A Revolução Científica (1500-1700), que ocorreu inicialmente na Europa e depois se espalhou pelo mundo, testemunhou uma nova abordagem para a aquisição do conhecimento – o método científico – que utilizava novas tecnologias, como o telescópio, para observar, medir e testar coisas nunca vistas anteriormente. Graças à criação de instituições dedicadas, cientistas conduziam ainda mais experimentos e compartilharam seu conhecimento, tornando-o mais preciso. Ao final desta “revolução”, a ciência tinha substituído a filosofia como o método dominante de adquirir novos conhecimentos e aperfeiçoar a condição humana.
Definindo uma “Revolução”
Datar o início e o fim da Revolução Científica é problemático. Os historiadores não concordam entre si sobre datas precisas, já que a “revolução” não foi um evento dramático simples mas, antes disso, uma longa e gradual série de descobertas e mudanças de atitudes em relação ao conhecimento. O período dos séculos XVI e XVII como um todo geralmente cobre a maioria dos eventos e descobertas pertinentes. Há também o problema de como denominar tais eventos. Esta não foi uma “revolução” no sentido usual da palavra, ou seja, um movimento envolvendo todas as classes, em todos os lugares, sobre um curto espaço de tempo com um objetivo final definido e alcançado no fim das contas. Antes disso, a partir de c. 1500 até aproximadamente 1700, houve uma mudança gradual, mas marcante, em como os pensadores abordavam a aquisição de conhecimento a respeito do mundo ao nosso redor. Os modernos historiadores geralmente se esquivam de utilizar um termo dramático como “revolução” para descrever qualquer mudança profunda no comportamento humano, pois um termo tão amplo carrega consigo uma bagagem indesejada de significados e mascara várias anomalias – neste caso específico, o fato de que a “revolução” jamais foi completa ou completada. Porém, está claro, mesmo na mais rápida avaliação, que algo importante ocorreu na forma como o conhecimento era adquirido antes e como passou a sê-lo desde a Revolução Científica.
Através dos dois séculos da Revolução Científica, os filósofos naturais que ainda aderiam à sabedoria antiga foram lentamente substituídos em importância por cientistas práticos, que usavam instrumentos científicos, como o telescópio e o barômetro, para testar suas hipóteses e então compartilhar e revisar suas descobertas. Desta forma, leis universais podiam ser formuladas, testadas ainda mais e usadas para predizer os resultados de outros experimentos. A matemática, em particular, começou a dominar o pensamento à medida que métodos mais tradicionais de busca do conhecimento, como a mágica, alquimia e astrologia, eram colocadas de lado em favor da experimentação baseada em evidências, mais objetivas e empíricas. Além disso, o grande trio de pensadores antigos dominante durante a Idade Média – Aristóteles (v. 384-322 a.C.), Cláudio Ptolemeu (c. 100 a c. 170 d.C.) e Galeno (129-216 d.C.) - foi deixado de lado enquanto as mentes modernas finalmente olhavam para o futuro, em vez do passado.
Instrumentos como o relógio de pêndulo e o termômetro tornaram possível a medição precisa do mundo ao nosso redor, enquanto os aparelhos óticos revelaram coisas inimagináveis anteriormente, tais como a natureza real da superfície da Lua e a intrincada anatomia de insetos minúsculos. Em todos estes sentidos, portanto, houve de fato uma “revolução” que resultou no descarte de velhas teorias, muitas das quais consideradas verdadeiras desde a Antiguidade, e a substituição por teorias novas em folha, baseadas em descobertas recentes, metodologias inovadoras e no surgimento de outros campos de estudos.
O Método Científico
Uma característica distinta da mudança do pensamento durante a Revolução Científica foi a reavaliação de como novos conhecimentos deveriam ser adquiridos e testados. Experimentos práticos haviam sido conduzidos desde a Antiguidade mas, durante a Idade Média, uma certa abordagem teórica do conhecimento, inicialmente introduzida por pensadores como Aristóteles, veio a predominar. Os debates verbais se tornaram mais importantes do que aquilo que podia ser visto no mundo. Além disso, os filósofos naturais ficaram preocupados com por quê as coisas aconteciam, em vez de primeiro se certificar do quê estava na verdade acontecendo na natureza e como isso ocorria. Um dos primeiros a questionar esta abordagem foi o estadista e filósofo inglês Francis Bacon (1561-1626).
Bacon defendeu uma abordagem mais sistemática e prática, na qual as consequências empíricas (observáveis) dos experimentos fossem verificadas, avaliadas segundo a razão e então abertamente compartilhadas para revisão por outros pensadores. O objetivo final desta atividade deveria ser testar a validade do conhecimento existente e forjar uma nova compreensão do mundo ao nosso redor para que a condição humana pudesse ser melhorada em termos práticos. Por estas razões, Bacon é considerado como um dos fundadores da moderna pesquisa e método científico e até mesmo como o “pai da ciência moderna”. A abordagem de Bacon tornou-se realidade, mas com importantes acréscimos, tais como o uso de hipóteses como parte do processo experimental, a aplicação da matemática para a criação de leis universais e novas tecnologias que ampliavam muito os sentidos.
