A Era de Ouro da Pirataria (1690-1730) refere-se a um período em que os ataques de ladrões em alto-mar e nos portos coloniais alcançaram um nível sem precedentes. Embora nem todos os historiadores concordem com esta moldura temporal específica, ela é geralmente aplicada para aqueles piratas que operavam no Caribe, na costa Leste da África e no Atlântico meridional, além do Oceano Índico.
Os nomes mais famosos associados a este período incluem o Capitão Kidd (m. 1701), Barbanegra (m. 1718) e Bartolomew Roberts (m. 1722). Estes homens, e algumas mulheres, como Anne Bonny e Mary Read, tinham como alvos a marinha mercante e, muito mais raramente, os bem armados navios de tesouros. O período terminou quando a Marinha Real, a Companhia das Índias Orientais e os governadores coloniais decidiram reprimir a pirataria de forma mais agressiva, resultando na captura e enforcamento de centenas de piratas, desde Londres até os estados norte-americanos das Carolinas do Norte e do Sul.
Definindo uma Era
A "Era de Ouro da Pirataria" é um nome estranho para se denominar um período em que o crime prevalecia, mas isso é uma preocupação secundária ao problema de se definir o que exatamente este período abrange. A maioria dos historiadores não inclui o período dos bucaneiros, que visavam às Possessões Espanholas e navios de tesouros em anos anteriores do século XVII (c. 1650-1680). O final deste século é o início mais comum da “Era de Ouro” para os acadêmicos, mas alguns a restringiriam às primeiras duas ou três décadas ou apenas até a segunda década do século XVIII. Assim, para não omitir certos pontos de interesse pertinentes ao tema da pirataria, adotaremos um ponto de vista mais amplo e consideraremos a "Era de Ouro" como tendo ocorrido aproximadamente de 1690 a 1730. É também importante observar que a pirataria ocorre em muitas partes do mundo desde a Antiguidade até os dias atuais e, por isso, a insistência em especificar períodos de tempo é inerentemente problemática: a pirataria, ao que parece, não tem um início ou um final.
Finalmente, há também a questão da geografia. Ainda que a pirataria neste período assolasse muitas partes do mundo, o termo “Era de Ouro” neste contexto fica geralmente restrito àqueles piratas que operavam em ambos os lados do Oceano Atlântico, no Oceano Índico e na costa da África Ocidental. Os que atuavam na Costa Berbere e no Leste da Ásia costumam ser abordados separadamente. A maioria dos piratas desta Era, portanto, são britânicos ou americanos, mas havia várias outras nacionalidades envolvidas, notavelmente holandesa e francesa, e nas tripulações encontravam-se marinheiros de qualquer lugar, incluindo ex-escravos africanos e indígenas.
Permanece a questão da razão do florescimento da pirataria neste período em particular. Homens e mulheres sentiam-se tentados à vida na pirataria pela dureza das condições a bordo de navios mercantes ou da marinha – a grande maioria dos piratas compunha-se de marinheiros experimentados – ou porque não podiam encontrar trabalho adequado após o final das guerras entre Inglaterra e França. Em consequência da Era das Grandes Navegações, as colônias europeias além do Mediterrâneo estavam prosperando. Havia comunidades crescendo em tamanho e riqueza, com o correspondente aumento do transporte marítimo para atendê-las. Mas também se verificava a falta de governança firme e proteção militar em locais tão distantes da terra natal, tornando muitos portos e navios alvos fáceis para piratas que não se importavam com as consequências de seus crimes.
Os Capitães
Algumas tripulações piratas ganharam fama (ou infâmia) por direito próprio, mas os nomes mais fortemente associados ao período são os dos capitães. Enquanto a maioria dos tripulantes usaria a mesma roupa que qualquer marinheiro, os capitães criavam uma moda particular para destacar sua posição, exibindo as vistosas indumentárias típicas da pequena nobreza do período. Bartolomew Roberts (ou “Black Bart” Roberts) ficou famoso por vestir um casaco de seda escarlate, colete damasco combinando e um colar de diamantes. Barbanegra (apelido de Edward Teach) usava fitas negras na barba, carregava seis pistolas e acendia pavios sob seu chapéu sempre que entrava em combate. Sem dúvida, estes piratas queriam criar uma lenda sobre si mesmos temível o suficiente para que uma grande embarcação decidisse se render imediatamente quando abordada - e também para manter a tripulação leal.
