Explorando o Marrocos Romano

Artigo

Carole Raddato
por , traduzido por Jônia Carvalho Diniz
publicado em 13 Dezembro 2022
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Disponível noutras línguas: Inglês, francês, espanhol

Marrocos, então conhecido como Mauritânia, foi anexado pelo Império Romano em 40 d.C. Os romanos no Marrocos deixaram um vasto legado com sítios arqueológicos que pontilham a paisagem do norte do país, especialmente Volubilis, com seus vestígios de casas romanas, templos, mosaicos e largas ruas pavimentadas. No entanto, existem três locais menores em Lixus, Sala Colonia e Banasa.

Foundations of a Triumphal Arch at Sala Colonia
Fundações de um arco triunfal em Sala Colonia
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

Uma breve história do Marrocos antigo

Marrocos é uma faixa relativamente pequena de terra costeira localizada na ponta noroeste da África. Seus primeiros habitantes foram os indígenas Imazighen (sing. Amazigh), conhecidos como berberes (do grego antigo barbaros, que significa "estrangeiro") ou mouros. Ao longo dos séculos, as civilizações subsequentes penetraram no Mediterrâneo ocidental e desenvolveram relações comerciais com as tribos berberes. Os fenícios, que partiram de Tiro (no atual Líbano) e fundaram uma colônia em Cartago (atual Tunísia), foram os primeiros exploradores e os primeiros a se estabelecer na costa marroquina já no século VIII a.C. A colonização fenícia estabeleceu pequenos postos comerciais para o comércio de ouro e marfim em Tingis (Tânger), Mogador (Essaouira), Tamuda (Tetouan) e Lixus (Larache). Sucessores da civilização fenícia no domínio do Norte de África, os cartagineses expandiram posteriormente as lucrativas rotas comerciais, numa grande variedade de mercadorias, desde o azeite ao peixe salgado. Além dos enclaves púnicos, a influência dos líderes berberes cresceu e surgiram reinos berberes.

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EM 40 EC, A MAURITÂNIA FOI ANEXADA AO IMPÉRIO ROMANO APÓS A EXECUÇÃO DO ÚLTIMO REI PTOLEMEU, FILHO E SUCESSOR DE JUBA.

Em 146 a.C, tendo destruído Cartago, a República Romana estendeu seu controle para o oeste ao longo da costa sul do Mediterrâneo. A área ao redor do norte do Marrocos ficou conhecida como Mauritânia (Terra dos Mouros). Prosperou especialmente sob o governo de um dos mais ilustres reis berberes, o jovem príncipe númida Juba II, educado em Roma (c. 48 a.C a 23 d.C), que foi nomeado pelo imperador romano Augusto (27 a.C a 14 d.C ). Em 40 d.C, a Mauritânia foi anexada ao Império Romano depois que o último rei Ptolomeu (20 a 40 d.C), filho e sucessor de Juba, foi executado por seu primo em primeiro grau, o imperador romano Calígula (37 a 41 d.C). O imperador Cláudio (41 a 54 d.C) mais tarde dividiu a província romana da Mauritânia em Mauritânia Cesariense a leste e Mauritânia Tingitana a oeste, com sua capital em Tingis (atual Tânger) e seu centro comercial em Volubilis. No século II d.C, a maior parte da província foi romanizada e urbanizada. Graças à Pax Romana, seguiu-se um período de grande prosperidade até meados do século IV d.C, baseado principalmente na agricultura e na exportação de azeite e molho de peixe (garum).

