês, espanhol
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Egyptian War Chariot in Action (by Simon Seitz, CC BY-NC-SA)
Carruagem de Guerra Egípcia em Ação
Simon Seitz (CC BY-NC-SA)

A paleta de Narmer, uma gravação cerimonial do Antigo Egito, retrata o grande Rei Narmer (c. 3150 a.C.) conquistando seus inimigos com o apoio e aprovação de seus deuses. Esta peça, datada de c. 3200-3000 a.C., foi inicialmente considerada uma representação histórica precisa da unificação do Egito sob Narmer, o primeiro rei da primeira dinastia do Egito.

Contudo, revisões recentes no meio acadêmico reinterpretam o artefato como uma representação simbólica desse evento histórico, sugerindo que Narmer (também conhecido como Menes) pode ou não ter unificado o país pela força. Essas análises destacam que o conceito de rei como um grande guerreiro era um valor cultural significativo, razão pela qual Narmer foi retratado como um conquistador.

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Os grandes reis da Mesopotâmia, especialmente os governantes assírios, deixaram muitas inscrições documentando suas vitórias militares, prisioneiros capturados e cidades destruídas, mas, para a maioria da história antiga do Egito, tais registros não existem. Os egípcios consideravam sua terra como a mais perfeita do mundo e estavam mais focados em preservar o que possuíam do que em conquistar novos territórios. Os primeiros registros de guerra egípcia estavam todos relacionados à agitação civil e não à conquista de outras terras. Esse paradigma se manteve desde o Período Dinástico Inicial (c. 3150-2613 a.C.) até o tempo do Império Médio (2040–1782 a.C.). Durante esse período, os reis da 12ª Dinastia mantiveram um exército permanente e lideraram campanhas militares além das fronteiras egípcias.

O desenvolvimento da Guerra Profissional

Embora os estudiosos modernos discordem sobre se Narmer uniu o Egito através da conquista, não há dúvida de que uma força militar sob um líder forte era necessária para manter o país unido. Ao longo do Período Dinástico Inicial no Egito, há evidências de agitação, talvez até mesmo de uma divisão do país em certos momentos, e guerras civis entre facções que lutavam pelo trono.

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Durante o período do Novo Reino, o Egito expandiu seu império e esteve constantemente em guerra. Tutemósis III liderou pelo menos 17 campanhas diferentes em 20 anos.

Durante a época do Reino Antigo (c. 2613-2181 a.C.), o governo central confiava em nomarcas (governadores regionais) para fornecer homens para o exército. O governador conscritaria soldados em sua região e os enviaria ao rei. Cada batalhão carregava estandartes com o totem de seu distrito, o (nome) e as suas lealdades estavam com sua comunidade, seus irmãos de armas e seu nomarca. A eficácia desta milícia inicial é atestada pelas campanhas bem-sucedidas em Núbia, Síria e Palestina dos monarcas do Antigo Reino, que visavam tanto assegurar as fronteiras quanto reprimir levantes ou conquistar recursos para a coroa. Os soldados lutaram pelo rei e seu país, mas não eram um exército egípcio Unido, eram, na verdade, um conjunto de unidades militares menores lutando por um objetivo comum. Os conscritos eram frequentemente suplementados por mercenários nubianos, que demonstravam lealdade ao rei, desde que fossem pagos.

O aumento do poder dos nomarcas individuais foi um dos fatores que contribuíram para o colapso do Reino Antigo e o início do Primeiro Período Intermediário do Egito (c. 2181-2040 a.C.). O governo central em Mênfis tornou-se irrelevante, pois cada nomarca passou a controlar sua própria região, construindo templos em sua própria homenagem, em vez de honrar o rei, e utilizando sua milícia para seus próprios propósitos. Em uma tentativa de recuperar parte do prestígio perdido, os reis de Mênfis transferiram a capital para Heracleópolis, uma cidade de localização mais central. Contudo, eles não foram mais eficazes nessa nova sede do que haviam sido na anterior e acabaram derrubados por Mentuhotep II (c. 2061–2010 a.C.), de Tebas, que deu início ao período do Reino Médio do Egito.

