Anne Bonny

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Mark Cartwright
por , traduzido por Ricardo Albuquerque
publicado em 23 agosto 2021
Disponível noutras línguas: Inglês, francês, espanhol
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Anne Bonny (by Unknown Artist, Public Domain)
Anne Bonny
Unknown Artist (Public Domain)

Anne Bonny (ou Bonney) foi uma pirata irlandesa que atuou brevemente nas águas em torno das Bahamas antes de sua captura por autoridades jamaicanas em 1720. Como parceira do pirata inglês John Rackham, apelidado de "Calico Jack", Bonny vestia-se como um homem em combate e lutou corajosamente contra as autoridades que abordaram seu navio, enquanto os companheiros de pirataria escondiam-se no convés inferior.

Bonny foi uma das únicas duas piratas femininas da assim chamada Era Dourada da Pirataria a ganhar notoriedade, assim como sua amiga e companheira de tripulação, Mary Read (ou Reade). Ambas foram capturadas, julgadas e sentenciadas à forca por pirataria, mas tiveram suas execuções adiadas porque estavam grávidas. Enquanto sabe-se que Read morreu na prisão devido à febre, o destino final de Anne Bonny pode apenas ser alvo de especulações.

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Vida Pregressa

Anne Cormac nasceu na Irlanda, provavelmente em algum momento entre 1690 e 1700. Ainda criança, ela e sua família mudaram-se para uma fazenda na Carolina do Sul. Sua mãe a vestia como um garoto desde muito cedo, uma sombria indicação de sua futura carreira, mas havia motivos para isso, uma vez que se requeriam crianças do sexo masculino das famílias que emigravam para a América. A mãe de Anne morreu e ela fugiu da casa do pai, mas não por muito tempo. Anne deixou o pai e, contra os desejos dele, casou-se com James Bonny, um pirata que abandonara sua vida criminosa após a oferta de perdão de Woodes Rogers (1679-1732), o governador das Bahamas, onde o casal se instalou. James agora vivia como pescador e informante sobre os antigos colegas de pirataria. Porém, a atração e romantismo do mar garantiriam que Bonny não permaneceria em terra por muito tempo.

Rackham e Bonny, com uma tripulação total menor do que 20 homens, eram piratas relativamente pouco importantes.

Anne Bonny e "Calico Jack"

Anne Bonny ganhou notoriedade ao navegar com o pirata inglês John Rackham (m. 1720), cujo apelido era "Calico Jack" por causa da preferência por roupas de algodão comum, em vez das exóticas vestimentas de seda que os demais piratas usavam. Eles se encontraram na Ilha de Providence (Nassau), nas Bahamas, durante a primavera de 1719, e se tornaram amantes. Na ocasião, Rackham desfrutava de algum tempo de lazer em terra, tendo recebido um perdão do governador. Anne deixou seu marido James e, em Agosto de 1719, embarcou com Rackham no William, uma corveta que capturaram no porto de New Providence. Em 5 de Setembro, o governador Rogers expediu um mandado para a prisão de Rackham, no qual estava relacionada sua tripulação suspeita. Entre os nomes da lista estava o de Anne Bonny, com o pseudônimo de Ann Fulford.

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Jolly Roger of Calico Jack
Bandeira Pirata de Calico Jack
RootOfAllLight (Public Domain)

O casal de piratas, com sua tripulação total de menos de 20 homens e um número limitado de capturas, tinha pouca importância se comparado com as personagens mais célebres da Era Dourada da Pirataria. Em seguida a outra captura, mais uma mulher foi adicionada à tripulação: Mary Read. A tripulação de Rackham certamente se destacava como um bando inusitado de renegados, num tempo em que mulheres no mar eram uma raridade. De fato, muitos piratas criavam regras que proibiam estritamente a presença de mulheres e garotos a bordo de seus navios, para evitar disputas sobre favores sexuais ou comportamento predatório. Como o historiador J. Rogozinski assinala, no caso de Bonny e Read, “os piratas toleravam as mulheres porque elas se mostravam disponíveis para qualquer um da pequena tripulação de Rackham” (33).

Tanto Read quanto Bonny vestiam roupas masculinas no mar e são descritas como portando lenços em torno da cabeça (ainda que costumeiramente associado à vestimenta típica da maioria dos piratas, isso não era comum, ou, pelo menos, não documentado entre homens). Testemunhos durante os julgamentos revelaram que tanto Bonny e Read somente se vestiam como homens nos combates, quando usualmente utilizavam pistolas. De fato, a romântica sugestão de que elas se disfarçavam como homens todo o tempo, apresentada com frequência em histórias populares, desafia a imaginação, tendo em vista as limitações da vida a bordo, ainda que haja casos históricos de mulheres que, na mesma época, enganaram seus companheiros a bordo de navios mercantes.

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A tripulação pirata mista liderada por Rackham conseguiu escapar das autoridades. Eles pilharam navios mercantes nas águas em torno das Bahamas e numa ampla área de rotas marítimas de Bermuda a Hispaniola (atual Santo Domingo), obtendo cargas pouco glamorosas, tais como tabaco e pimentas. Bonny e Rackham tiveram um filho, que acabou abandonado em Cuba, onde ela passou o período final de gravidez.

