O Manorialismo ou Sistema Senhorial da Europa Medieval era o sistema no qual a sociedade rural se organizava em volta de uma mansão senhorial, de um castelo ou de uma propriedade. As unidades menores dessas propriedades eram chamadas de solares. Trabalhadores livres e não livres prestavam serviço para o proprietário ou arrendatário da terra, em troca de proteção e direito de trabalhar um pequeno pedaço de terra para suprir suas próprias necessidades.
A reunião dessas comunidades rurais era a Mansão Senhorial (manor) ou Castelo – a residência privada do proprietário e local de reuniões comunais com objetivos administrativos, judiciários e diversão. Regulamentos, hábitos e tradições variavam de uma propriedade para outra e, também, com o tempo, porém o sistema do senhorialismo (manorialismo) persistiu por quase toda a Idade Média. O senhorialismo não deve ser confundido com feudalismo, o qual, em geral, refere-se às relações do senhor e vassalos, entre diferentes níveis da aristocracia, no qual a terra era trocada pelo serviço militar.
Origens
A ideia de pessoas de diferentes níveis sociais vivendo em comum, em uma única propriedade, com mútuos benefícios, remonta aos tempos de Roma, quando as villas rurais produziam alimentos nas terras à sua volta. À medida que o Império Romano entrava em declínio e incursões e invasões estrangeiras ficavam mais frequentes, a segurança de uma vida em comum em um local protegido possuía evidentes vantagens. Quando este sistema foi adotado nas propriedades que os reis francos haviam outorgado em troca de lealdade dos nobres, no século VIII, o Sistema Senhorial medieval nascia na Europa. Os reis francos distribuíam parcelas de terra, conhecidas como benefícios, para em troca receberem serviço militar. Do mesmo modo, o senhor de uma propriedade dava o direito do campesinato viver e cuidar de sua terra, em troca de trabalho. Os camponeses eram tanto livres, como não livres, estes últimos compreendendo os escravos do antigo Império Romano. O manorialismo, que de alguma foram já existia com os anglo-saxões, ficou mais desenvolvido e disseminado na Inglaterra, após a Conquista Normanda de 1066.
A partir da metade do século XI, o sistema do feudalismo se espalhou pela Europa Ocidental, onde se desenvolveram as relações senhor/vassalo: senhores davam o direito de usar e ficar com uma renda de uma parte de sua terra para um vassalo, que prometia, em troca, prestar serviço militar. Da mesma maneira, um vassalo podia, então, da mesma maneira fornecer uma parte de sua terra a outra pessoa, em troca de serviço, que podia ser militar ou o pagamento de bens em espécie ou mesmo renda. Assim, desenvolveu-se uma hierarquia à medida que a terra era dividida em porções menores com um arrendatário em cada uma delas. A menor unidade constituía o manor (seu principal edifício residencial ou solar senhorial). Uma propriedade senhorial podia possuir uns poucos hectares, terra suficiente para produzir as necessidades dos que ali viviam, porém, a maioria das propriedades eram quase pequenos povoados. As propriedades senhoriais tinham como proprietários monarcas, aristocratas ou a Igreja e os muito ricos podiam ser donos de centenas de propriedades, coletivamente denominadas “honraria” ou “privilégio”.
Propriedade Senhorial ou Manor
Grandes Propriedades Senhoriais ou Manors (denominadas villae ou curtes na Europa continental medieval), existiram a partir do momento em que as aldeias começaram a ser formadas no período Neolítico. Como centros de uma vida comunal, tais edifícios, por fim, evoluíram para residências privadas que os donos de terras construíam em suas propriedades para uso próprio e para abrigar espaços como as Grandes Salas nas quais ocorriam festas, cortes judiciárias locais e audiências com os camponeses.
As propriedades dos nobres mais ricos possuíam seus próprios castelos (que podiam proteger diversas propriedades senhoriais de um só dono), mas, com o tempo, o maior conforto de um edifício menor, propositalmente construído para uso doméstico, tornou-se mais elegante: a propriedade senhorial ou manor. Estes proprietários de terras sem meios ou permissão para construir um dispendioso castelo de pedras, podiam sempre edificar seus solares o mais perto possível de um castelo, isto nos seus aspectos defensivos. Desta maneira, os solares senhoriais podiam ser fortificados com paredes de pedra, guarnições de ameias, passadiços e, algumas vezes, um fosso, enquanto as propriedades semi-fortificadas possuíam somente algumas dessas características (ou as possuíam sem a uma licença adequada). Em muitos casos, os donos das propriedades maiores podiam se dar bem com a promessa de proteção física para os que viviam e trabalhavam nas terras próximas ao castelo.