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Narmer Conquering His Enemies
Narmer derrotando seus inimigos
Unknown (Public Domain)

É provável que Mentuhotep II liderasse um exército de conscritos de Tebas, mas ele já poderia ter mobilizado uma força de combate profissional em seu distrito. Também é totalmente possível que houvesse um núcleo de soldados profissionais que lutavam pelo rei desde o período pré-dinástico no Egito (c. 6000-3150 a.C.), embora as evidências para isso não sejam claras. A maioria dos estudiosos concorda que foi o sucessor de Mentuhotep II, Amenemhat I (c. 1991–1962 a.C.), quem criou o primeiro exército permanente no Egito. Isso faria muito sentido, pois teria retirado poder dos nomarcas individuais e colocado nas mãos do rei. O rei agora tinha controle direto de um exército que era leal a ele e ao país como um todo, não a diferentes nomarcas e suas regiões.

Exércitos e armas no Antigo Reino

As armas dos períodos pré-dinásticos e início do poderio dinastico eram principalmente maças, adagas e lanças. Durante o Antigo Reino, o arco e flecha, entre outras armas, foram incorporados, como explica a historiadora Margaret Bunson:

Os soldados do reino antigo eram retratados usando capacetes de caveira e carregando totens de clã ou de nomo. Eles empunhavam maças com cabeças de madeira ou de pedra em forma de pera. Arcos e flechas eram equipamentos padrão, pontas de flecha quadradas feitas de sílex e aljavas de couro. Alguns escudos, confeccionados com peles, estavam em uso, embora não de maneira generalizada. A maioria das tropas andava descalça, vestindo somente saias simples ou completamente nuas. (168)

Os egípcios utilizavam um arco simples, de curva única, que era difícil de manejar, tinha alcance limitado e precisão questionável. Os soldados, todos oriundos da população rural de classe baixa, recebiam pouco treinamento. É improvável, embora não impossível, que tivessem experiência com o arco na caça. Já que os camponeses não possuíam terras no Egito e a caça era proibida sem a permissão dos proprietários de terras da elite. Além disso, a dieta egípcia era predominantemente vegetariana, e a caça era considerada um esporte reservado à realeza. Ainda assim, quando arqueiros disparavam em massa a partir de uma posição próxima, essas armas podiam ser bastante eficazes. Após um ou dois disparos de flechas, os soldados avançavam sobre os oponentes com armas de combate corpo a corpo. Nessa época, a marinha egípcia servia somente para transportar tropas, sem envolvimento em combates contra inimigos.

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Egyptian Soldiers
Soldados Egípcios
Σταύρος (CC BY)

Guerra do Reino Médio

Na época do Reino Médio, as tropas carregavam machados e espadas de cobre. A lança longa de bronze tornou-se padrão, assim como a armadura corporal de couro sobre saias curtas. O exército era mais bem organizado, contando com um ministro da guerra e um comandante-chefe do exército, ou um oficial que atuava nessa função. (Bunson, 169). Essas tropas profissionais eram altamente treinadas e havia “tropas de choque” de elite usadas como vanguarda. Oficiais comandavam um número não especificado de homens em suas unidades e reportavam a um comandante, que, por sua vez, seguia a cadeia de comando; não está claro quais eram exatamente as responsabilidades individuais ou como eram chamados, mas a vida militar oferecia, nesse período, oportunidades muito maiores do que no passado. O historiador Marc van de Mieroop escreve:

Embora nosso conhecimento sobre o exército no Reino Médio seja muito limitado, parece que seu papel na sociedade era bem mais significativo do que no Reino Antigo. O exército era bem estruturado e, na 12ª dinastia, contava com um núcleo de soldados profissionais. O exército oferecia uma oportunidade para homens ambiciosos construírem carreiras. A maioria das tropas, no entanto, continuava sendo recrutada das populações das províncias e participava somente de campanhas específicas. Quantos soldados estavam envolvidos e por quanto tempo serviam permanece desconhecido. (112)

O exército do Reino Médio atingiu seu auge sob o reinado do rei guerreiro Senusret III (c. 1878–1860 a.C.), que serviu de modelo para o lendário conquistador Sesóstris, mais tarde celebrado por escritores gregos. Senusret III liderou seus homens em grandes campanhas na Núbia e na Palestina, aboliu o cargo de nomarca, assumiu controle mais direto das regiões de origem de seus soldados e fortificou as fronteiras do Egito com guarnições militares.