Alguns capitães optavam por uma abordagem brutal para ganhar notoriedade. Charles Vane (enforcado em 1721) disparou seus canhões contra o navio do governador das Bahamas, enquanto Edward Low acumulou, entre 1721 e 1724, uma longa lista de crimes hediondos, tais como mutilar, queimar e enforcar suas vítimas. O capitão Stede Bonnet (enforcado em 1718), o “Pirata Cavalheiro”, destacava-se dos demais ao optar por uma vida de pirataria como uma mudança de rumo após passar anos administrando sua própria fazenda em Barbados. A pirataria, ao que parece, atraía todos os tipos de pessoas.
Finalmente, há aqueles piratas que não foram particularmente famosos em seu tempo mas que atraíram posteriormente a imaginação do público por uma razão ou outra. O capitão John Rackham (apelidado de Calico Jack, enforcado em 1720) foi um pirata em pequena escala, atualmente mais famoso por suas tripulantes Anne Bonny e Mary Read, bem como pela bandeira pirata (Jolly Roger) que adotou, com dois sabres cruzados em vez de ossos. O capitão Benjamin Hornigold (m. 1719) destacou-se por abandonar a pirataria para se tornar, em vez disso, um caçador de piratas para o governador das Bahamas. O capitão Samuel Bellamy morreu em relativo anonimato em 1717, quando seu navio Whydah naufragou numa tempestade ao largo de Cape Cod, mas seu nome reviveu após a exploração submarina do naufrágio e sua contribuição inestimável ao nosso conhecimento das pilhagens e navios desta época.
O Navio Pirata
Embora romances e filmes mostrem com frequência grandes galeões comandados por piratas, a realidade em bem diferente. A grande maioria dos piratas preferia algo semelhante às chalupas, rápidas, facilmente manobráveis e capazes de navegar através de águas rasas, nas quais os navios de maior calado não poderiam persegui-las. Além disso, os piratas tipicamente preferiam alvos fáceis, como embarcações mercantes com nada mais do que um punhado de canhões. Porém, houve algumas notáveis exceções, pois alguns capitães optaram por navios de grande porte, capazes de equiparar o poder de fogo das menores embarcações da marinha. O prestígio também representava um fator importante, e não é para menos que os piratas mais notórios e bem-sucedidos tivessem os maiores navios.
O capitão Kidd navegava com o Adventure Galley, construído especialmente para ele. Com três mastros e 287 toneladas, o navio podia perseguir um alvo em todas as condições atmosféricas, graças ao conjunto de velas quadradas, lateen (triangular) e fileiras de remos (46 no total). O Adventure Galley tinha uma tripulação de mais de 150 homens e estava bem armado com 34 canhões. Edward England capturou uma excelente embarcação ao largo de Madagascar em 1720, que ele renomeou como Fancy. Com 34 canhões, o navio contava com uma tripulação de cerca de 180 homens.
Talvez o mais famoso navio pirata é Queen Anne’s Revenge [A Vingança da Rainha Anne}, de Barbanegra, outra embarcação capturada, desta vez de um mercador de escravos francês. O Queen Anne’s Revenge ostentava uma tripulação de pelo menos 300 homens, necessários para guarnecer os 40 canhões a bordo. Porém, a mais poderosa embarcação pirata deste período foi o Royal Fortune, de Bartolomew Roberts. O antigo navio de guerra francês possuía pelo menos 42 canhões e Roberts o usou bem, adaptando-o para maior velocidade e se tornando o mais bem-sucedido de todos os piratas da Era de Ouro em termos de navios capturados, bem mais do que 400.
Métodos de Ataque
Os piratas tipicamente investiam em embarcações mercantes solitárias, geralmente quando eles estavam transpondo um estreito ou próximas a águas rasas ou ilhas, para que o navio pirata pudesse subitamente aparecer do nada. Eles também podiam se aproximar de um alvo exibindo bandeiras de nações amigas. Aproximar-se pela popa costumava ser a tática predileta, pois havia menos canhões postados ali.
A primeira arma que os piratas utilizavam era o terror, que tomava a forma da bandeira pirata (Jolly Roger). Quando esta bandeira era hasteada – geralmente negra com um crânio e ossos cruzados em branco, ainda que existissem muitas variações – uma embarcação mercante recebia o aviso de que piratas se aproximavam e que a coisa mais sensata a fazer seria não opor resistência. Uma bandeira vermelha também podia ser hasteada, sinalizando que não haveria misericórdia se um ataque começasse. Como a maioria das vítimas dispunha de pouco armamento, a abordagem geralmente não encontrava muitas dificuldades.
