O bombardeiro pesado B-17 Flying Fortress [Fortaleza Voadora] da Boeing foi um avião com quatro motores utilizado pelas forças aéreas dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45). Esta aeronave tinha um armamento pesado defensivo fora do comum, com 13 metralhadoras ao todo em alguns modelos. Os B-17s estiveram envolvidos no bombardeio estratégico na Europa, no Pacífico e em outros teatros da guerra.
Projeto e Desenvolvimento
Em agosto de 1935, a Força Aérea dos Estados Unidos organizou uma avaliação dos protótipos fornecidos por vários fabricantes de aviões em Wright Field, no estado de Ohio. A Companhia de Aviação Boeing mostrou seu Modelo 299, com quatro motores e, após testes extensivos, a aeronave impressionou o suficiente para conquistar a luz verde para a produção de 13 exemplares do novo bombardeiro, que se tornaria conhecido como Boeing 17. Esses aviões voaram pela primeira vez em dezembro de 1936.
O B-17 entrou em operação na Força Aérea do Exército dos EUA (USAAF) em 1937 e, assim, tornou-se o primeiro bombardeiro monoplano quadrimotor com estrutura totalmente metálica do mundo. O primeiro esquadrão de B-17 estava baseado em Langley Field, no estado norte-americano da Virgínia. Houve encomendas para mais aeronaves, mas, nesta época, a Força Aérea ainda fazia parte oficialmente do exército americano, que disputava recursos com a Marinha. Por esse motivo, menos de 30 B-17 estavam operacionais quando a Segunda Guerra Mundial eclodiu na Europa, em setembro de 1939. Felizmente para os Aliados, não aconteceu muita coisa na guerra até março de 1940 e os EUA conseguiram colocar no ar mais 39 B-17s. Ainda se tratava de um número lamentavelmente inadequado e novos bombardeiros foram encomendados e produzidos até o verão de 1940.
O B-17 dava condições para que as campanhas de bombardeio fossem conduzidas a partir de uma altitude elevada, ainda que, nesta fase da guerra, não estivesse claro se os EUA iriam realmente utilizá-los. Os exemplares iniciais do bombardeiro tinham apenas cinco metralhadoras pequenas instaladas, mais tarde aumentadas para sete. Com os EUA mantendo sua política isolacionista, o presidente Franklin D. Roosevelt (v. 1882-1945) passou a fornecer armas à Grã-Bretanha, em vez de se engajar diretamente no conflito. Vinte B-17 foram fornecidos à Força Aérea Real (RAF, na sigla em inglês) britânica nos primeiros meses de 1941. Foram os primeiros a entrar em ação, bombardeando Wilhelmshaven, na costa alemã, em 8 de julho de 1941. Mais operações se seguiram, mas nelas se demonstrou que a capacidade do avião de voar em alta altitude não representava uma defesa suficiente contra os caças inimigos. Havia necessidade de armamentos de alto calibre e os aviões foram retirados de serviço pela RAF.
A aeronave continuou passando por diversas melhorias de projeto. A partir da versão E, o B-17 passou a contar com mais armamento de alto calibre; tanques de combustível autovedantes, que resistiam melhor ao fogo inimigo; uma cauda maior para conferir mais estabilidade; e blindagem extra para proteção das tripulações. O B-17F tinha tanques de combustível ainda maiores e trem de pouso reforçado para que mais bombas pudessem ser transportadas. O modelo com maior produção durante a Segunda Guerra Mundial foi o B-17G, que tinha duas metralhadoras adicionadas no nariz da aeronave. Fabricados a partir de 1943, em instalações da Boeing, Douglas e Lockheed Vega, 8.680 B-17Gs saíram da linha de produção. Ao todo, foram construídos 12.731 exemplares de todos os modelos deste bombardeiro.
A Tripulação
A tripulação do B-17 compunha-se de dez homens: o piloto, o copiloto, o navegador, o bombardeador, o engenheiro e um operador de rádio (ambos atuavam como artilheiros na fuselagem superior), e mais quatro artilheiros (na barriga, nas laterais de bombordo e estibordo e na cauda). Os pilotos, o navegador e o bombardeador eram oficiais. Todas as tripulações se voluntariavam para as missões de bombardeiro. Devido aos riscos envolvidos, os pilotos da USAAF tinham um limite máximo de 25 missões por turno de combate, posteriormente estendido para 35.
O bombardeador usava a mais recente tecnologia disponível, a mira Norden, mas ainda precisava de visibilidade clara do alvo, uma ocorrência rara, dado que o ar acima dos alvos estava frequentemente obscurecido pela combinação da fumaça decorrente dos incêndios abaixo e do fogo antiaéreo, além da cobertura de nuvens. Para alvos completamente ocultos, empregava-se o sistema de radar de busca terrestre H2S (chamado H2X na USAAF), embora ele pudesse ser bloqueado por sinais enviados pelos aviões inimigos.
