Um monastério medieval era uma comunidade fechada, algumas vezes em locais afastados, de monges liderados por um abade, os quais renunciaram aos bens mundanos para viverem uma vida simples de oração e devoção. Os primeiros monastérios cristãos apareceram a partir do século IV d.C no Egito e Síria e a ideia se espalhou para a Europa Ocidental do século V d.C. em diante.
São Benedito de Núrsia (+c. 543), personalidade importantíssima no movimento monástico, fundou a Ordem dos Beneditinos e criou regras pelas quais os monges deveriam seguir. Estas regras foram, em variados graus, imitadas e seguidas nos próximos séculos por diversas casas monásticas, incluindo aquelas que sobreviveram até os dias atuais. Embora seus membros fossem pobres, os monastérios, ao contrário, eram instituições poderosas e ricas, reunindo as riquezas fornecidas pela terra e propriedades doadas a eles. Os monastérios foram, também, importantes centros de estudo e educação para a juventude e, o que é talvez mais significativo para os historiadores de nossa época, produziram laboriosamente livros e preservaram textos antigos os quais aumentaram muito o nosso conhecimento não só do mundo medieval, mas da antiguidade clássica.
Origens e Crescimento
A partir do século III d.C. surgiu no Egito e Síria uma corrente de alguns cristãos que decidiram viver a vida de um eremita solitário ou asceta. Assim fizeram porque pensavam que sem qualquer distração mundana ou material poderiam alcançar maior compreensão de Deus e intimidade com Ele. Além disso, sempre que os primeiros cristãos foram perseguidos, algumas vezes se viram forçados pela necessidade a viverem nas áreas de remotas montanhas, onde o essencial da vida era escasso. Como esses individualistas cresciam em número, alguns começaram a viver reunidos em comunidades, continuando, no entanto, a se isolarem do restante da sociedade e devotando-se inteiramente às preces e ao estudo das escrituras. Inicialmente, membros dessas comunidades viviam juntos em um local conhecido como lavra onde continuaram a vida de solitários e somente se reuniam para os serviços religiosos. O líder deles, um abba (daí a futura palavra abade), presidia esses individualistas – eram chamados monachos em grego devido a isso, pois é palavra derivada de mono significando “um” e que é a origem da palavra “monge”.
Os primeiros ascetas a começar a organização dos monastérios foram os monges que viviam mais comunalmente. Pachomios (c.290-346), um egípcio e antigo soldado, talvez inspirado pela eficiência dos acampamentos do exército romano, fundou nove monastérios para homens e dois para mulheres em Tabbennisi, no Egito. Estas primeiras comunidades monásticas (cenobíticas) eram administradas seguindo uma lista de regras compiladas por Pachomios. Este estilo dos monges viverem em comunidade (koinobion), na qual trabalhavam e rezavam juntos em uma rotina diária. A propriedade era mantida em comum e um abade os administrava, deu origem a um modelo comum no período bizantino.
A próxima etapa no caminho de um tipo de monastério padrão durante a Idade Média, foi feita por Basílio de Cesaréia (São Basílio ou Basílio, o Grande, c.330-c.379), no século IV d.C. Basílio havia visto monastérios no Egito e Síria e pensava reproduzi-los pelo Império Romano do Oriente ou Império Bizantino. Ele acrescentou uma dimensão extra com sua crença de que monges deveriam não só trabalhar juntos para objetivos comuns, mas contribuírem para ampliar a comunidade. Os monastérios bizantinos eram organizações independentes com regras e regulamentos próprios para os irmãos monges.
