Os essênios eram uma seita judaica que emergiu no segundo século antes de Cristo e estabeleceu uma comunidade em Qumran. Enfatizavam pureza ritualística, copiavam livros das Escrituras Judaicas e escreviam comentários sobre os livros dos Profetas. Acreditavam que a história estava predestinada, e sua teologia apocalíptica resultou em uma visão de mundo polarizada entre o bem e o mal.
Origens
A Revolta dos Macabeus, conduzida por judeus em 167 a.C., expulsou os ocupantes gregos e estabeleceu um reino de Israel independente. A família dos Asmoneus (que liderou a revolta) juntou o ofício do Rei com o do Sumo Sacerdote no Templo de Jerusalém. Nem todos estavam satisfeitos com o domínio Asmoneu. Os reis de Israel deveriam ser da tribo de Davi, Judá, e o Sumo Sacerdote deveria ser descendente de Zadoque, primeiro Sumo Sacerdote sob o reinado de Salomão. Os Asmoneus não eram capazes de reivindicar nenhuma dessas duas linhagens.
Este é o período em que se encontra evidências do que os acadêmicos chamam de sectarismo judaico. Vários grupos de judeus formavam seitas em seu corpo religioso. Todos concordavam com o básico da Lei de Moisés e dos livros dos Profetas. A grande diferença era a habilidade para viver nessa cultura grega cosmopolita, mantendo as tradições e marcadores de identidade próprios dos judeus. O grupo conhecido como essênios estava entre os maiores opositores da ordem Asmonita de então, assim como eram contra a forma como o Templo estava sendo conduzido.
O nome "essênio" ainda é um problemático debate entre acadêmicos. A palavra em si não aparece nos seus manuscritos, mas somente nos escritos de pessoas de fora do grupo. Aqui encontramos "essaios", sem explicação, mas isso pode indicar "santidade" ou "praticantes da Torah".
Fontes
As principais fontes sobre os essênios vêm do filósofo judeu Filo de Alexandria (20 a.C. a 50 d.C), Plínio, O Velho (23-79 d.C.), em sua História Natural, e o historiador judeu Flávio Josefo (36-100 d.C.). Os autores descreveram os essênios como uma comunidade separada ao norte do oásis de Ein Gedi, na costa do Mar Morto (Qumran). Todos esses escritores afirmam que esses essênios eram celibatários.
As principais fontes para o estudo dos essênios são As Guerras Judaicas (75 d.C.) e Antiguidades Judaicas (94 d.C.), de Flávio Josefo. Nessas obras, o autor descreve as diversas seitas judaicas como "filosofias dos judeus". A partir dos detalhes de Josefo é possível resumir o seguinte sobre os essênios:
- Por volta de 150 a.C., um anônimo conhecido como "Mestre de Justiça", opondo-se aos Asmoneus, levou seus seguidores ao deserto e estabeleceu uma comunidade em Qumran. Em seus documentos, o mestre e seus seguidores eram perseguidos pelos de Jerusalém.
- Os essênios também viviam em povoados e cidades, onde os membros se casavam. Havia uma comunidade em Jerusalém. Um dos portões da cidade era conhecido no 1º século como Portão dos Essênios.
- Os membros passavam por um período de iniciação de três anos (depois adotado pelos cristãos) e enfatizavam rituais com água como o batismo e a restauração da pureza. Em Qumran, foram capazes de instalar uma quantidade fenomenal de cisternas e canais na base rochosa, para usarem nesses rituais.
A maioria dos membros de Qumran passavam o tempo tanto copiando os livros das Escrituras Judaicas quanto escrevendo comentários sobre os Profetas e livros apócrifos. Detalhes da vida em comunidade foram descritos em A Regra da Comunidade e O Documento de Damasco (Aliança de Damasco). Após tornar-se membro, as posses e a riqueza acumulada do comungante eram dividas com os demais membros, conforme a necessidade. Com relação ao conceito de celibato, assim como a palavra "essênios", a palavra equivalente a celibato não aparece nos escritos de Qumran. O cemitério de Qumran foi escavado nos anos 1950, sendo que 43 esqueletos foram desenterrados, alguns sendo mulheres e crianças. Entretanto, a prática de reutilizar cemitérios significa que alguns desses ossos podem ser também de beduínos. As escavações dos túmulos restantes foram interrompidas em Israel por preocupações de rabinos quanto a violações dos túmulos de mortos.
A visão de mundo apocalíptica dos essênios
A teologia dos essênios é descrita como apocalíptica, do grego apokalypsis, "revelação do oculto" ou "conhecimento secreto". Refletindo sobre os desastres nacionais - invasões estrangeiras - de Israel, os Profetas de Israel haviam predito que Deus interviria na história humana mais uma vez, nos últimos dias. Naquele tempo, Deus estabeleceria seu reino na terra. Com os desastres seguintes, primeiro da ocupação grega, depois, da romana, muitos judeus clamaram a Deus para que a promessa fosse cumprida naquele tempo.
