Beda (c. 673-735) foi um monge inglês, historiador e estudioso que viveu no Reino da Nortúmbria. Às vezes as referências dizem o Venerável Beda ou Beda, o Venerável. Ele foi um monge em um monastério duplo de Monkwearmouth-Jarrow. Beda era um escritor prolífico e muitos dos seus trabalhos sobreviveram até os dias atuais. Suas obras tiveram grande influência nas gerações após sua morte. Sua obra mais famosa, Historia Ecclesiastica Gentis Anglorum (História Eclesiástica do Povo Inglês) tem sido uma fonte vital para o estudo do início da história inglesa. Por essa razão, ele é lembrado por alguns como o 'Pai da História Inglesa'.
Vida
Pouco se sabe sobre a vida de Beda fora do que ele mesmo escreveu no capítulo final de sua Historia Ecclesiastica. Beda nasceu ou em 672 ou em 673; ele alega ter nascido no próprio chão do monastério de Jarrow. Isso significaria que ele nasceu em Bernicia, o reino mais ao norte dos dois reinos da Nortúmbria (Bernicia e Deira já tinham sido unidos ao reino da Nortúmbria na época de seu nascimento), no que hoje é Sunderland. Beda nada diz sobre o começo de sua vida e há muito pouca evidência externa. Parece ser próvavel que ele veio de uma família nobre. Ao longo de sua vida, ele teve conexões com os mais ricos e poderosos da Nortúmbria. Além disso, alguns estudiosos apontaram o fato do nome Beda (inglês arcaico para Bede) aparecer numa lista do rei de Lindsey (adjacente à Nortúmbria) como evidência de ele ter nascido numa família rica e influente.
Beda alega ter sido enviado ao monastério de Monkwearmouth no rio Wear para ser educado pelo abade Benedict Biscop (c. 628-690). Beda foi criado aí até por volta de 682, quando foi transferido para a nova abadia em Jarrow, fundada por Saint Ceolfrith (c. 642-716. Beda se tornou diácono aos 19 anos de idade, vários anos antes da idade canônica de 25, o que pode ser um sinal de suas habilidades excepcionais. Ele foi totalmente ordenado como um padre aos 30 anos, e parece ter escrito seus primeiros trabalhos na virada do século VIII para usar no ensino no monastério. Suas obras abrangem assuntos de história, teologia e ciência, assim como uma gama de exêge e hagiografia. Considera-se que Beda ajudou a disseminar o uso do método de datação ano domini, discutido em seu trabalho sobre cronologia. A adoção de Beda ao sistema AD, usado às vezes em sua obra Historia Ecclesiastica, popularizou-o para as gerações contemporâneas e subsequentes.
Beda conhecia e se comunicava com muitos clérigos e leigos proeminentes de seu tempo. Como jovem, ele conheceu Adomman, então um abode de um importante monastério de Iona. Ele foi educado pelos santos Benedict Biscop e Ceolfrith, que tiveram um papel crucial na formação na Igreja no norte da Inglaterra. Ele foi ordenado como diácono e depois como padre integral por Saint John de Beverley, que foi bispo de Hexham e de York em diferentes pontos da vida e que fundou a cidade de Berveley na moderna East Yorkshire. Ele se comunicava regurlamente com o Saint Ecgbert de York e a correspondência entre os dois sobreviveu até os dias de hoje. Nothelm, um arcebispo da Cantuária, ajudou Beda a encontrar material para servir de fontes para a Historia Ecclesiastica. Em várias ocasiões, Beda encontrou Wilfrid, o controverso bispo de York. Em algum momento, ele escreveu uma carta para Wilfrid se defendendo contra uma acusação de heresia. Beda claramente conhecia a realeza da Nortúmbria, e dedicou seu maior trabalho ao rei Ceolfwulf (reinou entre c. 729-737), que o consultava com regularidade.
Beda morreu em maio de 735. De acordo com um de seus discípulos que escreveu um registro sobre seus últimos dias, ele morreu cantando um hino. O registro de sua morte é detalhado, descrevendo a doença dele, seus últimos desejos e suas interações com aqueles ao redor dele. Ele aparentemente compôs poesia em seu leito de morte também. Ele foi enterrado em Jarrow. Embora tenha sido considerado um santo logo após a morte, ele não foi formalmente canonizado até o final do século XIX. Contudo, ele também foi nomeado o Doutor da Igreja, o único nativo da Britânica a ter esse título.
Historia Ecclesiastica Gentis Anglorum
O trabalho mais conhecido de Beda é a história da Igreja Católica na Inglaterra. Enquanto ele fornece uma história profunda sobre a Inglaterra de seu tempo, seu foco principal é a disseminação do cristianismo em seu país natal. Uma longa dicussão do desenvolvimento dos reinos anglo-saxões até o século VIII é complementada com um catálogo de santos, reis convertidos e milagres. Beda presta atenção especial à rivalidade entre a prática da Igreja centrada em Roma e as comunidades cristãs celtas que estiveram presentes na Britânia e Irlanda por séculos antes da chegada dos anglo-saxões. O trabalho de Beda é considerado uma das fontes mais importantes da história anglo-saxônica para os estudiosos modernos. É uma fonte principal para a história política, religiosa e social da Inglaterra durante a Era Anglo-Saxônica.