Para aqueles navios que resistissem, os piratas dispunham de um conjunto de armamento à sua escolha. As embarcações, como vimos, carregavam muitos canhões de vários tamanhos e os homens em si portavam granadas, mosquetes, pistolas, sabres, machados e porretes. Preferia-se não disparar os canhões, devido ao risco de danificar o alvo ou sua carga. Por esta razão, quando canhões eram disparados, seriam tiros de advertência ou tiros de correntes (duas balas de canhão ou barras ligadas por uma corrente curta), destinados a destruir o cordame e mastros e, assim, paralisar temporariamente o alvo. Alguns capitães cediam à tentação de atacar navios de tesouros bem armados, especialmente se comandassem uma frota e desfrutassem de ampla vantagem numérica em canhões e homens. Como os navios de guerra quase sempre superavam os piratas em armamento, eram evitados por eles.
Espólios Piratas
Os piratas preferiam os espólios fáceis de carregar, especialmente ouro, prata e pedras preciosas. As moedas podiam ser utilizadas com facilidade e, assim, um baú de tesouro com pesos de prata espanhóis (também chamados de pieces of eight) ou dobrões de ouro era uma das presas mais desejáveis. A melhor coisa depois disso seria uma carga valiosa. Itens facilmente comercializados incluíam rolos de seda, especiarias, índigo, tabaco, rum, peles, couro, açúcar e outros gêneros alimentícios. A tripulação e os passageiros perdiam todos os seus bens mais valiosos e melhores roupas. Os piratas também arrecadavam armas, instrumentos de navegação e remédios também. Roubavam-se até os itens mais comuns de equipamento náutico, como cordas, velas e âncoras, para recompor os estoques. Por fim, o próprio navio atacado podia se tornar o principal espólio. Os piratas odiavam perder tempo e esforço em reparos náuticos e, assim, transferir-se para uma embarcação em melhores condições de navegação tornava-se uma opção comum, inclusive para modernizar e atualizar o equipamento num navio maior e melhor, capaz de carregar mais canhões.
Ainda que a maioria dos ataques resultasse apenas em mercadorias e bebidas, com talvez umas poucas moedas, houve algumas impressionantes capturas na Era de Ouro. O pirata inglês Henry Every (n. 1653) capturou em 1695 o Ganij-i-Sawai, navio mercante do imperador mogol, que transportava uma carga estimada em 95 milhões de dólares em valores atuais. A parte de cada membro da tribulação correspondeu a mais do que uma vida inteira de salários. Sabiamente, o capitão Every navegou para o horizonte com sua pilhagem e nunca mais foi visto ou se soube dele novamente.
Em 1721, a maior presa única foi capturada por John Taylor e Olivier La Bouche. Juntos, os dois piratas abordaram o navio de tesouro português Nossa Senhora do Cabo nas Ilhas Reunião. Havia 500.000 libras em diamantes, ouro e outros objetos valiosos e uma carga avaliada em 375.000 libras (no total, mais de 250 milhões de dólares em valores atuais).
O saque ficava sob a supervisão do contramestre até que pudesse ser dividido ou vendido e os lucros repartidos. Os membros da tripulação tipicamente tinham direito a uma parte cada, o contramestre e o capitão recebiam duas partes cada e os vários oficiais, marinheiros mais experientes e trabalhadores especializados, como o carpinteiro ou o canhoneiro, ficavam com cerca de uma parte e meia. Eles também seriam compensados por quaisquer ferimentos sofridos durante um ataque. Muito poucos mantinham seus ganhos por tempo suficiente para pensar em escondê-los em algum lugar. Histórias de tesouros enterrados apareciam frequentemente na ficção pirata, mas há poucos registros históricos de tal comportamento. O capitão Kidd realmente enterrou um tesouro, talvez em Long Island, nos Estados Unidos, mas os caçadores nunca o acharam.
Redutos Piratas
Uma vez carregados com saques, os piratas se retirariam para seus redutos. Os principais eram Port Royal (Jamaica), Tortuga (Hispaniola, atual São Domingos), New Providence (Bahamas), no Atlântico, e Madagascar, no Oceano Índico. As escolhas para os redutos recaíam sobre os que dispunham de enseadas seguras e com acesso fácil a água fresca, frutas, carne e madeira no interior da ilha. Outras vantagens seriam estar próximos das principais rotas marítimas, mas não perto demais das autoridades coloniais.
Os mercadores que adquiriam as cargas saqueadas acabavam atraídos para os redutos porque podiam comprar mercadorias com preços baixos e então contrabandeá-las para portos legítimos com altos lucros. Os piratas levaram a pior no negócio, mas conseguiam o que queriam: dinheiro na mão e muita bebida. Alguns capitães, mais ambiciosos, tentavam negociar diretamente naqueles portos coloniais onde funcionários podiam ser subornados e mercadorias vendidas com melhores preços. Alguns destes funcionários, dos quais os mais notórios são Charles Eden, governador da Carolina do Norte, e o coronel Benjamin Fletcher, em Nova York, até concederam perdões a vários piratas.