Egyptian War Chariot
Carruagem de Guerra Egípcia
Unknown (Public Domain)

As contribuições dos Hicsos

Os reis da 12ª Dinastia, como Senusret III, foram governantes fortes que contribuíram muito para a estabilidade egípcia, mas a 13ª Dinastia foi mais fraca e não conseguiu manter um governo central eficaz. Os Hicsos, um povo semita que emigrou da Síria-Palestina, estabeleceram-se no Baixo Egito, em Avaris, e, com o tempo, acumularam riqueza suficiente para exercer poder político. A ascensão dos Hicsos, sinalizou o início do Segundo Período Intermediário no Egito (c. 1782–1570 a.C.), quando o país estava dividido entre os Hicsos no Norte, os egípcios no centro e os núbios ao sul. Essa situação perdurou, com os três envolvidos em comércio e uma paz instável, até que o rei egípcio em Tebas, Seqenenra Taa (1580 a.C.) sentiu-se desafiado por Apepi, o rei hicso em Avaris, e atacou. Os Hicsos foram finalmente expulsos do Egito por Ahmose I (c. 1570–1544 a.C.) de Tebas, e esse evento marca o início do Novo Reino do Egito.

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Egyptian Bronze Sword
Espada de Bronze Egípcia
Guillaume Blanchard (CC BY-SA)

O exército egípcio durante o Segundo Período Intermediário era amplamente composto pelos Medjay, guerreiros núbios que lutavam como mercenários. Os Medjay serviam como batedores, infantaria leve e, finalmente, como unidades de cavalaria. Antes da chegada dos Hicsos, o cavalo era desconhecido no Egito e, consequentemente, também o veículo de guerra. Embora escritores egípcios e gregos posteriores tenham caracterizado o tempo dos Hicsos como uma era sombria de caos e destruição, os reis estrangeiros introduziram várias inovações significativas na cultura, especialmente no que diz respeito à guerra e armamento. A egiptóloga Barbara Watterson observa:

Os Hicsos, sendo originários do oeste da Ásia, trouxeram os egípcios ao contato com os povos e a cultura daquela região como nunca e os apresentaram ao veículo de guerra puxado por cavalos; a um arco composto feito de madeira reforçada com tiras de tendão e chifre, uma arma mais elástica com maior alcance do que o simples arco deles; a uma espada em forma de cimitarra, chamada Khopesh, e a uma adaga de bronze com uma lâmina estreita fundida em uma única peça com o cabo. Os egípcios desenvolveram essa arma em uma espada curta. (60)

O Egito nunca havia sido invadido e ocupado por uma potência estrangeira antes, e os governantes do Novo Reino (1570–1069 a.C.) queriam garantir que isso nunca acontecesse novamente. Os primeiros reis desse período, portanto, colocaram ênfase particular em expandir as fronteiras do país para criar zonas de amortecimento e, ao fazê-lo, lançaram o Império Egípcio.

O exército do Império

O período do Novo Reino é o mais conhecido pelo público moderno, com alguns dos governantes mais famosos (Hatshepsut, Tutemósis III, Seti I, Ramsés II). Foi o período em que o Egito atingiu seu auge em prestígio, poder e riqueza. Van de Mieroop escreve:

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O Egito do Novo Reino era um estado imperialista: o país anexava territórios fora das fronteiras tradicionais e controlava-os para seu próprio benefício. Esta política teve suas raízes em períodos anteriores, quando a conquista militar era uma parte regular dos deveres reais, mas atingiu o pico no Novo Reino, quando o Egito estava em um estado quase permanente de guerra. (157)

Statue of King Thutmose III
Estátua do Rei Tutmósis III
Osama Shukir Muhammed Amin (Copyright)

O Império do Novo Reino começa com a perseguição de Ahmose I aos hicsos para fora do Egito, através da Palestina e até a Síria, mas começa realmente com o reinado de Amenhotep I (c. 1541–1520 a.C.), que expandiu as fronteiras do Sul até a Núbia. Tutemósis I (1520–1492 a.C.) foi além e fez campanha através da Palestina e da Síria até a Mesopotâmia, alcançando o rio Eufrates. A rainha Hatshepsut (1479–1458 a.C.) enviou expedições à Núbia e à Síria e organizou uma missão comercial em Punt, que incluía uma escolta militar. Tutemósis III (também conhecido como Tutemés III, ou Tutmés III, 1458–1425 a.C.), no entanto, é considerado o maior rei guerreiro do início do Novo Reino, conquistando a Líbia, expandindo-se para a Núbia e garantindo regiões em todo o Levante. Tutemósis III, liderando pelo menos 17 campanhas diferentes em 20 anos, estabeleceu o Império Egípcio em seu auge e, para isso, necessitou de um exército profissional. Bunson escreve:

O exército não era mais uma confederação de recrutas dos nomos, mas uma força militar de primeira classe. O rei era o comandante em chefe, mas o vizir e outra série administrativa de unidades cuidavam dos assuntos logísticos e de reserva… O exército era organizado em divisões, tanto de carruagem como de infantaria. Cada divisão contava com aproximadamente 5.000 homens. Essas divisões carregavam os nomes das principais divindades da nação. (170)

Sob essa nova organização, a cadeia de comando em uma divisão, do degrau mais baixo ao mais alto, era estritamente hierárquica. Em cada divisão, havia um oficial encarregado de 50 soldados que se reportava a um oficial superior encarregado de 250 homens. Este oficial, por sua vez, reportou-se a um capitão que era responsável perante um comandante de tropa. Acima do comandante da Tropa estava o superintendente da Tropa, um oficial militar encarregado de uma guarnição, que se reportava ao superintendente da fortificação, um oficial superior encarregado dos fortes onde a divisão estava estacionada, que se reportava a um tenente-comandante. O tenente-comandante reportava-se ao general que era responsável perante o vizir egípcio e o Faraó.

Ramesses II at The Battle of Kadesh
Ramsés II na Batalha de Kadesh
Cave cattum (CC BY-SA)

Um aspecto importante deste novo exército foi a biga puxada por cavalos introduzida pelos Hicsos. Van de Mieroop observa como: “Os condutores de biga eram combatentes treinados e também homens de riqueza, que forneciam seu próprio equipamento. Eles recebiam maiores recompensas do que os outros soldados e tinham um elevado estatuto social” (158). Os egípcios modificaram a biga dos Hicsos para torná-la mais leve, mais manobrável e mais rápida. Cada biga continha dois homens, um condutor e um guerreiro, que usavam armadura de escama na parte superior do corpo e saias leves na parte inferior. O motorista era um cocheiro altamente treinado que controlava o veículo, enquanto o guerreiro, armado com um arco, flechas e uma lança, enfrentava o inimigo. As forças das carruagens foram divididas em esquadrões de 12 carruagens e 24 homens, com um décimo terceiro como comandante do esquadrão.

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Foi esse exército que expandiu o Egito em um império e permitiu os reinados opulentos de faraós como Amenhotep III (1386–1353 a.C.), sob cujo governo o Egito desfrutou de paz e prosperidade sem precedentes. Embora houvesse conflitos durante seu governo, o exército foi eficaz em manter essas desavenças afastadas das fronteiras do Egito. Sob o comando de Ramsés II (1279–1213 a.C.), esse mesmo exército enfrentou os hititas na famosa Batalha de Kadesh, em 1274 a.C.

Ramsés II mudou a capital do Egito de Tebas para uma nova cidade que ele construiu no antigo local de Avaris, no Baixo Egito, Per-Ramsés (“Cidade de Ramsés”). Como de costume, este faraó não poupou despesas em esbanjar sua nova capital com adornos e monumentos, templos aos deuses e belos edifícios, mas, como explica o egiptólogo Toby Wilkinson, havia mais coisas acontecendo em Per-Ramsés do que avanços arquitetônicos e festivais religiosos.

Enquanto os escribas e poetas da corte enalteciam Per-Ramsés como uma grandiosa residência real, repleta de exuberância e alegria, havia também um lado mais sombrio nesse ambicioso projeto. Um dos maiores edifícios da cidade era uma imensa fábrica de fundição de bronze, onde centenas de trabalhadores dedicavam seus dias à produção de armamentos. Fornos de alta temperatura, avançados para a época, eram alimentados por tubos de sopro acionados por foles. Conforme o metal fundido era extraído, operários exaustos e suados o despejavam em moldes para fabricar escudos e espadas. Em condições sujas, quentes e perigosas, o povo do faraó produzia as armas para seu exército. Outra área significativa da cidade era reservada a estábulos, campos de treinamento e oficinas destinadas ao corpo de carroças do rei. Em suma, Per-Ramsés era menos um refúgio de prazer e mais um complexo militar-industrial. (Wilkinson, 314).

Ramsés II partiu de Per-Ramsés para sua campanha contra os hititas, liderando sua carruagem à frente de quatro divisões de 20.000 homens. De acordo com suas inscrições, a batalha foi uma vitória para os egípcios. Contudo, seu adversário, Muwatalli II, do Império Hitita, proclamou o mesmo triunfo para seu lado. Hoje, os estudiosos concordam que a Batalha de Kadesh foi, na verdade, um empate, mais do que uma vitória decisiva para qualquer das partes. Ainda assim, Ramsés dedicou-se a registrar os detalhes de sua suposta glória e a divulgá-los amplamente por todo o país. O conflito culminou no primeiro tratado de paz conhecido da história, firmado entre os impérios egípcio e hitita em 1258 a.C.