A Ordem Beneditina
A partir do século V d.C. a ideia dos monastérios expandiu-se por todo o Império Bizantino e, em seguida, na Europa Ocidental, onde adotaram práticas distintas baseadas nos ensinamentos do abade italiano São Benedito de Núrsia (c.480-c.543), visto como o fundador do modelo de monastério europeu. O próprio Benedito fundou um monastério no Monte Cassino na Itália. A Ordem dos Beneditinos encorajava seus membros a viverem uma vida a mais simples possível com alimentação simples, acomodações básicas e pouquíssimas posses como era prática. Esperava-se que os monges vivessem juntos em uma comunidade compartilhada de mútua ajuda e vigilância, participando no trabalho físico necessário para fazer o monastério economicamente autosuficiente e, ao mesmo tempo, realizar estudos religiosos e orar. Havia um conjunto de regulamentos – coletivamente conhecidos como a Regra monástica (regula) – que os monges deveriam seguir, embora seu rigor e aplicação prática se encontrasse no julgamento individual do abade que chefiava com autoridade absoluta em cada monastério. As mulheres também poderiam viver uma vida monástica como freiras, nas abadias e conventos.
Com uma grande ajuda devida à isenção de impostos e doações, os monastérios cresceram em sofisticação e riqueza. Na Idade Média a base da geração de renda encontrava-se no trabalho físico, mas para a comunidade monástica, este deixou de ser uma necessidade a partir do momento em que podiam, agora, confiar nos esforços dos irmãos laicos e no trabalho contratado dos servos (trabalhadores não livres). Consequentemente, os monges na Alta Idade Média eram capazes de dedicar mais tempo na busca de conhecimento, particularmente na produção das especialidades monásticas medievais, ou seja, os manuscritos iluminados.
A Ordem Cisterciense
A partir do século XI começaram a aparecer novas ordens, notavelmente a ordem Cisterciense (constituída em 1098), criada porque alguns monges desejavam um estilo de vida mais rigoroso do que os beneditinos podiam oferecer. A Ordem Cisterciense colocou muito mais ênfase nos estudos religiosos e minimizou o trabalho físico dos monges que deles se esperava. Todo trabalho, como o desempenhado nas terras agricultáveis do monastério ou assar pão, era realizado, ao contrário, por trabalhadores contratados ou irmãos laicos, os quais não eram monges plenos. Para preservar o estilo de vida mais severo, os monastérios cistercienses eram localizados em áreas mais remotas do que os dos beneditinos e possuíam edifícios simples com um mínimo de pedras entalhadas, interiores decorados e menos confortos.
A partir do século XIII, desenvolveu-se outro ramo da vida ascética por frades que rejeitavam todos os bens materiais e viviam, não em comunidades monásticas, mas como indivíduos inteiramente dependentes de donativos de benfeitores. São Francisco de Assis (c.1181-1260) implantou uma ordem mendicante, os Franciscanos, logo imitados pelo Dominicanos (1220) e, subsequentemente, pelos Carmelitas (final do século XII) e Agostinianos (1244).
O Cotidiano dos Monges
Os monastérios variavam muito em tamanho. Os menores, ocupados por somente uma dúzia de monges, eram liderados por um prior ao invés de um abade. Os grandes, como Abadia de Cluny na França (fundada em c.910) abrigava 460 monges em seu auge no século XII, mas algo como 100 irmãos parece ser um número comum para a maioria dos monastérios. O abade era selecionado pelos monges mais velhos e detinha o cargo vitaliciamente. Ele era assistido por um prior e pelos monges que possuíam obrigações administrativas específicas, os obedientiaries*, os quais cuidavam dos vários aspectos do monastério, como a igreja, os serviços religiosos, a biblioteca, rendas das propriedades, armazenamento de alimentos ou a adega. O abade representava o monastério no mundo externo, por exemplo, nas reuniões da ordem ou de assuntos relacionados com a administração das propriedades do monastério.