Muitos redutos logo se transformaram em grandes povoados, com estalagens, bordéis, tendas de mercadores e tudo o mais que os marinheiros necessitavam e desejavam quando descansavam de sua labuta no mar. O porto de New Providence (Nassau) abrigava cerca de 600 piratas em seu auge, por volta de 1700, enquanto Madagascar tinha cerca de 1.500 usando a ilha como base na mesma época. Port Royal era o favorito dos bucaneiros, mas os piratas da Era de Ouro continuaram a fazer bom uso de suas 100 tavernas e outras instalações dúbias que deram origem ao seu apelido de "Sodoma do Novo Mundo". Isso continuou até a destruição do povoado após um terremoto, em 1692.
A Justiça e o Declínio da Pirataria
O governo britânico, pressionado pelos comerciantes, colonos e governantes, tais como o imperador mogol, eventualmente foi obrigado a agir contra a pirataria. Havia um grande receio de que os colonizadores honestos abandonassem as colônias, deixando-as despovoadas ao ponto de se tornarem uma tentação para nações estrangeiras. A partir de 1701, as colônias tiveram permissão de julgar e enforcar piratas por conta própria, em vez de despachá-los para a Inglaterra. Na década de 1710, governadores coloniais como Woodes Rogers (1679-1732), nas Bahamas, tinham sido enviados de Londres especificamente para substituir o aparato governamental colonial, frequentemente corrupto, e dizimar a pirataria na sua área de jurisdição. Estes novos governadores usavam tanto a cenoura quanto a vara para atingir seu objetivo. A vara era representada por navios de guerra e o nó do carrasco, enquanto a cenoura aparecia na forma do perdão do rei Jorge I da Grã-Bretanha (r. 1714-1727) e a promessa de terra e trabalho nas colônias. Muitos piratas aceitaram o perdão e os que recusaram a oferta passaram a ser perseguidos. Uma estratégia adicional que funcionava bem era oferecer recompensas em dinheiro para quem desse informações ou capturasse piratas; muitos destes informantes acabavam sendo seus antigos companheiros de atividade.
New Providence foi encerrada como reduto pirata em 1718. A Marinha Real britânica tornou-se uma presença cada vez mais poderosa no Atlântico ocidental e, quando os governadores coloniais tinham informações sobre negócios sendo feitos em novos redutos, enviavam rapidamente seus navios de guerra. Houve também uma mudança de tática, pois a marinha deixou de lado os navios com artilharia pesada e, como os próprios piratas, passou a optar por corvetas rápidas para perseguir os criminosos dos mares. Ao mesmo tempo, no Oceano Índico, a Companhia das Índias Orientais começou a usar comboios e a proteger de forma mais agressiva suas propriedades. Com seus redutos sob ataque e com menos possibilidades de vender as mercadorias roubadas, a vida na pirataria perdeu muito do seu atrativo. Além disso, aumentou o risco de captura e as punições ficaram mais duras.
Os bons tempos - nos quais se libertava a maior parte da tripulação, após alguns açoites à guisa de aviso, e se enforcava apenas o capitão - tinham terminado. Agora, tripulações inteiras participavam de julgamentos espetaculares que acabavam em execuções em massa. Em 1722, em Cape Coast Castle, na Guiné, na África Ocidental, 52 tripulantes de Bartolomew Roberts foram enforcado em apenas um dia. Em lugares como a Doca da Execução, em Wapping, Londres, ou Deadman's Cay [Recife do Homem Morto], próximo a Port Royal, a visão de piratas enforcados balançando na brisa marinha tornou-se familiar para os moradores e para os navios que passavam. Os piratas mais notórios ficavam pendurados em jaulas de metal e deixados para apodrecer ao ar livre por um ou dois anos. Mesmo quem escapava da sentença de morte com frequência apenas adiava seu destino, devido às longas penas em prisões assoladas por doenças ou em colônias penais, onde encaravam uma curta e dolorosa vida de trabalhos forçados.
A pirataria nunca foi erradicada, já que, no fim das contas, trata-se de um daqueles crimes que parecem ter sempre molestado a humanidade. Porém, à medida que as colônias estabeleciam instituições mais robustas de governo e justiça, mais pessoas estavam interessadas em acabar com a prática. Até mesmo os próprios piratas, pelo menos aqueles que escapavam do nó do carrasco, com frequência se instalavam numa vida mais respeitável em fazendas ou operando como comerciantes honestos, os mesmos alvos que em tempos anteriores haviam aterrorizado.