Troia

Definição

Mark Cartwright
por , traduzido por Ricardo Albuquerque
publicado em 11 maio 2018
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The Trojan Horse (by Tetraktyas, CC BY-SA)
O Cavalo de Troia
Tetraktyas (CC BY-SA)

Troia é o nome da cidade da Idade do Bronze atacada na Guerra de Troia, uma história popular da mitologia da Grécia Antiga, e também o nome de um sítio arqueológico situado a noroeste da Ásia Menor (atualmente parte da Turquia), que revelou um grande e próspero núcleo urbano, ocupado por mais de um milênio. Muitos debates acadêmicos foram travados a respeito da existência real da Troia mítica e da sua relação com o sítio arqueológico. Atualmente, porém, há um consenso quase universal de que as escavações revelaram o local descrito na Ilíada de Homero. Outros nomes para Troia incluem Hisarlik (denominação turca), Ílios (Homero), Ílion (grego) e Ilium (romano). O sítio arqueológico de Troia está relacionado pela UNESCO como Patrimônio Mundial.

O Mito de Troia

Troia é o cenário da Ilíada de Homero, obra na qual ele relata o ano final da Guerra de Troia, em algum momento no século XIII a.C. De acordo com este relato, a guerra consistiu num cerco de 10 anos à cidade por uma coalizão de forças gregas lideradas pelo rei Agamenon, de Micenas. A expedição tinha o propósito de resgatar Helena de Troia, esposa de Menelau, rei de Esparta e irmão de Agamenon. Sequestrada pelo príncipe troiano Páris, Helena representava o prêmio pela escolha de Afrodite como a deusa mais bela, numa competição com Atena e Hera. A Guerra de Troia também é contada em outras fontes, como os poemas do Ciclo Épico (dos quais só existem fragmentos) e também é brevemente mencionada na Odisseia de Homero. Posteriormente, Troia e a Guerra de Troia tornaram-se os principais mitos da Grécia Clássica e da literatura romana.

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Na Ilíada, Homero descreve Troia como "bem habitada", "fortemente construída" e com "belas muralhas".

Na Ilíada, Homero descreve Troia como "bem habitada", "fortemente construída" e com "belas muralhas", há também várias referências às belas ameias, torres e às muralhas "altas" e "íngremes". As muralhas devem ter sido extraordinariamente fortes para resistir a um cerco de dez anos e, de fato, a cidade caiu devido ao ardil do cavalo de Troia e não por falhas defensivas. Conforme a mitologia grega, as impressionantes muralhas teriam sido erguidas pelos deuses Poseidon e Apolo que, após um ato de impiedade, foram condenados por Zeus a servir o rei troiano Laomedonte por um ano. No entanto, as fortificações não tiveram grande utilidade para o rei quando Hércules saqueou a cidade com uma expedição de apenas seis navios. Tratava-se de uma vingança do herói que, a pedido do rei, matou uma serpente marinha enviada por Poseidon e não recebeu pagamento. Tradicionalmente, este episódio ocorreu uma geração antes da Guerra de Troia, já que o único sobrevivente masculino da família real - o filho caçula de Laomedonte, Príamo - reinava na cidade no conflito posterior.

Black-figured amphora (wine-jar) signed by Exekias as potter and attributed to him as painter
Ânfora (jarra de vinho) Com Figura Negra, Assinada por Exekias como Ceramista e Atribuída a Ele como Pintor
Trustees of the British Museum (Copyright)

Troia na Arqueologia

Habitada desde os primórdios da Idade do Bronze (3000 a.C.) até o século XII d.C., o sítio arqueológico que passou a ser chamado de Troia está a cinco quilômetros da costa mas, antigamente, estava próximo ao mar, numa baía criada pela foz do Rio Escamandro. Desta forma, ocupava uma posição estratégica entre as civilizações egeias e orientais ao controlar o principal ponto de acesso ao Mar Negro, à Anatólia e aos Bálcãs, tanto por mar quanto por terra. Em particular, a dificuldade de encontrar ventos favoráveis para navegar pelo Estreito de Dardanelos pode ter resultado em embarcações detidas nas proximidades de Troia. Em consequência, ela se tornou a mais importante cidade da Idade do Bronze ao norte do Mar Egeu, alcançando o auge de sua prosperidade em meados desta Era, sendo contemporânea da Civilização Micênica, na Grécia, e do Império Hitita, a Leste.