O método científico envolvia os seguintes componentes fundamentais:
- Condução de experimentos práticos.
- Condução de experimentos sem preconceitos sobre o que deveriam comprovar.
- Uso do raciocínio dedutivo (criação de generalizações a partir de exemplos específicos) para formular uma hipótese (teoria sem comprovação), que então é testada por um experimento, após o qual a hipótese pode ser aceita, alterada ou rejeitada baseada na evidência empírica (observável).
- Condução de múltiplos experimentos, em diferentes locais e por outras pessoas, para testar a confiabilidade dos resultados.
- Revisão aberta e crítica dos resultados dos experimentos pelos colegas.
- Formulação de leis universais (raciocínio dedutivo ou lógica) usando, por exemplo, a matemática.
- Desejo de obter benefícios práticos de experimentos científicos e crença na ideia do progresso científico.
(Observação: os critérios acima são expressos em termos linguísticos modernos, não necessariamente os que seriam usados pelos cientistas do século XVII, já que a revolução na ciência também levaria à revolução na linguagem que a descreve.)
Invenções Importantes
A Revolução Científica testemunhou um grande número de novas invenções, ou seja, inovações tecnológicas que permitiam não somente a descoberta de coisas novas sobre o mundo, mas também meios de medir, testar e avaliar estes fenômenos. As mais importantes invenções da Revolução Científica incluem:
- Telescópio (c. 1608)
- Microscópio (c. 1610)
- Barômetro (1643)
- Termômetro (c. 1650)
- Relógio de Pêndulo (1657)
- Bomba de Ar (1659)
- Relógio com Mola Helicoidal de Balanço (1675)
Descobertas Importantes
Com as invenções acima e outras, os cientistas em diferentes países fizeram muitas descobertas e campos de estudo totalmente novos tornaram-se possíveis, tais como meteorologia, anatomia microscópica, embriologia e ótica.
O italiano Galileu Galilei (1564-1642) construiu o mais poderoso dos telescópios iniciais e, com ele, descobriu as montanhas e vales da superfície da Lua, que se acreditava anteriormente ser composta de alguma substância desconhecida. Galileu identificou quatro luas do planeta Júpiter e as fases de Vênus. Observou manchas solares, o que o levou a sugerir que o Sol fosse uma esfera em rotação. O alemão Johannes Kepler (1571-1630) criou um novo tipo de telescópio com duas lentes convexas, que utilizou para observar corpos celestes e confirmar a visão heliocêntrica do sistema solar proposta por por Nicolau Copérnico (1473-1543). Finalmente, demonstrou-se que o modelo geocêntrico de Ptolemeu estava incorreto. Em acréscimo, Kepler mostrou que os planetas se moviam em órbitas elípticas e não circulares.
O astrônomo italiano Gian Domenico Cassini (1625-1712) identificou os espaços nos anéis de Saturno. Johannes Hevelius (1611-1687), em Danzig (moderna Gdansk), descobriu a primeira estrela variável e criou um mapa detalhado da superfície da Lua. O astrônomo inglês Edmond Halley (1656-1742) instalou um observatório na ilha de Santa Helena, no Atlântico Sul, em 1677, para criar o primeiro mapa das estrelas meridionais usando um telescópio. Halley também descobriu a aceleração da Lua, observou o movimento das estrelas em relação às outras (movimento próprio) e identificou o cometa de 1682 como o mesmo de 1607 e 1531.
O cientista inglês Isaac Newton (1642-1727) inventou o telescópio refletor em 1668, usando um espelho curvo. Ele descobriu que a luz branca consiste num espectro de cores e formulou a Teoria da Gravidade Universal, que explicava por que os objetos caem na terra e por que os corpos celestes movem-se da forma como o fazem.
A invenção do microscópio, de muitos modos o oposto natural ao telescópio, é geralmente creditada ao fabricante de óculos Hans Lippershey (c. 1570 a c. 1619), que vivia na ocasião nos Países Baixos. O italiano Marcello Malpighi usou um microscópio para descobrir os vasos capilares do sistema sanguíneo em 1661. Eram o elo perdido entre artérias e veias e isso confirmou a descoberta de William Harvey sobre a circulação do sangue. Comprovava-se que as concepções de Galeno de como o corpo humano funcionava eram totalmente inadequadas ou simplesmente erradas.
