A Revolução Neolítica iniciou-se entre 10 mil e 12 mil anos atrás em vários locais amplamente dispersos pelo mundo, quando nossos ancestrais começaram a plantar e cultivar. Comunidades agrícolas surgiram quase simultaneamente na Mesopotâmia, China, Sudeste Asiático, África, Mesoamérica e América do Sul, substituindo o modo de subsistência caçador-coletor que havia sido utilizado por centenas de milhares de anos pelos Homo.
Evolução da Agricultura
A mudança da estratégia da caça-coleta para agricultura ocorreu provavelmente em etapas. Por milhões de anos, nossos ancestrais subsistiram graças à generosidade proporcionada pelo nosso ambiente natural. Nossos primeiros ancestrais de postura ereta podem não ter tido um sistema particularmente organizado de buscar comida, mas, na época do Homo erectus, os hominídeos eram, com certeza, coletores, que planejavam o uso de recursos cuja localização era conhecida e monitorada. No momento em que os humanos anatomicamente modernos apareceram, o Homo sapiens deveria ter um considerável conhecimento sobre o desenvolvimento das plantas e dos animais, retornando às mesmas áreas ano após ano para colher e caçar fontes seguras.
Uma vez que retornavam regularmente ao mesmo local, não deve ter demorado muito para se tornarem agricultores que aumentavam a produtividade de campos nativos por meio de capina, poda e queima. Provavelmente iniciaram o cultivo com uma vara de escavar ou enxada para reduzir a competição e encorajar a germinação. Também podem ter descoberto, em uma fase inicial, que as lavouras desenvolviam-se melhor no ano seguinte se o solo tivesse sido revirado após a colheita. Eventualmente, eles se tornaram produtores que transplantaram um pequeno número de plantas e mantiveram cativos alguns poucos animais. Esses primeiros jardins eram provavelmente muito pequenos e situavam-se próximos a residências, tendo permanecido pequenos até que os humanos decidiram se dedicar mais intensamente à atividade agrícola. A ideia original do plantio pode ter resultado das áreas de descarte de lixo, de onde se observou a germinação e o crescimento das sementes. Áreas agrícolas maiores podem ter aparecido, pela primeira vez, com o surgimento de uma classe específica de agricultores. Durante as fases iniciais do processo de domesticação, é possível que o Homo sapiens não tenha selecionado de forma consciente tipos superiores de plantas, mas não demoraria muito tempo para os nossos ancestrais se tornarem domesticadores que guardavam sementes e material genético de tipos superiores para replantio.
Diversidade de Domesticação de Culturas
Os primeiros cultivos foram tão diversos quanto as pessoas e os lugares onde a agricultura começou. Os climas da Terra onde as plantas foram inicialmente domesticadas variavam muito, e, como resultado, uma grande diversidade de espécies vegetais e animais foi produzida em cada um deles. No Oriente Médio, havia grandes extensões naturais de trigo e cevada, o que levou os primeiros agricultores dessa região a explorá-los como culturas básicas. No Sudeste Asiático, o trigo e a cevada não existiam, mas o arroz de grão largo era bem abundante, e, como consequência, o arroz tornou-se uma das culturas de preferência. O trigo, a cevada e o arroz não estavam presentes na Mesoamérica e na África, mas exploravam-se as monocotiledôneas localmente abundantes nesses locais: o sorgo na África e o milho na Mesoamérica. Não existia nenhuma espécie de grãos grandes na América do Sul, e, como resultado, os primeiros agricultores domesticaram as espécies tuberosas como batata, batata-doce, mandioca e os pseudo-grãos quenopódio e amaranto.
Os alimentos ricos em amido encontravam-se entre os primeiros domesticados em todos os centros de origem de cultivos, mas sendo sempre complementados com cultivos de vegetais de alto valor proteico e fibras. Os vegetais da família das leguminosas foram domesticados em todas as principais regiões, incluindo o feijão-de-corda (África), soja (China), amendoim (América do Sul), lentilha e grão de bico (Oriente Próximo). O amaranto e o quenópodio também foram fontes muito importantes de proteína vegetal nas Américas. A fibra provinha das diferentes espécies de algodão na África e na América do Sul, da linhaça no Oriente Próximo e do cânhamo na China.