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As primeiras escavações na região foram realizadas por Frank Calvert em 1863 e, após visitar o sítio, Heinrich Schliemann prosseguiu a partir de 1870 até sua morte, em 1890, concentrando-se num monte artificial de 20 metros de altura, intocado desde a Antiguidade. Os achados iniciais de Schliemann, incluindo joias e vasos de ouro e prata, pareciam justificar sua crença de que o sítio abrigava a Troia de Homero. Porém, a datação referente a estes objetos os colocam mais de mil anos antes da provável ocasião da Guerra de Troia, indicando que a história do sítio seria muito mais complexa do que se considerava anteriormente. De fato, talvez de forma inconsciente, Schliemann acrescentou 2.000 anos à história ocidental, que anteriormente remontava apenas aos primeiros Jogos Olímpicos da Antiguidade, em 776 a.C.

The World of the Iliad, c. 1200 BCE
O Mundo da Ilíada, c. 1200 a.C.
Simeon Netchev (CC BY-NC-ND)

As escavações prosseguiram ao longo do século XX até os dias atuais, revelando nove cidades diferentes e nada menos que 46 níveis de habitação. As cidades foram classificadas como Troia I até Troia IX, depois da classificação original de Schliemann (e de seu sucessor, Wilhelm Dörpfeld). A datação por radiocarbono realizada no início deste século provocou alguns ajustes nesta classificação.

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Troia I (c. 3000-2550 a.C.) era um pequeno povoado cercado por muros de pedra. A cerâmica e o metal encontrados correspondem aos encontrados nas ilhas de Lesbos e Lemnos, no Egeu, e ao norte da Anatólia.

Troia II (c. 2550-2300 a.C.) exibe edifícios maiores (40 metros de comprimento) e fortificações de tijolos de barro e pedra com portões monumentais. Os achados do 'tesouro' de Schliemann - objetos em ouro, prata, electro, bronze, cornalina e lápis-lazúli - provavelmente vêm desse período. Este 'tesouro' inclui 60 brincos, seis pulseiras, dois magníficos diademas e 8.750 anéis, todos em ouro maciço. Novamente, os materiais estrangeiros encontrados sugerem o comércio com a Ásia.

The Trojan Plain c. 1200 BCE
A Planície Troiana, c. 1200 a.C.
Simeon Netchev (CC BY-NC-ND)

Troia III - Troia V (c. 2300 - 1750 a.C.) é o período mais difícil de reconstruir, pois as camadas foram removidas às pressas nas primeiras escavações para alcançar os níveis mais baixos. Em termos gerais, esta época parece ser menos próspera, mas os contatos externos continuam sendo evidenciados, tanto pela influência da Anatólia nos fornos em cúpula quanto pela cerâmica minoica.

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O sítio arqueológico de Troia contém impressionantes muralhas fortificadas, com 5 metros de espessura e 8 metros de altura, construídas com grandes blocos de pedra calcária.

Troia VI (c. 1750-1300 a.C.), o período mais visível atualmente do sítio, abriga a mais provável candidata à cidade sitiada na Guerra de Troia homérica. Impressionantes muralhas fortificadas, com 5 metros de espessura e 8 metros de altura, construídas com grandes blocos de pedra calcária e incluindo várias torres (com um plano retangular, como nas fortificações hititas) demonstram a prosperidade, mas também a preocupação com a defesa durante este período. As muralhas teriam sido recobertas por uma superestrutura de tijolos de barro e madeira, com cantaria bem ajustada, inclinada para dentro; tais paredes certamente se encaixam na descrição homérica de "fortemente construídas". Além disso, as seções das muralhas são ligeiramente deslocadas a cada 10 metros, mais ou menos, com o objetivo de fazer uma curva em torno do sítio sem a necessidade de cantos (sempre um ponto fraco para a defesa). Esta característica é exclusiva de Troia, demonstrando independência das influências micênica e hitita. As muralhas incluem cinco portões de entrada na cidade, que possui grandes estruturas, anteriormente em dois andares, com pátios centrais e aposentos em colunatas similares às encontrados em centros micênicos como Tirinto, Pilos e a própria Micenas. Do lado de fora da cidadela fortificada, a povoação abaixo cobre impressionantes 270.000 metros quadrados, protegida por um fosso circundante cortado na rocha. Atualmente, o tamanho do sítio aumentou muito em relação às escavações de Schliemann, sugerindo uma população de até 10.000 pessoas, o que se assemelha bem mais à grande cidade-estado descrita por Homero.

Os achados no sítio apontam para a existência de uma pujante indústria de lã e o primeiro uso de cavalos, que fazem lembrar o epíteto frequentemente usado por Homero de "troianos domadores de cavalos". Também se descobriram objetos de cerâmica muito semelhante aos do continente grego, principalmente o estilo cinza miniano, que imita vasos de metal. Há também cerâmica importada de Creta, Chipre e do Levante. Num contraste marcante com os palácios micênicos, não existem evidências de esculturas ou paredes decoradas com afrescos.