Especificações
O B-17 contava com quatro motores turbopropulsados Wright Cyclone, capazes de alcançar 1.200 cv (895 kW) cada. A aeronave media 22,66 m de comprimento e tinha uma envergadura de 31,62 m. Alcançava a velocidade máxima de 462 km/h, com um teto de serviço de 10.850 m. O voo acima de 3.084 m exigia que a tripulação usasse máscaras de oxigênio. O alcance máximo do B-17 ficava em torno de 3.220 km.
A aeronave ganhou o nome de "fortaleza" porque foi concebida inicialmente como uma fortaleza móvel, capaz de defender o litoral dos Estados Unidos. Durante a guerra, o nome parecia particularmente apropriado, tendo em vista que a aeronave estava repleta de metralhadoras. Essas armas tinham o propósito de defender o bombardeiro contra caças inimigos como o japonês Mitsubishi A6M Zero e o alemão Messerschmitt Bf 109. O B-17 tinha cinco torres principais e várias portinholas para metralhadoras. Havia duas metralhadoras no nariz e duas no espaço do bombardeador, que ficava abaixo. Outras duas armas localizavam-se numa torre acima dos pilotos, uma mais abaixo da espinha do avião, duas na parte inferior, logo atrás das asas, uma de cada lado da fuselagem, voltadas para a retaguarda, e duas na cauda. Todas as 13 metralhadoras do B-17G tinham calibre de 12,7 mm, capazes de disparar 800 tiros por minuto.
Havia um preço a pagar por uma tripulação tão grande e tantas metralhadoras: a limitação do peso das bombas que a aeronave podia carregar. O B-17 conseguia transportar uma carga total de 2.722 kg de bombas, uma quantidade significativa, mas bem menor do que o bombardeiro Lancaster da RAF, que carregava 6.350 kg de múltiplas bombas ou uma única bomba gigante de 10 toneladas. A Fortaleza Voadora podia ser carregada com menos combustível e, assim, elevar a capacidade de carga do compartimento de bombas para 7.983 kg, mas isso ocorria somente em missões de curta distância.
Operações
Em 1941, quatro esquadrões de B-17s foram enviados para as Filipinas, onde a USAAF tinha uma grande base em Clark Field, na ilha de Luzon. Infelizmente, a maioria das 35 aeronaves acabou destruída ou bastante danificada num ataque aéreo japonês em 8 de dezembro de 1941, um dia após o ataque a Pearl Harbour, a base naval dos EUA no Havaí. Outro teatro de guerra onde atuou foi o Oriente Médio. Principalmente utilizado como um bombardeiro, o B-17 podia ser adaptado para uma gama de propósitos específicos, tais como reconhecimento, resgate aéreo, transporte de carga ou de pessoal e aeronave de treinamento.
O B-17 foi o bombardeiro de ataque preferido pela USAAF na Europa durante a Segunda Guerra Mundial, embora outros também tenham sido empregados em larga escala, tal como o B-24 Liberator (na verdade, a aeronave com maior produção durante o conflito). Estes bombardeiros faziam parte da Oitava Força Aérea dos EUA, sediada em bases na Grã-Bretanha. As primeiras aeronaves a voar com a bandeira dos Estados Unidos na Europa faziam parte do 97° Grupo de Bombardeamento, que atacou Rouen, na França, em 17 de agosto de 1942, com escolta de caças Supermarine Spitfire da RAF.
O ator hollywoodiano James Stewart (1908-1997), que voou em vários tipos de bombardeiros durante a guerra e trabalhou como instrutor para tripulações de B-17 por algum tempo, afirmou a respeito dos perigos dos bombardeiros sobre a Europa:
O caça era o bicho-papão pela tremenda e cruel defesa que representava. O fogo antiaéreo, embora tenha ficado muito mais sério na última parte da guerra, por alguma razão sempre achei que as chances eram melhores a nosso favor com ele. O caça, porém, tinha olhos e, na grande maioria dos casos, um piloto bem competente nos controles e, quando vinha em sua direção, você sabia que estava com problemas. (Holmes, 428)
A RAF descobriu que o bombardeio diurno resultava em perdas muito elevadas devido aos caças inimigos e à artilharia antiaérea no solo. Consequentemente, alterou seus planos para o bombardeio noturno, horário em que se tornava muito mais difícil encontrar e atacar as aeronaves. Infelizmente, isso também significava que a precisão do bombardeio ficava seriamente reduzida. Eventualmente, isso levou à adoção de uma nova estratégia que, em vez de mirar alvos definidos, como fábricas, despejava bombas sobre uma grande região na esperança de atingir os alvos principais. Esta estratégia de ataque, conhecida como bombardeio de área, resultava na morte de um grande número de civis.