A propriedade senhorial, além de uma mansão senhorial ou castelo, podia também incluir um pequeno rio ou córrego correndo através dela, uma igreja, moinho, celeiros e um área de florestas. A terra da propriedade dividia-se em duas partes principais. A primeira parte era o domínio, reservado para exploração exclusiva do proprietário. Tipicamente, o domínio constituía 35-40% do total das terras da propriedade. A segunda parte constituía a terra na qual os arrendatários viviam e trabalhavam para suas necessidades diárias (mansus), tipicamente em torno de 5 hectares por família. Os trabalhadores cultivavam esta área reservada para seu uso e para o domínio.
A propriedade era quase que inteiramente autossuficiente economicamente, com somente alguns produtos comprados fora, como o ferro, pedras de moinho e sal. Consequentemente, não era muito comum contatos oficiais ou comerciais com o mundo exterior e sua comunidade tornou-se, do mesmo modo, independente (mas não isolada). As relações entre seus membros, além serem governados pelas distantes leis da coroa, eram determinadas mais especificamente pelos hábitos e tradições únicos daquela comunidade com o senhor da propriedade que a lidera como seu chefe. Naturalmente, ocorriam alguns contatos físicos entre trabalhadores de diferentes propriedades, regidos pelos costumes. Por exemplo, pagava-se uma multa por uma filha de um servo se casar com uma pessoa de outra propriedade, o que testemunha a necessidade que tinha o senhor em proteger o trabalho – tanto presente, como futuro – a seu dispor.
Servos
Os servos constituíam por volta de 75% da população medieval. Eles não eram escravos, porém eles ou seus ancestrais tinham desistido do direito de livre movimento e do pagamento pelo seu trabalho. Assim procederam para viverem, produzirem alimentos e ter proteção física e legal de um senhor local. Os servos trabalhavam nas terras da propriedade do senhor durante dois ou três dias por semana, mas por períodos maiores durante certas ocasiões, como época de colheita. Algumas vezes era possível para um servo enviar um membro da família (desde que fisicamente capaz) para trabalhar na propriedade em seu lugar. Nos outros dias, os servos podiam cultivar a terra dada a eles para as necessidades de sua família.
Os servos não podiam deixar a propriedade na qual trabalhavam, o que lhes garantia o direito de viver onde recebiam proteção física e sustento – um senhor, independentemente do quão ganancioso fosse, não se beneficiava em deixar com fome os que trabalhavam suas terras. Um servo herdava o status de seus pais, embora, no caso de um casamento misto (entre trabalhadores livres e não livres), a criança, em geral, herdaria o status do pai. Um proprietário de terras podia vender um de seus servos, mas o direito era o de vender o trabalho dele, não a propriedade direta da pessoa, como na escravidão. Teoricamente, a propriedade pessoal de um servo e sua simples palhoça de lama e palha, todas pertenciam ao senhor, mas isso era improvável de ter sido imposta ou que tivesse qualquer relevância em termos práticos. Aparte o pagamento de uma porcentagem regular dos alimentos produzidos em sua própria terra, um servo era obrigado a pagar multas e algumas taxas regulares ao seu senhor, como no casamento do filho mais velho do senhor ou quando da morte de um servo, na forma de um imposto de herança pago pelo herdeiro do servo.
Os servos, pelo menos uma vez no ano, podiam viver um pouco mais intensamente, quando, por tradição, eram convidados para o Solar Senhorial no dia do Natal para uma refeição. Infelizmente, tinham de trazer seus próprios pratos e lenha e, lógico, toda comida que eles mesmos haviam produzido, mas essa era, pelo menos, uma ocasião para ver como a outra metade vivia e abrandar a monotonia de um inverno no campo.