Map of Troy
Mapa de Troia
Bibi Saint-Pol (Public Domain)

Troia VI foi parcialmente destruída, mas se desconhece a causa exata, além de evidências de fogo. De forma intrigante, pontas de flechas de bronze e de lanças e projéteis de fundas foram encontradas no sítio e até incrustadas nas muralhas de fortificação, sugerindo alguma forma de conflito. A datação destes objetos (c. 1250 a.C.) e a destruição do sítio têm correlação com as datas de Heródoto para a Guerra de Troia. Ao longo dos séculos, os conflitos entre micênicos e hititas são mais do que prováveis e podem ter originado a épica guerra mitológica grega. Há poucas evidências de um conflito em larga escala, mas a possibilidade de pequenos combates aparece em textos hititas, nos quais o termo Ahhiyawa é reconhecido como fazendo referência aos gregos micênicos e Wilusa à região da qual Ílion era a capital. Estes documentos relatam agitações locais e o apoio micênico à rebelião contra o controle hitita na área de Troia, sugerindo um possível motivo para a rivalidade regional entre as duas civilizações. Curiosamente, há também uma espada micênica de bronze, tomada como espólio de guerra e encontrada em Hattusa, a capital hitita.

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Troia VIIa (c. 1300-1180 a.C.) e Troia VIIb (c. 1180-950 a.C.) mostram um aumento no tamanho da povoação que circundava a cidadela e alguma reconstrução das fortificações, mas também um declínio marcante de qualidade arquitetônica e artística em relação a Troia VI. Por exemplo, voltou-se à fabricação manual de cerâmica, após séculos de utilização de tornos de oleiros. Novamente, isso tem correlação com a tradição grega, na qual a cidade, ao final da guerra mítica, foi saqueada e abandonada, pelo menos por algum tempo. Tanto Troia VIIa quanto Troia VIIb foram destruídas pelo fogo.

Troia VIII e Troia IX (c. 950 a.C. a 550 d.C.) são os locais da Ílion grega e da Ilium romana, respectivamente. Há evidências de que o sítio continuou a ser habitado durante a chamada idade das trevas grega, mas o assentamento não retornou a um nível significativo de desenvolvimento até o século VIII a.C. A antiga Troia jamais foi esquecida, no entanto. O rei persa Xerxes, segundo Heródoto, sacrificou mais de mil bois no local antes de invadir a Grécia e Alexandre, o Grande, também a visitou antes da expedição na direção oposta, voltada para a conquista da Ásia.

Um templo dórico para Atena foi construído no início do século III a.C., bem como novas fortificações, sob ordens de Lisímaco (c. 301-280 a.C.). Os romanos também tinham elevada consideração pela antiga Troia, a quem se referiam como "Ilium Sagrada". Na tradição romana, o herói troiano Enéas, filho de Vênus, fugiu da cidade e instalou-se na Itália, conferindo assim aos romanos uma ascendência divina. Júlio César, em 48 a.C., e o imperador Augusto (r. 27 a.C. - 14 d.C.) reconstruíram muito da cidade e Adriano (r. 117-138 d.C.) também adicionou vários edifícios, incluindo um odeão, ginásio e banhos públicos. O imperador Constantino (r. 324-337 d.C.) até planejou construir sua nova capital em Troia, iniciando algumas obras, até que houve a opção definitiva por Constantinopla. Com o tempo, a região sofreu um novo declínio, provavelmente devido ao assoreamento do porto e, uma vez mais, a grande cidade de Troia foi abandonada e esquecida por mais 1.500 anos.

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Bibliografia

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Sobre o tradutor

Ricardo Albuquerque
Jornalista brasileiro que vive no Rio de Janeiro. Seus principais interesses são a República Romana e os povos da Mesoamérica, entre outros temas.

Sobre o autor

Mark Cartwright
Mark é escritor, pesquisador, historiador e editor. Tem grande interesse por arte, arquitetura e pela busca das ideias que todas as civilizações compartilham. Possui mestrado em Filosofia Política e é Diretor Editorial da WHE.

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Estilo APA

Cartwright, M. (2018, maio 11). Troia [Troy]. (R. Albuquerque, Tradutor). World History Encyclopedia. Recuperado de https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-372/troia/

Estilo Chicago

Cartwright, Mark. "Troia." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. Última modificação maio 11, 2018. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-372/troia/.

Estilo MLA

Cartwright, Mark. "Troia." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 11 mai 2018. Web. 15 abr 2025.