Quando a USAAF juntou-se à campanha de bombardeios estratégicos na Europa, tentou novamente conduzir ataques diurnos em alvos específicos e vitais ao esforço de guerra alemão. O alto comando da Força Aérea americana acreditava que, nos voos sobre a Alemanha, poderia evitar as grandes perdas que a Lutfwaffe alemã tinha experimentado na Batalha da Inglaterra, tendo em vista que suas aeronaves tinham armamento pesado e podiam voar numa formação mais coesa, na qual os artilheiros protegiam seus vizinhos e atingiam os caças que se aproximavam com uma barragem de projéteis. A formação típica da USAAF contava com seis aviões formando um "W", com o líder ao centro e ligeiramente à frente do grupo. Numa formação mais compacta, adotada a partir de setembro de 1942, os B-17s voavam em grupos de 18, numa linha em zigue-zague com cerca de 700 metros de comprimento e 150 metros da frente à retaguarda. Além disso, a linha ficava escalonada verticalmente, de forma que metade dos aviões voava 152 metros acima da segunda metade. O problema com esta formação ocorria quando os aviões faziam uma curva, o que inevitavelmente deixava os desgarrados expostos aos caças inimigos. A solução veio com três formações reunidas, criando um grupo compacto com 54 bombardeiros. A formação 54 media cerca de 2.000 metros de largura e 800 metros de profundidade. À medida que o conflito progredia, a formação de 54 aviões ficou ainda mais compacta e, então, precisou ser expandida novamente, pois a artilharia antiaérea alemã se intensificou no final da guerra.
Até certo ponto, as formações mais compactas tinham melhor desempenho, mas as perdas ainda se mostravam muito elevadas. Os caças alemães logo perceberam que o ponto fraco do B-17 era o nariz e, assim, atacavam pela frente e evitavam as demais metralhadoras, em sua maioria dispostas para a defesa de ataques pela retaguarda. Também havia um número significativamente maior de colisões aéreas, devido à estreita proximidade das aeronaves na formação de voo. Finalmente, como ocorria com todos os bombardeiros pesados, diante dos ágeis caças, os B-17s, mais lentos, tornavam-se alvos fáceis para os pilotos alemães, caso estes conseguissem se infiltrar na formação e desfazê-la. Como o historiador da aviação R. Neillands declara, "a lição duramente aprendida que o bombardeiro não podia operar por conta própria de dia sobre território ocupado pelos alemães precisava ser aprendida novamente - a um custo considerável em termos de vidas de jovens americanos" (163). Muitas missões perdiam mais do que 10% dos aviões participantes, percentual considerado o limite operacional absoluto.
Um piloto de B-17, Bruce Kilmer, relembrou sua primeira missão diurna como parte de um grupo enviado para atacar uma fábrica em Antuérpia, na Holanda, em maio de 1943:
Nosso grupo colocou no ar um total de dezoito B-17s e, como a USAAF não dispunha de caças disponíveis naquele momento, seríamos escoltados por Spitfires britânicos – mal sabíamos que eles tinham alcance apenas para a travessia do canal. Nem estávamos mentalmente preparados para o número de FW 190 de nariz amarelo e Me 109 de tabuleiro de xadrez, que pareciam estar em toda parte. Os pilotos alemães eram muito bons e ousados e, naquela época, achávamos que a artilharia antiaérea sobre alvo seria bastante fraca – ainda não havíamos estado na Alemanha. De repente, quando os bandidos começaram a atirar em nós, voar deixou de ser divertido. Perdemos dois aviões e vinte homens naquele dia – nossa primeira missão; restavam ainda outras 24. (Neillands, 211)
Em consequência da adoção das formações mais compactas, o bombardeio de precisão acabou abandonado e, assim, a técnica padrão de bombardeio foi adotada, na qual se despejavam todas as bombas ao mesmo tempo. Por essa razão, à medida que a guerra avançava, o bombardeio noturno da RAF - que realizava pequenas, mas sucessivas, ondas de bombardeios sobre um alvo previamente definido -, tornou-se mais preciso do que o bombardeio diurno da USAAF.
A partir de março de 1944, um novo acontecimento mudou radicalmente o equilíbrio em favor dos bombardeiros: a chegada do caça P-51 Mustang. Com um alcance muito maior do que as aeronaves disponíveis anteriormente, o Mustang escoltava os esquadrões até os alvos, protegendo-os dos caças inimigos. A escolta eliminava a necessidade de voo em formações tão compactas; a versão mais difusa tendia a contar com três esquadrões de 12 aviões em formações em formato de flecha e, posteriormente, ainda mais expandida, com quatro esquadrões de nove bombardeiros voando em diferentes altitudes.