Os monges comuns, como é lógico, levavam uma vida simples. Como aos monges não era permitido sair do monastério, passavam o dia em trabalhos agrícolas e estudos religiosos, o que incluía leitura de conjuntos de textos, cópia de livros para criar manuscritos iluminados, ensinar os oblatos (meninos) ou noviços (monges em treinamento) e rezando (oficialmente classificado como trabalho, ou melhor, trabalho de “Deus”). O dia, e mesmo a noite, eram regularmente pontuados por serviços religiosos e pela manhã reunião do capítulo, ocasião em que todos os monges discutiam os afazeres do monastério. Deviam cumprir suas obrigações em silêncio, vestir roupas simples grosseiras e renunciar a tudo, exceto itens básicos de propriedade pessoal. Os únicos privilégios dos monges eram comida e bebida decentes o ano todo, com uma única refeição por dia (ou duas no inverno).
Os Edifícios Monásticos
Os monastérios variavam em tamanho e, portanto, diferia a necessidade por edifícios. De fato, algumas vezes a geografia ditava a arquitetura, como no alto de remotas montanhas, como em Meteora na Grécia ou a Abadia Beneditina protegida pelo mar na ilhota do Monte Saint-Michel, na França. No entanto, muitos exibem aspectos arquitetônicos essenciais em comum e as plantas baixas dos monastérios do coração da Europa evidenciam que permaneceram notavelmente consistentes por toda a Idade Média. Em geral, os monastérios eram cercados por altas muralhas, porém o motivo disto ainda permanece em discussão, ou seja, se estas tinham primariamente por objetivo impedir as pessoas de se aproximarem dos monges ou, vice-versa, manter os monges fora do contato com o mundo exterior. O acesso ao interior das muralhas era feito pelo portão principal.
O núcleo do monastério era o claustro: uma arcada em volta de um espaço aberto quadrangular. O acesso ao claustro era restrito e ninguém de fora da comunidade monástica somente poderia entrar com permissão. O claustro era uma das poucas áreas onde os monges podiam conversar livremente, onde se ensinava aos noviços e onde se cumpriam tarefas como amolar um canivete na pedra de amolar ou lavar roupas em grandes bacias de pedra.
Contígua ao claustro encontrava-se a igreja com uma torre de campanário, importante para chamar os monges às atividades religiosas. Havia depósitos, amplos porões para armazenamento de vinho e alimentos e, talvez, até estábulos. uma casa do capítulo para as reuniões diárias, uma biblioteca e, voltado para o sul para uma melhor iluminação, um sccriptorium onde os livros eram produzidos pelos monges. Refeições comunais eram feitas no refeitório com suas longas mesas. Junto ao refeitório encontravam-se a cozinhas, uma padaria e um jardim onde cresciam os vegetais e as ervas e os peixes eram mantidos em um tanque. Também próximo ao refeitório encontrava-se o calefatório, o único ambiente aquecido no monastério (além da cozinha), aonde os monges podiam ir e se aquecerem um pouco no inverno. Os dormitórios eram separados para os monges, os oblatos e os noviços.
Além do claustro, existiam edifícios auxiliares dependendo do tamanho do monastério. Poderia haver uma enfermaria para os idosos e doentes, com suas próprias cozinhas. Os irmãos laicos viviam em um bloco de acomodações próprio, tipicamente em um pátio externo, com suas próprias cozinhas, nas quais se preparavam alimentos que os monges não podiam comer. Em alguns monastérios podia existir uma edificação para acomodar viajantes e espaços para trabalhadores especializados como alfaiates, ferreiros ou vidraceiros. Além disso tudo, ainda havia lugar para um cemitério somente para os monges e outro para os laicos importantes do local.
A higiene de um grande monastério estava entre as melhores a ser vista em qualquer parte do mundo medieval. Cluny possuía um bloco de latrinas com 45 cubículos que desaguavam em um canal de drenagem, com água corrente desviada de um riacho próximo. Havia também uma casa de banhos nos grandes monastérios, mesmo se os banhos frequentes fossem mal-vistos como um luxo desnecessário para monges.