Beda tinha uma grande variedade de fontes à sua disposição enquanto escrevia a Historia Ecclesiastica. O monastério em Jarrow tinha uma biblioteca famosa que dava à comunidade monástica a reputação de centro do aprendizado na Nortúmbria. Para as partes mais antigas de seu trabalho, Beda segue autores clássicos como Plínio, Eutrópio e Orósio, enquanto seu registro sobre as invasões dos anglo-saxões vem amplamente da obra de Gilda, De Excidio et Conquestu Britanniae (Sobre a Ruína e Conquista da Britânia). Para a história dos primeiros reinos ingleses até sua época, Beda se apoia fortemente em fontes mais contemporâneas como Life of Saint Wilfrid, de Eddius Stephanus, que contém registros importantes sobre eventos do final do século VII. Ele também se apoia em correspondência e entrevistas feitas com testemunhas dos grandes eventos de seu próprio tempo.
O assunto principal da história de Beda é o crescimento da Igreja nos reinos ingleses, i.e. anglo-saxões até o século VIII. Figuras religiosas e eventos ao longo desse período são descritos frequentemente com grande detalhe. A vida e carreira de governantes seculares são recontadas também, embora mais em relação aos seus papeis na disseminação do cristianismo na Inglaterra. Bispos, monges, santos e mártires são retratados ao decorrer da obra, assim como os reis que os patrocinavam. Um tema comum na Historia Ecclesiastica é a responsabilidade dos reis com os problemas religiosos dentro de seus domínios. O viés de Beda se volta claramente na direção dos reis de sua terra natal da Nortúmbria. Ele dedica um elogio particularmente forte para Edwin e Oswald da Nortúmbria enquanto também escreve retratos amplamente favoráveis de outros reis da Nortúmbria, incluindo Æthelfrith e Oswiu.
Historia Ecclesiastica é composta por cinco livros separados, com um prefácio no qual Beda dedica seu trabalho a Ceolwulf, rei da Nortúmbria na época. O primeiro livro aborda amplamente a chegada dos romanos na Britânia, começando com a invasão de César em 55 a.C. Muito do livro detalha a disseminação dos cristianismo na Britânia, e Beda reconta as histórias de antigos mártires como Saitn Alban. Ele também escreve sobre as batalhas da Britânia nos séculos IV e V d.C., descrevendo em detalhe numerosas usurpações imperiais que impactaram a sociedade romano-britânica. Ele descreve heresias como o arianismo e o pelagianismo, que fincaram raízes na Britânia e causaram uma significativa inssurreição social. O livro termina com a chegada de Agostinho da Cantuária, enviado pelo Papa Gregório, o Grande, em 597 para converter o rei Æthelberht de Kent ao cristianismo.
Augustine foi enviado a Æthelberht para dizer que ele tinha vindo de Roma trazendo as melhores das notícias, nomeadamente a promessa certeira de alegrias eternas no céu e um rei infinito com o verdadeiro Deus para aqueles que o recebessem - Beda, Historia Ecclesiastica, 39 (Oxford: Oxford University Press, 2009).
Os dois outros livros registram a disseminação e as adversidades da missão de Agostinho e os eventos políticos e militares que frequentemente determinavam o destino da Igreja em diferentes lugares e épocas. Os herdeiros de Æthelberht abandonaram a fé cristã em prol das deidades pagãs de seus ancestrais. Esse é um padrão que ocorre em vários reinos anglo-saxões ao longo da Historia Ecclesiastica. Beda mostra desprezo para com esses reis apóstatas e, ao mesmo tempo, elogia reis como Edwin e Oswald da Nortúmbria, dois heróis de sua história. Ambos adotaram o cristianismo e vigorosamente disseminaram a fé na Nortúmbria. Ambos também morreram em batalha e foram venerados como mártires logo depois de morrer. O terceiro livro culmina no Sínodo de Whitby, em 664, em que o rei Oswiu da Nortúmbria estabeleceu a Controvérsia da Páscoa. Ele decidiu seguir a prática romana na datação do feriado, opondo-se à conflitante prática celta nativa.
O Rei Oswiu começou declarando que era apropriado que aqueles que serviam a um Deus observassem uma regra de vida e não divergissem na celebração dos sacramentos celestiais - Historia Ecclesiastica, 154
O quarto e quinto livros detalham o reinado de Ecgfrith e o declínio da supremacia da Nortúmbria. Beda também relata as carreiras de clérigos famosos do final do século VII, como Teodoro de Tarso, o bispo da Nortúmbria Wilfrid de Ripon e o grande São Cuthbert de Lindisfarne, da Nortúmbria. O quinto e último livro da Historia Ecclesiastica cobre os esforços missionários no exterior, em regiões como a Frísia. Aqui, Beda também fornece uma história detalhada sobre a Controvérsia da Páscoa. Ele denuncia vigorosamente a prática celta de datar a Páscoa, chegando ao ponto de criticar o próprio São Cuthbert por segui-la. Bede escreve sobre seu próprio alívio porque, no momento em que estava escrevendo, os irlandeses haviam sido salvos do erro flagrante de celebrar a Páscoa no dia errado.
Legado
O trabalhode Beda foi amplamente reconhecido quase que logo depois de sua morte. Ele foi venerado como um santo na comunidade monástica de Jarrow e sua reputação pós-morte se espalhou pelos territórios anglo-saxões vizinhos. Ele foi lembrado como uma autoridade da doutrina teológica assim como por sua história e foi extremamente influente em termos de sistemas cronológicos usados por historiadores futuros. Seu trabalho também inspirou futuras gerações de estudiosos ingleses, clérigos e políticos como um texto base para a identidade inglesa.
A tradução da Historia Ecclesiastica para o inglês antigo na corte de Alfredo, o Grande no século IX tem sido vista como um passo importante no desenvolvimento da identidade inglesa, ao contrário da quantidade de identidades regionais únicas dos primeiros reinos anglo-saxões. O uso do termo 'inglês' na obra de Beda é um sinal de sua própria noção de uma identidade cultural maior, compartilhada entre aqueles que viviam nos reinos anglo-saxões do sul e os que viviam na Nortúmbria.