Há um mito comum segundo o qual a USAAF bombardeava alvos militares específicos e a RAF atingia cidades durante a Segunda Guerra, mas isso não corresponde à realidade. Ambas realizaram os dois tipos de ataques durante o conflito. Além disso, não havia tecnologia disponível, até 1944, seja entre os Aliados ou no Eixo, para os bombardeios com grau elevado de precisão. Os "danos colaterais" eram inevitáveis, mesmo no caso de alvos específicos, já que a ação abrangia uma ampla área ao seu redor e, portanto, caso houvesse moradias, ocorria um grande número de vítimas civis. É verdade, no entanto, que a RAF se concentrava em ataques noturnos e a USAAF optava pelos diurnos. Esta Ofensiva Combinada de Bombardeiros trazia uma pressão constante para as defesas alemãs. Às vezes, alvos específicos eram atacados numa combinação noturna durante vários dias, como ocorreu em Hamburgo, na Operação Gomorra, realizada em julho-agosto de 1943.
O Ataque a Schweinfurt-Regensburg
A Fortaleza Voadora envolveu-se tanto em bombardeios de área e como a alvos especificamente identificados. Um exemplo famoso deste último é o ataque às fábricas de Schweinfurt e Regensburg (ou Ratisbona), na Alemanha, em 17 de agosto de 1943 e novamente em 14 de outubro. Em Schweinfurt, havia cinco fábricas que produziam rolamentos de esferas, um componente crucial para todos os tipos de máquinas militares, enquanto Regensburg tinha uma importante fábrica de aeronaves Messerschmitt. O plano consistia em atacar em duas ondas de bombardeiros bem cronometradas para que os caças inimigos não tivessem tempo de reabastecer e se rearmar quando a segunda onda atingisse o alvo. Ao todo, 376 B-17s atacaram as duas cidades em agosto.
Os ataques combinados foram considerados um sucesso parcial, pois afetaram seriamente a produção inimiga, mas a um custo bastante elevado. Perderam-se quase 150 aeronaves, um insustentável nível de perdas. 482 aviadores foram perdidos, dos quais mais de 100 foram mortos apenas no ataque de agosto. Infelizmente para os Aliados, a Alemanha dispunha de reservas de rolamentos de esferas, o que significava que poderia manter o fornecimento até que as fábricas fossem reparadas. No entanto, o ministro alemão dos Armamentos, Albert Speer (1905-1981), observou:
Naturalmente, estávamos com medo de que houvesse outros ataques a Schweinfurt e, na verdade, houve outros ataques, mas tarde demais. Se vocês tivessem repetido esses ataques logo em seguida, sem nos dar tempo para reconstruir, então o resultado seria desastroso. (Holmes, 431).
O Ataque a Dresden
Em 14 de fevereiro de 1945, 311 B-17s despejaram suas bombas em Dresden, logo em seguida ao bombardeio da RAF na noite anterior, que empregou 796 Lancasters. O alvo principal dos bombardeiros eram os pátios ferroviários de triagem, mas inevitavelmente outras partes da cidade foram atingidas. Mais Fortalezas Voadoras retornaram para bombardear Dresden em 15 de fevereiro e 2 de março. Cerca de 30.000 civis morreram nestas incursões em 1945. O tenente-general Eaker, comandante da Oitava Força Aérea, disse o seguinte sobre o controverso bombardeio de Dresden:
Não concordo que houve exagero. Pode ter ocorrido em Dresden, mas tenha em mente que os russos solicitaram a destruição daquele grande complexo ferroviário porque a maioria das armas, suprimentos e reforços destinados à seção central da Frente Oriental passava por ali. (Holmes, 440)
Legado
Um dos mais famosos aviões da Segunda Guerra Mundial, a Fortaleza Voadora ganhou status icônico como um dos maiores bombardeiros da USAAF durante a campanha europeia, realizando incontáveis missões na Alemanha, Itália e Europa ocupada, bem como atuando no apoio ao desembarque na Normandia durante o Dia D e nas campanhas através da Europa Ocidental. No teatro de ação do Pacífico, o B-29 Superfortress [Superfortaleza] predominou. Tratava-se de uma aeronave muito maior e mais sofisticada do que o B-17, com o dobro da capacidade de carga de bombas. O B-29, o verdadeiro sucessor do B-17, lançou as bombas atômicas nas cidades japonesas de Nagasaki e Hiroshima em agosto de 1945.