Roman Rule in North Africa (146 BCE to 395 CE)
Domínio romano no norte da África (146 aC - 395 dC)
Simeon Netchev (CC BY-NC-SA)

O cristianismo chegou no início do século II d.C e rapidamente conquistou convertidos nas cidades e entre os berberes; em poucos séculos, o norte da África foi cristianizado. O domínio romano e o controle político sobre a Mauritânia terminaram abruptamente em 429 d.C, quando a província caiu nas mãos dos vândalos. O Império Romano do Oriente recuperou algumas partes da Mauritânia dos vândalos e restabeleceu o domínio romano antes que a área caísse nas mãos dos governantes da Espanha, os visigodos, no início do século VII d.C. Desde o início do século VIII d.C, um novo grupo de invasores e uma nova religião começaram a deixar sua marca no Marrocos quando o exército árabe invadiu a área e começou a converter os berberes ao islamismo. O primeiro grande governante islâmico do Marrocos foi Idris I (789 a 791), um exilado político xiita de Meca que estabeleceu seu quartel-general nos arredores da antiga cidade romana de Volubilis no século VIII d.C.

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Volubilis

Volubilis é o sítio arqueológico mais bem preservado do Marrocos. Suas ruínas ficam no meio de uma planície fértil nos arredores da moderna Meknès, no norte do Marrocos, perto das grandes montanhas do Atlas. Fundada durante a colonização cartaginesa, a capital do reino berbere da Mauritânia desenvolveu-se a partir do século III a.C para se tornar um importante posto avançado do Império Romano. Foi abandonado 1.400 anos depois, no século 11 d.C.

Volubilis
Volubilis
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

Sob o domínio romano, a cidade prosperou exportando produtos agrícolas como grãos e azeite de oliva e fornecendo animais selvagens para lutas de gladiadores. Seu layout é um exemplo notavelmente coerente do planejamento urbano romano, formando um plano transversal quase perfeito de ruas e distribuição de edifícios públicos. Tinha dois banhos romanos, arcos triunfais, um fórum e uma basílica, tudo organizado em torno da Decumanus Maximus, a principal rua leste-oeste da cidade. No entanto, faltava um teatro ou anfiteatro romano. Casas sofisticadas pavimentadas com mosaicos e com lojas, padarias e complexos de prensagem de óleo na frente formavam a paisagem urbana. No seu auge, provavelmente tinha 20.000 habitantes.

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Volubilis foi declarado Patrimônio Mundial da UNESCO em 1997. Extensas ruínas de belos edifícios e muitos belos mosaicos sobrevivem in situ no sítio arqueológico. Os monumentos mais impressionantes estão na parte norte do local.

O Capitólio

O Capitólio, dedicado às três principais divindades da religião romana, Júpiter, Juno e Minerva, remonta a 218 EC. O templo coríntio foi erguido em um pódio alto, tinha 13 degraus e uma única sala. Era peripteral (uma única fileira de pilares em todos os lados) e hexastilo (seis colunas), mas foi desajeitadamente restaurado como um edifício prostilo de quatro colunas. Um grande pátio com pórtico com um altar no centro cercava o Capitólio.

Capitolium of Volubilis
Capitólio de Volubilis
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

A Basílica

A Basílica do início do século III d.C era um edifício judicial e administrativo e o local de reunião do conselho ou senado da cidade. Este imponente edifício tem 42,2 m de comprimento e 22,3 m de largura e originalmente tinha dois andares. Fica no lado leste do Fórum, onde uma série de pedestais de pedra esculpidos com inscrições latinas teriam sustentado estátuas de membros da elite local.

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The Civil Basilica of Volubilis
A Basílica Civil de Volubilis
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

O Arco de Caracala

O arco triunfal de mármore é o monumento mais famoso de Volubilis. Foi erguido em 217 d.C por Marco Aurélio Sebastenus, governador da província, em homenagem ao imperador Caracala (211 a 217), que concedeu cidadania romana a seus habitantes e os isentou do pagamento de impostos. O arco, originalmente coberto por uma carruagem puxada por cavalos, tinha mais de 8 m de altura na borda sudoeste do Decumanus Maximus.

Arch of Caracalla in Volubilis
Arco de Caracala em Volubilis
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

A casa de Orfeu

A Casa de Orfeu é uma vila luxuosa com o nome do fantástico mosaico romano que representa Orfeu tocando lira para um público de animais e pássaros. O mosaico de Orfeu embelezava o triclinium (sala de jantar) da casa do peristilo, onde os convidados teriam se reclinado em sofás encostados nas paredes e admirado o mosaico central. A casa pertenceu certamente à aristocracia da cidade, que mostrava a sua riqueza pelas suas dimensões, elementos decorativos (mosaicos, estátuas de mármore e bronze, colunas), e diversas facilidades econômicas (lojas, padarias, lagares).