Anne Bonny and Mary Read
Anne Bonny e Mary Read
Benjamin Cole (Public Domain)

A Captura de Bonny

Em Novembro de 1720, enquanto ancorados na extremidade ocidental da Jamaica, o navio de Rackham e Bonny sofreu um ataque surpresa do Tigre, enviado pelo novo governador da ilha, Sir Nicholas Lawes, e comandado por Jonathan Barnet. Os piratas, num total de 18, de acordo com o relatório de Lawes a Londres, cortaram o cabo da âncora e fizeram uma retirada apressada, mas foram alcançados durante a noite e abordados. Rackham e o restante da tripulação se esconderam abaixo do convés – muito provavelmente estavam bêbados – e somente Read, Bonny e outro tripulante tentaram resistir aos homens de Barnet. Ainda assim, foram capturados e levados para Spanish Town (naquela época chamada St. Jago de la Vega), na Jamaica, para julgamento.

Bonny disse a Rackham: “Se você tivesse lutado como um homem, não seria enforcado como um cão”.

Julgamento e Consequências

As duas mulheres foram julgadas separadamente dos homens em 28 de Setembro, todos com a mesma terrível acusação: pirataria. O aviso do julgamento, que circulou alguns dias depois, observa que o apelido de Bonny era “Bonn”. Os documentos deste julgamento revelam aspectos interessantes sobre o passado das duas piratas e de suas personalidades. Read e Bonny foram descritas por uma testemunha, Thomas Dillon, como “ambas depravadas, sempre praguejando e blasfemando e muito dispostas e prontas a fazer qualquer coisa a bordo” (Cordingly, 111). Ele também testemunhou que Bonny estava portando uma pistola quando aprisionada. A testemunha Dorothy Thomas fez a seguinte descrição de um ataque, confirmando sem dúvidas que Read e Bonny eram realmente integrantes da tripulação pirata:

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[...] as duas mulheres, prisioneiras no balcão, abordaram então a dita corveta, e vestiam casacos masculinos, calças compridas e lenços em torno de suas cabeças; e cada uma delas tinha um machete e uma pistola nas mãos, e praguejavam e xingavam aos homens para matar a depoente; e que eles deveriam matá-la para prevenir que se voltasse contra eles; e a depoente disse ainda que o fato de saber e acreditar que eram mulheres na ocasião foi pelo tamanho de seus seios.

(Cordingly, 64)

Outra testemunha, desta vez um francês, falando por intermédio de um tradutor, confirmou o hábito de Read e Bonny de mudar suas roupas para o combate: “quando elas viam qualquer embarcação, perseguiam ou atacavam, vestiam roupas masculinas e, em outras ocasiões, usavam roupas femininas” (ibid).

Todos os acusados se declararam inocentes das acusações de pirataria, a despeito das óbvias evidências contrárias e das declarações de testemunhas de não somente um, mas de vários navios que tinham saqueado. Não houve defesa e todos foram declarados culpados. Rackham foi sentenciado à forca e Bonny demonstrou pouca simpatia: conforme os relatos, teria declarado que “Se você tivesse lutado como um homem, não seria enforcado como um cão” (Downie, 193). De acordo com o costume da época, o cadáver foi mantido numa jaula para apodrecer ao ar livre, num sombrio alerta para quem se sentisse atraído pela pirataria.

Trial Notice of John Rackham, Anne Bonny and Mary Read
Anúncio do Julgamento de John Rackham, Anne Bonny e Mary Read
Unknown Artist (Public Domain)

Anne Bonny e Mary Read também foram sentenciadas ao enforcamento, mas receberam um adiamento após revelarem ao tribunal que estavam grávidas. As leis da época proibiam a execução de uma mulher grávida – a criança no útero era inocente, ainda que a mãe não fosse – e, assim, elas foram autorizadas temporariamente a permanecer vivas. Exames foram realizados nas duas para garantir que falavam a verdade. O Registro da Paróquia do distrito de Santa Catarina mostra que Read morreu na prisão jamaicana, devido à febre, em 1721, com o sepultamento ocorrendo no dia 28 de Abril.

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O que aconteceu a seguir com Bonny é desconhecido, mas ela pode ter escapado ou ter sido perdoada. Se ela conseguiu a liberdade, uma lenda dos seus últimos anos é que se tornou amante de Robert Fenwick. Outro antigo pirata, Fenwick, em outros tempos, havia saqueado os mercadores do Mar Vermelho, mas agora vivia de forma quieta e confortável no Castelo Fenwick, que construiu nas imediações de Charleston, na Carolina do Sul. A incansável Bonny então teria fugido com outro homem, mas foi então persuadida a retornar para Fenwick, que arranjou para que seu rival fosse enforcado. Como uma alternativa a esta história, Anne Bonny pode ter morrido na Jamaica, em Dezembro de 1733, se é que um registro da paróquia, anotando a morte de uma "Ann Bonny", refere-se de fato à notória pirata.