Hittite War Chariot
Carruagem de Guerra Hitita
Karen Barrett-Wilt (CC BY-NC-SA)

A Marinha Egípcia

Além do exército e da cavalaria, o Antigo Egito contava com um terceiro ramo militar: a marinha. Como observado, durante o Antigo Império, essa força era usada principalmente para o transporte de tropas de infantaria. Mesmo no Segundo Período Intermediário, o faraó Kamose recorria à marinha somente como um meio de deslocar suas tropas pelo Nilo em campanhas contra Avaris. No entanto, foi no Novo Império que a marinha adquiriu maior prestígio e relevância, especialmente diante das ameaças de invasores estrangeiros que buscavam conquistar o Egito pelo mar.

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Os mais notórios e bem documentados desses invasores foram os Povos do Mar, um grupo enigmático cuja origem exata ainda é incerta. Provavelmente uma coalizão de diferentes etnias, eles atacaram as costas do Mediterrâneo entre cerca de 1276 e 1178 a.C., possivelmente desempenhando um papel decisivo no colapso das civilizações da Idade do Bronze. Ramsés II, seu sucessor Merenptah (1213–1203 a.C.) e Ramsés III (1186–1155 a.C.) lutaram contra os povos do mar durante seus reinados.

Ramsés II, que tinha uma rede de inteligência muito eficiente, soube da invasão que se aproximava a tempo de colocar sua marinha ao longo da costa, na foz do Nilo. Ele então posicionou uma pequena frota em uma posição defensiva para atrair os navios dos povos do mar para uma armadilha. Uma vez que eles estavam em posição, ele soltou seus navios mais numerosos e maiores dos lados e destruiu seu oponente.

Este combate, como muitos outros da Marinha egípcia, foi travado no mar por tropas terrestres. Embora os soldados fossem treinados para lutar na água, não eram marinheiros. Os egípcios não eram um povo marítimo e a sua marinha dá provas disso. Os navios eram muitas vezes incrivelmente grandes, com uma tripulação de cerca de 250 homens. Navios menores continham uma tripulação de 50, sendo 20 deles delegados para remar, velejar, manobrar o navio e 30 designados para o combate. Embora Ramsés II tenha enfatizado sua vitória em uma batalha marítima, na verdade, foi uma batalha terrestre travada na água. Os navios egípcios fecharam-se com os dos povos do mar, permitindo o embarque e depois o afundamento dos navios inimigos; os próprios navios não lutaram.

Egyptian Warship Model
Modelo de Navio de Guerra Egípcio
Deror avi (CC BY)

O mesmo se aplica ao envolvimento de Ramsés III com os povos do mar. Ele incorporou o truque de seu antecessor de atrair os povos do mar para uma armadilha e depois confiou na guerra de guerrilha para destruí-los. Merenptah evitou totalmente um combate marítimo e encontrou o inimigo em terra em Pi-yer, onde seu exército do Novo Reino abateu mais de 6.000 soldados inimigos.

O verdadeiro valor da Marinha egípcia era a intimidação de potenciais invasores e o transporte rápido de tropas terrestres. Tutemósis III, por exemplo, utilizou-a com eficácia em várias campanhas. Embarcações de carga antigas eram frequentemente adaptadas para missões navais, navegando tanto rio acima quanto rio abaixo. Os navios contavam com defesas para proteger a tripulação de projéteis inimigos e, em alguns casos, eram aprimorados para maior manobrabilidade.

Declínio das Forças Armadas Egípcias

Ramsés III foi o último faraó eficaz do Novo Reino e, depois da sua morte, os grandes sucessos militares tornaram-se cada vez mais raros. Seus sucessores, sem força para sustentar o império, permitiram seu desmoronamento. Um fator que contribuiu para este declínio foi, na verdade, a decisão de Ramsés II de construir Per-Ramsés e transferir o seu capital para lá de Tebas. Tebas foi o local do Grande Templo de Amon em Karnak e os sacerdotes de Amon, não somente lá, mas em todo o Egito, eram muito poderosos. Em Tebas, o Templo de Amon em Karnak abrigava sacerdotes poderosos que, com a mudança para Per-Ramsés, ganharam liberdade para acumular ainda mais riqueza e influência. No reinado de Ramsés XI (1107–1077 a.C.), o país dividiu-se entre seu governo em Per-Ramsés e o dos sacerdotes de Amon em Tebas.