House of Orpheus, Volubilis
Casa de Orfeu, Volubilis
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

A Casa dos Trabalhos de Hércules

A Casa dos Trabalhos de Hércules recebeu o nome do mosaico que representa os doze trabalhos que o semideus teve que realizar como penitência por matar sua esposa e filhos. A casa era palaciana, com 41 quartos cobrindo uma área de 2.000 m².

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Mosaic of the Labours of Hercules in Volubilis
Mosaico dos Trabalhos de Hércules em Volubilis
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

A Casa de Vênus

A Casa de Vênus era uma das residências mais luxuosas de Volubilis. Tinha um conjunto de banheiros privativos e um interior ricamente decorado com belos mosaicos mostrando cenas da mitologia romana e animais. O mosaico da Viagem de Vênus que deu nome à casa foi transportado para o Museu Arqueológico de Tânger, mas na sala ao lado está um mosaico que mostra Diana sendo surpreendida pelo caçador Actaeon durante o banho.

Mosaic of Diana and Actaeon
Mosaico de Diana e Actaeon
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

A Decamanus Maximus

A Decumanus Maximus era a principal rua leste-oeste da cidade. Era pavimentada com calçadas de ambos os lados e repleta de pórticos com arcadas e lojas.

Decumanus Maximus at Volubilis
Decumanus Maximus em Volubilis
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

Lixus

Lixus é o segundo sítio romano mais importante em Marrocos depois de Volubilis. Ele está localizado ao longo da costa atlântica perto da foz do rio Loukkos. Segundo a lenda, Lixus era o local do Jardim das Hespérides, de onde Hércules coletou as maçãs douradas da imortalidade como seu décimo primeiro trabalho.

Villa Complex at Lixus
Complexo Vila em Lixus
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

O escritor romano Plínio, o Velho (23 a 79 d.C) descreveu Lixus como a mais antiga colônia fenícia no extremo oeste. No entanto, a maioria dos vestígios visíveis datam da época romana. A cidade atingiu seu apogeu durante o reinado do imperador Cláudio (41 a 54 d.C), quando se tornou uma colônia romana e começou a exportar o molho de garum à base de peixe. A fábrica de pesca de sal consistia em complexos espaçados com uma capacidade de salga de mais de um milhão de litros, tornando-se o maior produtor de garum no Mediterrâneo ocidental. No século III d.C, Lixus tornou-se quase totalmente cristão. O local foi abandonado no século VII d.C e mais tarde tornou-se conhecido pelos muçulmanos como Tuchummus quando uma mesquita foi erguida.

Garum Factory in Lixus
Fábrica de Garum em Lixus
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

As zonas escavadas (62 hectares / 153 acres) constituem apenas um quarto da área total da cidade antiga. Imediatamente após entrar no local, encontra-se a cidade baixa com os vestígios das instalações de fabricação de garum. Uma trilha sobe a colina até a acrópole, passando por um pequeno anfiteatro com uma caverna semicircular projetada para abrigar peças teatrais e combates de gladiadores. Os banhos foram originalmente construídos na lateral da arena, com alguns vestígios de piso de mosaico. O monte da acrópole formou o núcleo de assentamento original em Lixus. Um santuário para Hércules/Melqart e uma vila palaciana provavelmente pertencente a um cortesão de Juba II ficavam no topo. São também ruínas da igreja paleocristã, cisternas subterrâneas e vestígios de estruturas pré-romanas.

Roman Amphitheatre at Lixus
Anfiteatro Romano em Lixus
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

Banasa

Banasa, mais estritamente Julius Valentia Banasa, era uma antiga cidade situada na estrada de Tingis (Tânger) para Sala (Rabat). Suas ruínas estão localizadas na margem sul do rio Sebou, que Plínio descreveu como "Sububus magnificus et nauigabilis" (um bom rio disponível para navegação). Banasa foi uma das três colônias romanas na Mauritânia estabelecidas por Augusto entre 33 e 27 a.C para os veteranos da Batalha de Actium.