A Anne Bonny de Daniel Defoe

Anne Bonny foi o tema de uma biografia, junto com muitos outros piratas, na famosa obra de Daniel Defoe, História Geral dos Roubos e Assassinatos dos mais Notórios Piratas, compilada na década de 1720. A obra é creditada a um certo Capitão Charles Johnson na página de título, mas talvez se trate de um pseudônimo do escritor Daniel Defoe (estudiosos ainda debatem a questão e Charles Johnson pode ter sido um especialista em piratas que realmente existiu, ainda que inteiramente desconhecido). Uma mistura de fato e ficção – sem nenhuma indicação para orientar o leitor –, o livro foi um estrondoso sucesso e definiu como os piratas têm sido retratados desde então. O autor claramente teve acesso a documentos oficiais, registro de julgamentos e relatos jornalísticos contemporâneos e muitas afirmações são realmente factuais e corroboradas pelos registros históricos. Porém, existem também incontáveis exageros e puras invenções, tais como conversas particulares e discursos aparentemente repetidos ad verbatim. É talvez significativo que Defoe tenha sido tanto um jornalista bem-sucedido quanto autor de ficção, ou seja, ele sabia exatamente como mesclar fato e ficção para o máximo efeito literário.

Anne Bonny Cigarette Card
Cartão de Cigarro de Anne Bonny
Metropolitan Museum of Art (Copyright)

A excitante biografia de Defoe da mulher pirata a coloca como tendo nascido próximo a Cork, na Irlanda, filha ilegítima de um advogado com uma das criadas. Com o objetivo de manter a filha ilegítima junto a si, o pai de Anne a vestiu como um garoto e fingiu que ela era um aprendiz em seu escritório. As circunstâncias conspiraram para obrigar o pai de Anne, a criada e a criança a emigrar para a Carolina do Sul, onde ele teve sucesso como dono de uma fazenda. Nesta época, Anne parecia destinada a uma vida confortável, mas rejeitou tudo isso em favor de uma aventura no mar com o pirata James Bonny. O casal se casou e se instalou nas Bahamas após o marido receber um perdão do governador Rogers. Inquieta, Anne demorou-se um pouco ali até se deparar com John Rackham. Ela então deixou o marido e iniciou uma vida de crimes com Rackham, numa corveta roubada.

Defoe insiste que Anne enganou a tripulação de Rackham, fazendo com que todos pensassem que era um homem, a despeito da gravidez que tornou necessário um período em terra em Cuba. Quando retornou, Mary Read juntou-se à tripulação e Defoe eleva o fator surpresa de sua história (e testa ainda mais a credulidade de seus leitores) ao fazer Anne tentar seduzir Read, que também estaria se disfarçando como homem. Aparentemente, Bonny achou Read um rapaz realmente bonito. A certa altura, Read revelou que era uma mulher, tanto para Bonny quanto para Rackham, para evitar o ciúme da "amizade" das duas. O resto da tripulação é deixada no escuro quando ao gênero das duas tripulantes. Bonny acaba capturada, julgada e tem sua execução adiada da forma mencionada acima. Defoe termina a história com a observação de que o que houve com Bonny é desconhecido, exceto o fato de que não foi executada. Assim como piratas como Edward Teack, também chamado de Barba Negra, o extravagante retrato do caráter de Anne Bonny elaborado por Defoe iria inspirar, mistificar e influenciar muitos escritores subsequentes de romances, histórias e filmes desde então.

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Perguntas e respostas

O que realmente aconteceu com Anne Bonny?

A pirata Anne Bonny foi capturada e julgada na Jamaica em 1720. Sentenciada à morte por enforcamento, teve o cumprimento da sentença adiado quando se descobriu que estava grávida. Ninguém sabe o que ocorreu depois, exceto que não há registro da execução.

O que fez Anne Bonny famosa?

Anne Bonny era uma famosa pirata no Caribe porque havia muito poucas mulheres na pirataria.

Qual é o sobrenome de Anne Bonny?

O sobrenome familiar de Anne Bonny era Cormac, até ela se casar com James Bonny. Seu amante e parceiro na pirataria era John Rackham, apelidado de "Calico Jack".

Sobre o tradutor

Ricardo Albuquerque
Jornalista brasileiro que vive no Rio de Janeiro. Seus principais interesses são a República Romana e os povos da Mesoamérica, entre outros temas.

Sobre o autor

Mark Cartwright
Mark é um escritor em tempo integral, pesquisador, historiador e editor. Os seus principais interesses incluem arte, arquitetura e descobrir as ideias que todas as civilizações partilham. Tem Mestrado em Filosofia Política e é o Diretor Editorial da WHE.

Citar este trabalho

Estilo APA

Cartwright, M. (2021, agosto 23). Anne Bonny [Anne Bonny]. (R. Albuquerque, Tradutor). World History Encyclopedia. Recuperado de https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-19986/anne-bonny/

Estilo Chicago

Cartwright, Mark. "Anne Bonny." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. Última modificação agosto 23, 2021. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-19986/anne-bonny/.

Estilo MLA

Cartwright, Mark. "Anne Bonny." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 23 ago 2021. Web. 26 dez 2024.