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Essa cisão iniciou o Terceiro Período Intermediário (c. 1069–525 a.C.). O poder marítimo egípcio foi superado pelas marinhas grega e fenícia, mais rápidas, equipadas e tripuladas por experientes navegadores. Por volta de 1000 a.C., o Egito entrou na Idade do Ferro II, produzindo armas e ferramentas de ferro. O ferro forjado exigia carvão de madeira queimada, no entanto, e o Egito tinha poucas árvores. Em 671 a.C., o país foi invadido pelo rei assírio Esarhaddon que, com seu exército profissional empunhando armas de ferro, massacrou o exército egípcio, incendiou a cidade de Memphis e levou cativos reais de volta a Nínive. Em 666 a.C., seu filho Assurbanipal invadiu o Egito e conquistou regiões além de Tebas. Mais uma vez, as armas de ferro, melhores armaduras e táticas dos assírios provaram ser superiores aos militares egípcios.

Assyrian Battle Scene
Cena de Batalha Assíria
Osama Shukir Muhammed Amin (Copyright)

O período tardio do antigo Egito (525–332 a.C.) começa após as invasões assírias, marcado pelo poder decrescente dos governantes egípcios e pela guerra incessante. A realeza egípcia lutou entre si pela supremacia usando mercenários gregos que lutariam tão facilmente por um lado como por outro. Eventualmente, muitos desses soldados gregos pararam de lutar inteiramente e acabaram por se estabelecer com famílias no Egito.

Os militares egípcios já haviam adquirido armas de ferro e desenvolvido uma cavalaria forte, mas essas inovações não foram suficientes para elevá-la ao nível de eficiência e poder que tinha antes. O ferro era muito caro porque todos os elementos necessários tinham de ser importados.

Os persas invadiram em 525 a.C. e derrotaram a guarnição egípcia em Pelusium, mas isso não tinha nada a ver com poderio militar superior. O general persa Cambises II sabia da grande veneração que os egípcios tinham pelos animais em geral e pelos gatos em particular. Ele ordenou que seus homens reunissem o maior número possível de animais e os conduzissem perante o exército. Além disso, ele fez com que seus soldados pintassem a imagem da deusa Bastet, entre as mais populares de todas as divindades egípcias, em seus escudos. Ele então marchou sobre a cidade com os animais à sua frente, declarando que lançaria gatos sobre as paredes se não recebesse uma rendição imediata. Os egípcios, temendo pela segurança dos animais (e por sua segurança e pela ira divina se ofenderem Bastet), depuseram as armas e renderam-se. Posteriormente, Cambises II teria atirado gatos de um saco nos rostos dos egípcios com desprezo.

Alexandre, o Grande, tomou o Egito dos persas em 331 a.C. e, após sua morte, ficou sob o domínio de seu general Ptolemeu, que se tornou Ptolemeu I do Egito (323–283 a.C.). A dinastia ptolemaica formada por governantes de origem macedônio-grega, adotava as táticas militares e o armamento do seu próprio país. A história da guerra egípcia antiga termina essencialmente com o Novo Reino. Quaisquer inovações e progressos no armamento foram feitos após 1069 a.C., não importavam mais em grande escala para os militares egípcios, porque não havia mais um governo central forte para apoiá-lo.

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Bibliografia

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Sobre o tradutor

Ramon Garcia
Cubano apaixonado pelo aprendizado. Casado, pai de três filhos.

Sobre o autor

Joshua J. Mark
Joshua J. Mark é cofundador e diretor de conteúdos da World History Encyclopedia. Anteriormente, foi professor no Marist College (NY), onde lecionou história, filosofia, literatura e redação. Ele viajou bastante e morou na Grécia e na Alemanha.

Citar este trabalho

Estilo APA

Mark, J. J. (2016, outubro 03). Guerra do Antigo Egito [Ancient Egyptian Warfare]. (R. Garcia, Tradutor). World History Encyclopedia. Recuperado de https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-15283/guerra-do-antigo-egito/

Estilo Chicago

Mark, Joshua J.. "Guerra do Antigo Egito." Traduzido por Ramon Garcia. World History Encyclopedia. Última modificação outubro 03, 2016. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-15283/guerra-do-antigo-egito/.

Estilo MLA

Mark, Joshua J.. "Guerra do Antigo Egito." Traduzido por Ramon Garcia. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 03 out 2016, https://www.worldhistory.org/Egyptian_Warfare/. Web. 20 abr 2025.