O pesquisador inglês Robert Hooke (1635-1703) usou seu microscópio para criar desenhos sensacionais de um novo mundo em miniatura, publicados em sua obra Micrografia (1665). O holandês Antonie van Leeuwenhoek (1632-1723) introduziu um novo tipo de telescópio que usava uma conta de vidro como lente, o que lhe deu uma magnificação muito maior do que era possível anteriormente. Leeuwenhoek descobriu as bactérias, protozoários, células vermelhas do sangue, espermatozóides e como insetos e parasitas minúsculos se reproduziam. Outro microscopista holandês, Jan Swammerdam (1637-1680), observou que as centopeias contêm o que se torna depois as asas da borboleta, após a metamorfose. Finalmente, Nehemiah Grew (1641-1712) fundou a anatomia botânica, baseando-se em estudos aprofundados sobre os órgãos sexuais das plantas.
O barômetro, inventado em 1643 pelo italiano Evangelista Torricelli (1608-1647), deu condições aos cientistas de compreender a pressão atmosférica. O francês Blaise Pascal (1623-1662) usou o aparelho para demonstrar que a pressão do ar varia conforme a altitude. Já o alemão Otto von Guericke (1602-1686) observou que a pressão do ar varia também dependendo do clima. O barômetro recebeu seu nome do cientista inglês Robert Boyle (1627-1691), que também pesquisou sobre as bombas de ar. Boyle e seu parceiro, Robert Hooke, foram capazes de demonstrar como o vácuo pode existir e submeteram vários tipos de espécimes a mudanças na pressão do ar dentro da bomba de ar. Desta forma, Boyle formulou um princípio universal que se tornou conhecido como "Lei de Boyle". Esta lei estabelece que a pressão exercida por uma certa quantidade de ar varia inversamente na proporção do seu volume (desde que as temperaturas sejam constantes).
Um aparelho relacionado, o termômetro líquido, surgiu em Florença por volta de 1650, transformando a medicina, pois permitia que os médicos medissem a temperatura do paciente além de meros “quente”, “frio” e “normal”. Com o dispositivo, muitos experimentos passaram a ter seus resultados medidos e comparados com precisão.
O primeiro modelo funcional do relógio de pêndulo foi inventado em 1657 pelo holandês Christiaan Huygens (1629-1695). Neste tipo de relógio, a regularidade do balanço do pêndulo controla com precisão a queda de um peso. Os melhores perdiam no máximo 15 segundos por dia, comparados com os 15 minutos dos relógios mecânicos da época. A contagem do tempo ficou mais acurada com a invenção, em 1675, de relógios usando molas helicoidais de balanço. Este grande salto adiante em precisão não somente ajudou cientistas a monitorar melhor seus experimentos e o tempo de observação de objetos no espaço, mas também revolucionou a própria ideia do tempo para todos. Foi o primeiro passo em direção ao Tempo Universal e, com ele, vieram os conceitos de chegar adiantado, na hora ou atrasado na vida cotidiana.
Ciência Institucionalizada
Outro desenvolvimento fundamental da Revolução Científica, além dos novos métodos ou novas tecnologias, foi a criação de instituições dedicadas à pesquisa. Nesta época, as universidades (com a possível exceção do departamento de medicina) não se preocupavam com a pesquisa, somente com o ensino. Demandava-se um novo tipo de instituição, onde os cientistas pudessem trabalhar juntos, compartilhar seus achados e, mais importante do que tudo, receber financiamento para suas pesquisas. Com isso, novas academias e sociedades espalharam-se pela Europa. A primeira sociedade do tipo, a Accademia Del Cimento, em Florença, surgiu em 1657. Outras logo se seguiram, notavelmente a Sociedade Real, em Londres (1663), e a Academia Real de Ciências de Paris (1667). Os responsáveis pela criação da Sociedade Real deram o crédito a Bacon pela ideia e estavam ansiosos em seguir seus princípios de método científico e a ênfase no compartilhamento e comunicação de dados e resultados científicos. A Academia de Berlim surgiu em 1700 e a de São Petersburgo em 1724. Estas academias e sociedades se tornaram os pontos focais de uma rede internacional de cientistas que se correspondiam, liam os trabalhos uns dos outros e até visitavam os laboratórios e observatórios dos colegas, à medida que o novo método científico se consolidava. O público também se envolvia, seja indiretamente, através de diários e livros publicados, ou diretamente, graças à oportunidade de comparecer a experimentos e demonstrações nas sedes das sociedades ou ao ar livre.