Trabalhadores Livres
Uma minoria de trabalhadores em uma propriedade não era de servos, mas homens livres. A situação deles não era muito diferente dos servos em termos econômicos, embora pudessem (mas nem sempre) ser donos de terra livremente possuída (i.e., eram proprietários permanentes) e não sujeitos às taxas e restrições dos servos. Trabalhadores livres, muitas vezes, pagavam aluguel ao invés de prestar trabalho na propriedade do senhor, o qual era tipicamente pago na forma de produção de sua própria terra. A terra que podiam chamar de sua era, em geral, pequena e, portanto, era necessário para esses camponeses alugarem seu trabalho para suplementar suas rendas. Trabalhadores livres podiam, também, receber permissão, com o consentimento de seu senhor, para vender sua propriedade para um terceiro. Somente 1/5 dos camponeses livres possuíam terra suficiente (aproximadamente um mínimo de 8 hectares) para produzir um excedente além de suas necessidades familiares e, na maior parte das vezes, não possuíam a melhor terra agricultável (o senhor a possuía). Sua propriedade era precária e uma só má colheita ou doença prolongada podiam levá-lo de trabalhador livre à condição de servo.
Inquilinos
Outro tipo de camponês era o inquilino, que podia ser livre ou não e que possuía pouca ou nenhuma terra de sua propriedade, mas alugava um chalé. Em geral realizavam bicos conforme a necessidade, ajudando nas propriedades manoriais, com trabalhos como debulhador, tosquiador, reunindo feno ou simplesmente cavando buracos e retirando ervas daninhas.
Corte de Justiça Senhorial
A propriedade senhorial possuía sua própria corte conduzida pelo senhor ou seu administrador. Na Inglaterra, tal corte, realizada na grande sala de um castelo ou mansão senhorial, era conhecida como hallmote ou halimote. As disputas entre membros da propriedade senhorial em assuntos como o direito de usar áreas particulares de terra, como as florestas ou áreas de turfa (mas não disputas entre o senhor e um camponês individualmente) eram aqui negociadas, bem como as multas impostas aos trabalhadores e assuntos criminais. Crimes mais graves, como assassinato eram julgados nas cortes da Coroa. O hallmote poderia ter sido parcial para o proprietário de terra, mas havia cortes mais altas para apelação e registros mostram que o campesinato, atuando coletivamente, podia trazer casos contra um proprietário de terras.
Declínio do manorialismo
Os sistemas tanto do feudalismo, como do senhorialismo, foram enfraquecidos por diversos acontecimentos no final da Idade Média. Um golpe particular veio do repentino declínio populacional produzido por guerras e pestes, principalmente a Peste Negra (com pico entre 1347-1352). Outro risco frequente para a subsistência de todos era uma quebra de safra. Tais crises produziram um crônico encolhimento no mercado de trabalho e o abandono de propriedades, pois não havia ninguém para nelas trabalhar. O crescimento de grandes cidades também viu o trabalho abandonar o campo e migrar para encontrar um futuro melhor e os novos trabalhos disponíveis ali eram para trabalhar para as novas e ricas classe dos comerciantes.
Os servos que permaneceram nas propriedades aumentaram o seu poder político agindo coletivamente nas pequenas comunidades, que começaram a ter as suas próprias cortes e que agiam como contrapeso às das aristocracias rurais. Algumas vezes ocorreram sérias revoltas do campesinato contra seus chefes. No ano de 1227 no Norte das Terras Baixas, em 1230 no baixo Weser no Norte da Alemanha e em 1315 nos Alpes Suíços, todas testemunharam violentos exércitos de camponeses levando a melhor sobre os cavaleiros aristocráticos e uma grande rebelião, sem sucesso, a Revolta dos Camponeses, ocorreu em 1381 na Inglaterra.
Finalmente, a elevação no uso da cunhagem de moedas no final da Idade Média significou que muitos servos pagavam a seus senhores em moeda, ao invés de trabalho ou pagavam uma taxa para ser isentos de algum trabalho esperados deles ou mesmo compravam sua liberdade. Por toda Europa, todos esses fatores conspiraram para enfraquecer o tradicional sistema de trabalhadores não livres presos à terra e trabalhando para o rico, tanto que por volta do século XIV, a maior parte do trabalho agrícola era realizado por trabalhadores pagos ao invés de servos não pagos.