Aos poucos, aos grupos de cultivo básico de cada região foram adicionados vegetais folhosos, especiarias, oleaginosas e frutas, que figuraram como último grupo de plantas domesticadas. Embora a uva e o figo sejam muito antigos e seu cultivo possa datar de 10 mil anos atrás, a maioria de nossas outras culturas frutíferas arbóreas encontram-se entre as últimas adições à agricultura. Talvez isso se deva, em parte, ao longo tempo de amadurecimento das frutas arbóreas, visto que, após o plantio, o agricultor deve aguardar de 5 a 10 anos para colheita. Além disso, os cultivos frutíferos são espécies cruzadas; as mudas eram frequentemente inferiores à planta-mãe devido à polinização cruzada, e, por isso, técnicas complexas de podas e enxertias tiveram de ser desenvolvidas para explorar plenamente seu potencial.
Estágios Iniciais de Domesticação de Plantas
Na maioria dos primeiros sítios agrícolas, a transição das sociedades pré-históricas caçadoras-coletoras para as comunidades agrícolas foi gradual, levando milhares de anos. Um registro muito antigo dessa transição lenta foi encontrado nas escavações de Richard MacNeisch no vale de Tehuacán, no México. Ele escavou 12 sítios e descobriu 12 mil anos de história da agricultura naquela área. Inicialmente, as pessoas viviam de vegetais silvestres e pequenos animais, tais como lebres, veados, porcos-do-mato e lagartos. Elas coletavam alimentos de origem vegetal em um ciclo anual regular. Cerca de 9 mil anos atrás, a caça tornou-se mais escassa, e as pessoas começaram a dedicar sua energia na coleta de plantas silvestres, incluindo abóbora, pimenta e abacate. Durante a estação seca, se dispersavam em pequenos grupos de forrageadores e reuniam-se nas estações de abundância. Possivelmente iniciaram o cultivo esporádico de plantas silvestres durante esse período, mas o esforço foi mínimo.
Nos 5 mil anos seguintes, o povo do Vale de Tehuacán aumentou progressivamente o uso de vegetais domesticados, e, por volta de 7 mil anos AP (antes do presente), cerca de 10% de sua dieta era proveniente de vegetais cultivados. Eles se encontravam fora das áreas originais de domesticação, mas, nessa época, cultivavam um número grande de culturas supostamente introduzidas, incluindo milho, amaranto, feijões, abóboras e pimentas. As espigas de milho tinham apenas o tamanho de uma borracha de lápis, mas a planta já existia em sua forma moderna. Os cães apareceram há cerca de 5 mil anos. Com o passar do tempo, os hominídeos continuavam a dedicar cada vez mais esforços à agricultura, e, por volta de 3 mil anos AP (antes do presente), a maior parte de seus alimentos provinha de fontes domesticadas, com milho sendo cultivado junto com abacate, amaranto, abóbora e algodão. Os perus foram domesticados há cerca de 2 mil anos.
Evidências similares da transição de caçadores para agricultores podem ser encontradas em numerosos locais do Oriente Próximo. Um desses sítios é Jericó, no vale do Jordão, onde conservou-se um registro contínuo de 9 mil anos de ocupação, pois ali eram construídos novos casebres de barro em cima de outros já existentes, conforme se deterioravam com o tempo. No período mais antigo, o assentamento era composto por natufianos, que eram principalmente caçadores de gazelas e raposas e que cultivavam alguns tipos de cereais, mas que não tinham animais domésticos. Há aproximadamente 9 mil anos, eles começaram a cultivar cereais para valer, e existe a primeira evidência de que estavam domesticando ovelhas e cabras. Um registro semelhante, de longo prazo, de assentamentos sucessivos fica em Ҫatalhöyük, na Turquia, onde os habitantes, inicialmente forrageadores, também cultivavam alguns cereais, mas, por volta de 10 mil anos AP (antes do presente), tinham domesticado gado e eram agricultores em larga escala.
Nos estágios iniciais do processo de domesticação, uma série de mudanças começou a surgir na composição genética e fisiológica de muitas espécies de culturas. Algumas dessas mudanças deveram-se a uma seleção consciente, como a melhoria no sabor e na cor, mas muitas foram um subproduto inconsciente do plantio e da colheita. A colheita resultou na seleção de cascas não trituradas de sementes, de um crescimento mais determinado, um amadurecimento mais uniforme e um aumento da produção de sementes. Todas essas características teriam aumentado a probabilidade de que a semente de um tipo de planta fosse coletada e, posteriormente, plantada. A competição entre mudas, causada pelo plantio próximo, provavelmente aumentou o vigor da muda e a taxa de germinação, pois indivíduos com essas características teriam mais probabilidade de ganhar a corrida para a idade reprodutiva. Um tamanho maior de semente contribuía para o vigor da muda e uma perda de inibidores de germinação teria permitido uma germinação mais rápida. As cascas finas de sementes também evoluíram por domesticação, visto que uma casca reduzida é mais permeável do que a água e resulta em germinação mais rápida.