Forum of Banasa
Fórum de Banasa
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

Banasa era um centro de produção de cerâmica do século III a.C e era uma cidade comercial próspera e movimentada até o final do século III d.C. As escavações arqueológicas realizadas entre 1933 e 1956 expuseram os vestígios da época romana. Os edifícios descobertos incluem um fórum pavimentado trapezoidal ladeado a norte por uma basílica retangular, um capitólio (templo principal da colônia) com sete celas, um complexo de banhos urbanos, um macellum (mercado) e ruas em um padrão regular. Muitos dos edifícios datam do início do século III d.C. Os belos mosaicos que decoravam os edifícios estão agora expostos no Museu Arqueológico de Rabat.

Sala Colonia

Uma das mais belas ruínas históricas de Marrocos pode ser vista nos arredores de Rabat em Chellah, uma necrópole muçulmana fortificada medieval. O local contém as ruínas de uma antiga cidade portuária conhecida como Sala pelo renomado geógrafo grego Ptolomeu (c. 100 a c. 170 d.C). Os fenícios foram os primeiros a se estabelecer neste local na margem sul do rio Bou Regreg, e os romanos assumiram o controle c. 40 d.C, renomeando o assentamento Sala Colonia.

Capitolium of Sala Colonia
Capitólio de Sala Colonia
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

As primeiras escavações realizadas no local em 1929-1930 desenterraram os restos de vários edifícios da época de Trajano (98 a 117 d.C) e Adriano (117 a 138 d.C), incluindo um fórum, uma fonte monumental, uma capitólio, um arco triunfal, bem como o Decumanus Maximus (a principal rua orientada leste-oeste). Os restos romanos foram posteriormente incorporados a uma necrópole medieval chamada Chellah.

A antiga Sala foi abandonada em 1154 em favor da vizinha Salé. Ficou deserta até o século 14, quando os merinidas construíram uma necrópole sagrada, uma mesquita e um minarete no topo do local romano, cercado por uma parede que ainda hoje marca seus limites. Se você visitar Chellah no inverno ou na primavera, obterá vida selvagem adicional, pois uma grande colônia de cegonhas habita as ruínas. Como parte da Rabat metropolitana, o local recebeu o status de Patrimônio Mundial em 2012.

Forum of Sala Colonia
Fórum de Sala Colonia
Carole Raddato (CC BY-NC-SA)

Não deixe de visitar o Museu Arqueológico de Rabat (Musée de l'Histoire et des Civilisations), que abriga uma grande coleção de esculturas de bronze datadas dos séculos I e II dC e outros objetos encontrados em sítios arqueológicos no Marrocos.

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Sobre o tradutor

Jônia Carvalho Diniz
Jônia Diniz é tradutora certificada com formação em inglês, francês e espanhol. Mora no Brasil. Entusiasta da História.

Sobre o autor

Carole Raddato
Carole mantém o popular foto-blog de história antiga Following Hadrian, no qual ela viaja pelo mundo seguindo os passos do imperador Hadrian.

Citar este trabalho

Estilo APA

Raddato, C. (2022, Dezembro 13). Explorando o Marrocos Romano [Exploring Roman Morocco]. (J. C. Diniz, Tradutor). World History Encyclopedia. Obtido de https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-2129/explorando-o-marrocos-romano/

Estilo Chicago

Raddato, Carole. "Explorando o Marrocos Romano." Traduzido por Jônia Carvalho Diniz. World History Encyclopedia. Última modificação Dezembro 13, 2022. https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-2129/explorando-o-marrocos-romano/.

Estilo MLA

Raddato, Carole. "Explorando o Marrocos Romano." Traduzido por Jônia Carvalho Diniz. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 13 Dez 2022. Web. 03 Mai 2024.