Poder Monástico
Um grande monastério era bastante semelhante a um castelo medieval ou a uma casa senhorial (manor), na medida em que controlava uma área de terra circundante e continha, essencialmente, todos os elementos que se poderia encontrar em um pequeno povoado do período. No sistema senhorial da Europa, a terra era tipicamente dividida em áreas fundiárias (manors) – a menor propriedade com alguns hectares e, portanto, capaz de prover uma renda para o senhor e sua família. Um monastério adquiria áreas fundiárias através de doações e, nessa direção, podia acabar administrando muitas propriedades díspares, com todas suas rendas fluindo diretamente para os cofres do monastério. Outras doações podiam incluir propriedades nas cidades ou mesmo igrejas e, consequentemente, mais dinheiro vindo de aluguéis e dízimos. Os ricos faziam doações para aumentar seu prestígio local e não é uma coincidência que na Inglaterra e Gales, por exemplo, 167 castelos e monastérios foram construídos próximos um do outro entre os séculos XI-XV. Além disso, ajudando a implantar um monastério, um senhor podia se beneficiar materialmente de seus produtos e, talvez, garantir um salvo-conduto para sua alma na próxima vida, tanto através de ação de sua doação e da parcela de orações ditas em seu nome. Somadas às suas rendas pelas doações, aluguel das terras e venda de produtos produzidos nestas terras, muitos monastérios acumulavam dinheiro mantendo mercados e produzindo bens artesanais, enquanto alguns possuíam o direito cunhar sua própria moeda.
Os monastérios, como instituições cheias de educadores e intelectuais, também demonstraram serem úteis ferramentas ao estado. Monarcas muitas vezes utilizavam monges, com suas habilidades em latim e produção de documentos, em seus escritórios reais ou em um monastério que desempenhava esta função. Sabemos, por exemplo, que o Monastério Winchombe em Gloucesteshire, Inglaterra, e a Abadia de Saint-Wandrille, próxima a Rouen, França, foram usados como arquivo real no século IX, por seus respectivos reinos. Além disso, grandes monastérios educavam a aristocracia e possuíam especializadas facilidades de ensino como na Abadia Whitby no Nordeste da Inglaterra, que educou um alonga linhagem de bispos e contava São João de Beverley (+721) enre seus alunos.
Papel Comunitário e Legado
Um monastério disponibilizava às comunidades locais orientação espiritual e suas igrejas estavam abertas ao público em geral, ofereciam emprego à população e seus monges educavam, guardavam e protegiam as relíquias sagradas, hospedavam peregrinos que vinham para visitar, protegiam os órfãos, os doentes e os idosos e diariamente forneciam alimentos, bebida e esmolas aos pobres. Os monges produziam e copiavam incontáveis e valiosos documentos históricos como tratados religiosos, biografias de santos e histórias regionais. Seus manuscritos iluminados ganharam renome global, inclusive obras primas subsistentes como o Book of Kells e o Evangelho Lindisfarne.
Os monastérios patrocinavam as artes, especialmente a produção de afrescos e mosaicos tanto no interior do monastério como pelo mundo, para espalhar a mensagem cristã. Os monastérios desempenharam um papel vital (mesmo nem sempre bem-sucedido) como protetores da arte e documentos históricos, especialmente em tempos tumultuosos, como guerras, incursões vikings ou heresias como o iconoclasmo nos séculos VIII-IX, quando a arte religiosa foi cruelmente destruída e vista como blasfêmia. Devido a estes esforços, podemos hoje ler textos não somente medievais, mas da antiguidade, graças ao trabalho dos monges copistas e dos monastérios que preservaram estes textos.
Os monastérios eram comunidades prósperas e estáveis, tanto que muitos deles adquiriram edifícios domésticos e funcionais periféricos, onde as pessoas viviam permanentemente e trabalhavam para fornecer aos monges tudo de que precisavam. Consequentemente, muitas cidades atuais encontram-se em locais onde anteriormente existia um monastério. Finalmente, ainda existem muitos monastérios medievais em atividade, como os de Meteora e do Monte Athos na Grécia, os quais são eles mesmos uma conexão viva com o passado e que continuam a prover assistência ao que a sociedade mais precisa.