Causas da Revolução Neolítica
Uma questão que tem intrigado igualmente antropológos e etnobotânicos é saber a razão da agricultura ter demorado tanto para surgir. Parece provável que os grupos humanos dispunham dos meios para o cultivo bem antes de seu início. Nossos ancestrais certamente conquistaram um considerável conhecimento sobre plantas e animais graças às suas próprias atividades de caça e coleta. Eles tinham observado os padrões sazonais do desenvolvimento das plantas e das migrações animais e notado as sementes germinando e crescendo nas áreas de descarte de lixo. Queimaram extensões de terra para dirigir a caça e devem ter notado a subsequente regeneração das plantas. Também desenvolveram um conhecimento íntimo de como incontáveis espécies vegetais poderiam ser utilizadas para alimentação e medicina e sabiam como desentoxicar-se de fontes alimentares que poderiam ser tóxicas.
Provavelmente a primeira ideia formal sobre a razão dos humanos começarem a plantar seja a Teoria do Oásis, de Gordon Childe. Gordon sugeriu que, após a glaciação, o norte da África e o sudoeste da Ásia tornaram-se mais secos e os humanos começaram a se agrupar em áreas onde havia água. Primeiramente aprenderam a domesticar os animais que estavam nos arredores e, posteriormente, à medida que a população crescia, eles aprenderam a cultivar para evitar a fome. Embora essa teoria seja uma explanação atraente para a agricultura em áreas xéricas (de baixa umidade), sabe-se que as áreas mésicas (de umidade moderada) no sudeste da Ásia e na zona tropical da América do Sul também desenvolveram a agricultura.
Sauer, em seu clássico livro Agricultural Origins and Dispersals (1952), sugeriu que a agricultura surgiu pela primeira vez entre os pescadores no Sudeste Asiático. Eles dispunham de uma fonte alimentar confiável, eram sedentários, e, portanto, tinham tempo e energia para experimentar novos sistemas de produção alimentar. Novamente, essa teoria funciona bem em áreas onde peixes e crustáceos eram prontamente disponíveis, mas não explica a origem da agricultura em locais áridos sem pescado, tal como Mesoamérica e África Central.
Também sugere-se que a agricultura surgiu como um subproduto de cerimônias religiosas. As plantas que produziam drogas utilizadas em rituais eram colhidas e talvez cultivadas. As sementes podem ter sido dispersadas em montes funerários. Os animais podem ter sido domesticados para sacrifício. Ainda que a religião tenha servido como grande incentivo para os homens do Neolítico aplicarem o que conheciam sobre os ciclos de vida de plantas e animais, ainda permanece a questão inicial de saber a razão pela qual os homens demoraram tanto para iniciarem o processo da agricultura. Há evidências da espiritualidade dos homens antes mesmo de começarem a domesticar plantas e animais.
Outras teorias desenvolvidas sobre o início da agricultura giram em torno da mudança climática, que teria restringido a disponibilidade de recursos e estimulado a atividade agrícola, ou do crescimento populacional, que teria alcançado um limite crítico em que não mais havia recursos suficientes para alimentar as massas crescentes. À medida que as populações cresciam, as necessidades alimentares podem ter aumentado até o ponto em que eram necessárias fontes alternativas para fornecer o sustento satisfatório. Talvez nossos ancestrais tenham iniciado o cultivo quando não mais podiam coletar alimentos suficientes da natureza para alimentarem a si mesmos e a suas famílias.
Há fortes evidências de que as populações estavam realmente em expansão durante a Revolução Agrícola na maioria dos primeiros locais de origem dos cultivos, mas se desconhece se a invenção da agricultura estimulou tal crescimento ou foi desenvolvida por causa desse crescimento. A resposta simples para o motivo de levarmos tanto tempo para começarmos a plantar provavelmente é que a caça e a coleta eram um modo de vida muito confortável, e os humanos necessitavam de uma boa razão para renunciar a isso. Juliet Clutton-Brock declara que "Com a abundância de alimentos e excelentes matérias-primas de madeira, ossos, pederneiras e chifres, é dificil ver o que faltava ao povo mesolítico da Europa"(14).
Os homens da Idade da Pedra eram criaturas complexas e inteligentes, que podiam adaptar-se prontamente às situações que se apresentavam. Apreciavam caçar e coletar, sendo impulsionados para a agricultura por uma variedade de forças regionais específicas, que incluíam crescimento populacional, mudança climática, caça excessiva, religião, ou um simples desejo por mais de algo em escassez, seja alimento, especiarias, óleo, cores cerimoniais ou fibra. A produção de alimentos é apenas uma das possíveis razões para o cultivo de plantas.