Que houve uma elevação na cooperação internacional na Revolução Científica é indicado pelos convites a estrangeiros para se tornarem membros destas entidades. Houve tentativas de padronizar certos experimentos através das fronteiras, além dos instrumentos que os vários cientistas usavam. Por exemplo, o alemão Gabriel Fahrenheit (1686-1736) elaborou a escala que leva seu nome para termômetros por volta de 1714. Anders Celsius (1701-1744), da Suécia, criou uma escala rival, mas ter duas escalas nos termômetros era um enorme avanço em relação aos primeiros dias, quando os cientistas simplesmente usavam suas próprias escalas, uma situação que fazia a comparação de resultados extremamente difícil. Havia, também, a cooperação entre cientistas, apesar de pertencerem a impérios europeus rivais, e foi através destes impérios coloniais, especialmente o holandês, francês e britânico, que as ideias da Revolução Científica se disseminaram muito além da Europa.
Reação ao Método Científico
Nem sempre a reação à Revolução Científica foi positiva. Alguns intelectuais desconfiavam da confiabilidade dos novos instrumentos científicos. Havia os céticos quanto à experimentação em geral, que alegavam que os sentidos podiam ser enganadores, ao contrário do raciocínio mental. Um destes descrentes foi René Descartes (1596-1650) mas, de fato, ele e outros filósofos naturais que questionavam o valor dos experimentadores práticos criaram uma nova divisão entre a filosofia e o que chamaríamos hoje de ciência. Não se usava amplamente o termo “ciência” no século XVII e, em vez disso, muitos experimentadores denominavam-se praticantes da "filosofia experimental". O primeiro uso em inglês do termo "método experimental" ocorreu em 1675. O desenvolvimento destes termos ilustra que uma ruptura estava acontecendo entre os pensadores teóricos e práticos.
Alguns até questionavam se a humanidade deveria aprofundar-se num mundo previamente despercebido, que consideravam como um assunto divino. Houve um embate entre ciência e religião quando surgiu a questão da organização do universo. Representantes da Igreja preferiam sustentar a ideia de que a Terra e a humanidade deveriam estar no centro do universo e, assim, pensadores como Galileu, que apoiavam o modelo heliocêntrico de Copérnico, acabaram acusados de heresia. Porém, como cristãos, a maioria dos cientistas tinha pouco desejo de desafiar os ensinamentos da Bíblia e simplesmente queria explicar como o mundo era feito. De fato, alguns argumentavam que o telescópio e o microscópio demonstraram a complexidade da vida e, assim, devia-se ficar ainda mais maravilhado com a obra de Deus.
Existia ainda lugar para Deus neste novo mundo científico, pois os pensadores como Isaac Newton, por exemplo, só podiam explicar que a gravidade movia planetas, mas não de onde veio ou por que existe. Havia limites ao conhecimento humano. Os médicos sabiam agora por que certas doenças apareciam, mas desconheciam como curá-las. O grande problema da longitude, que permitiria aos navegadores rastrear sua posição em torno do globo, permanecia insolúvel. A tecnologia ainda era frustrantemente limitada em muitas áreas.
Para o Futuro
Os novos instrumentos científicos resultaram em descobertas num ritmo rápido, com frequência causando assombro em como a vida podia ser complexa. Os telescópios, numa ponta da escala, e os microscópios, na outra, revelaram que um sistema completo de medidas seria necessário para a mente humana assimilar a escala das maravilhas do universo visível. Anteriormente, o corpo humano fora usado como base para o sistema de medidas, mas logo nanômetros e anos-luz seriam necessários. Houve mudanças importantes em como as pessoas de todas as classes viam os novos mundos abertos pelos cientistas. Isso é melhor observado na ficção popular do período, que começou a discutir ideias intrigantes, senão preocupantes, como o universo infinito ou que os minúsculos parasitas tinham parasitas ainda menores, que por sua vez portavam parasitas ainda menores. Poderia ser possível algum dia viajar para a Lua? Já que a Terra não era mais o centro do universo, isso não significava que poderiam haver outros planetas habitados por formas de vida?
Havia, no entanto, em meio a esta perplexidade, uma nova confiança e crença, com certeza entre os cientistas, de que a tenologia e a ciência, com o tempo, dariam todas as respostas que a humanidade necessitava para viver melhor, por mais tempo e com maior felicidade. Os novos mecanismos de relojoaria, com suas engrenagens sofisticadas; o uso de pistões nas bombas de ar; e a descoberta do poder da pressão do ar inspiraram engenheiros a inventar novos mecanismos, como as máquinas a vapor, enquanto uma revolução ainda maior assomava no horizonte: a Revolução Industrial Britânica.
A Revolução Científica teve outro efeito duradouro: a consolidação da ciência como o método mais reconhecido para se chegar à verdade, uma posição de dominância que ainda mantém nos dias de hoje. Quando falamos sobre teorias, hipóteses, leis da natureza, evidências, fatos e progresso, usamos termos cunhados durante a Revolução Científica; debater o conhecimento sem usar estes termos é impensável e nisso, talvez, reside o verdadeiro legado desta revolução em ideias, métodos e tecnologia.