A literatura desse período inclui videntes que tiveram experiências fora do corpo, levados a passeios nos Céus, onde lhes eram revelados segredos sobre os últimos dias, geralmente por anjos. Como parte da teologia e prática dos essênios, eles se separavam da maioria dos judeus para esperar a intervenção final de Deus. Enquanto replicavam muitas das obras dos Profetas, as visões dos essênios eram mais radicais, onde tudo era entendido dentro da polaridade entre bem e mal, o que é evidente nos seguintes aspectos do pensamento essênio:
- Dualismo cronológico e ético
- Convicção de que a história é predestinada
- A demonização dos outros
Para os essênios, a história era dividida entre a atual era corrupta e a futura era de perfeição. A era em que viviam era considerada tão meticulosamente má que apenas uma interação violenta de Deus poderia restaurá-la. Entendia-se que a humanidade consistia de dois campos opostos: os filhos das trevas e os filhos da luz (os essênios pertencendo à última). Dado o corrente estado de maldade, eles achavam que os justos deveriam se separar, evitando interação com todos os descrentes.
Os essênios criam que os esforços humanos, independente de boa intenção, não poderiam evitar o desastre que viria ou influenciar Deus a mudar de ideia. Não havia tempo para arrependimento. O destino de uma pessoa já havia sido determinado. Eles também desenvolveram um processo conhecido como a demonização daqueles que não concordavam com os essênios. Sua literatura contém algumas das primeiras polêmicas de que o resto da humanidade (incluindo outros judeus) estavam sob a influência de agentes do Demônio.
A literatura apocalíptica foi a maneira pela qual articulavam tanto a crítica social quanto política. A crítica a governos existentes era equivalente a traição. Assim, escritos apocalípticos utilizaram alegorias e símbolos, para os quais o indivíduo e sua comunidade tinham a chave. Esse é o motivo pelo qual governantes contemporâneos e sumo sacerdotes não são nomeados nos documentos. Isso também dá uma infinita elasticidade interpretativa aos escritos, de modo que eles podem ser aplicados a qualquer era.
Os essênios foram capazes de manter suas visões apocalípticas e seu estilo de vida até a Grande Revolta Judaica de 66 d.C.. Alguns deles participaram na revolta contra Roma, talvez vendo nela uma batalha final. João, o Essênio, é listado como um general em Galileia, e pode ser que alguns tenham estado entre os zelotas na resistência final em Massada. Uma legião romana massacrou a comunidade de Qumran em 68 d.C..
Os Pergaminhos do Mar Morto
Os Pergaminhos do Mar Morto são os escritos coletados que foram descobertos nas cavernas próximas a Qumran em 1946, por um garoto, pastor de ovelhas árabe, que levou vários manuscritos a um negociante do mercado negro de antiguidades em Belém. Como os fragmentos e pergaminhos apareceram no mercado, eles foram distribuídos a uma equipe internacional de acadêmicos para tradução e preservação. Eles incluem 225 textos bíblicos, cópias dos textos apocalípticos mais antigos, as visões apocalípticas dos próprios essênios, manuais, comentários, hinos, orações e maldições. Os manuscritos estão classificados conforme o número da caverna em que foram encontrados (4Q, 11Q, etc.). A datação paleográfica e por carbono, assim como as moedas, dão conta de um intervalo temporal de aproximadamente 135 a.C. a 68 d.C..
Inicialmente, a empolgação da descoberta dos manuscritos antecipou alguma informação sobre Jesus ou sobre as comunidades do cristianismo primitivo. Nenhum escrito contemporâneo a Jesus sobreviveu. Jesus de Nazaré também foi um profeta apocalíptico, e os manuscritos confirmam que ideias similares estavam no ar no primeiro século. Contudo, a descoberta mais importante está na transmissão dos livros bíblicos. Antes da descoberta dos Pergaminhos do Mar Morto, o manuscrito mais antigo das Escrituras Hebraicas eram os textos massoréticos do século X. Agora temos manuscritos mil anos mais antigos, e que confirmam a cuidadosa transmissão textual desse material ao longo do tempo. Em outras palavras, o que hoje lemos nas Escrituras Judaicas são cópias confiáveis dos documentos originais.
Em 1953, os pergaminhos foram colocados no Museu Rockefeller, em Jerusalém Oriental, naquele tempo sob a autoridade da Jordânia. Financiamento limitado e práticas primitivas de restauração contribuíram para a deterioração de alguns desses pergaminhos. Ao mesmo tempo, muitos dos documentos destinados a acadêmicos internacionais ainda não foram publicados. Em sua defesa, muitos desses fragmentos estavam em má forma. Os fragmentos da Caverna 11 (que somam 15.000) tiveram que ser primeiro reorganizados, como um quebra-cabeças.
Em 1991, pelo esforço de Herschel Shanks, editor da Biblical Archaeology Review, assim como de diversos outros acadêmicos, a posse e autoridade sobre os pergaminhos foi assumida pela Autoridade de Antiguidades de Israel, onde hoje são preservados em um museu especial, O Santuário do Livro, em Jerusalém. Todos os pergaminhos e fragmentos existentes estão hoje disponíveis em livros e na internet.