A Mineração de Carvão na Revolução Industrial Britânica

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Artigo

Mark Cartwright
por , traduzido por Ricardo Albuquerque
publicado em 17 março 2023
Disponível noutras línguas: Inglês, Chinês, francês, espanhol
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A mineração de carvão cresceu muito durante a Revolução Industrial Britânica, pois fornecia combustível para máquinas a vapor de todos os tipos em fábricas, no transporte e na agricultura. A drenagem de minas inundadas, que tinha o objetivo de permitir a extração de maiores quantidades de carvão, levou à invenção das máquinas a vapor. Como a iluminação doméstica e pública usava gás de carvão e precisava-se do coque para fabricação de ferro e aço, a demanda continuou crescendo.

Coal Pits & Factories
Minas de Carvão e Fábricas
Internet Archive Book Images (Public Domain)

Um Recurso Natural Abundante

A mineração de carvão tornou-se uma indústria importante na Grã-Bretanha a partir do século XVI, quando se esgotaram reservas florestais de madeira para combustível. Havia quatro principais regiões carboníferas: Gales do Sul, Escócia meridional, Lancashire e Northumberland. Todas produziam carvão de alta qualidade e estavam convenientemente posicionadas perto de hidrovias (canais ou rios) que podiam transportar o produto para outras regiões. A abundância de carvão e sua exploração precoce (meio século ou mais à frente de outras nações europeias) significavam que a Grã-Bretanha já tinha os recursos e o conhecimento técnico para aproveitar plenamente a chegada de máquinas industriais e outras invenções que precisavam deste mineral ou de seus subprodutos como combustível. As invenções dependentes do carvão durante a Revolução Industrial impulsionaram o crescimento maciço e sustentado da indústria carbonífera.

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A ideia de ferrovias surgiu a partir das linhas curtas de trilhos que retiravam os vagões de carvão das minas.

A Máquina a Vapor

A maior invenção da Revolução Industrial foi a máquina a vapor, que transferiu todos os tipos de tarefas e transporte que dependiam da energia humana, animal, eólica ou hídrica para o poder bem maior, mais barato e confiável dos motores mecânicos. Sua invenção deu-se, inicialmente, para o bombeamento dos túneis inundados das minas, a fim de que a extração pudesse acontecer em profundidades maiores. Em 1700, a Grã-Bretanha já produzia 80% do carvão na Europa. Em 1712, Thomas Newcomen (1664-1729) desenvolveu a primeira bomba movida a vapor para a drenagem das minas de carvão em Dudley, nas região de Midlands. Tais motores necessitavam de carvão como combustível e, portanto, quando eles se tornaram mais eficientes e adaptados para outros usos - graças a inventores como James Watt (1736-1819) e Matthew Boulton (1728-1809) -, a demanda aumentou. As máquinas a vapor passaram a ser empregadas em teares de algodão, martelos a vapor, debulhadoras e qualquer outro tipo de maquinário pesado que economizasse os custos do trabalho humano e animal.

O Carvão e o Transporte

O crescimento acelerado da produção de carvão causou uma expansão maciça no sistema de canais, que passou a conectar todos os principais rios e seus afluentes a partir de 1750, pois se tratava da maneira mais barata de transportar mercadorias pesadas (cerca de metade do custo em relação ao transporte terrestre). Em 1830, "a Inglaterra e o País de Gales tinham 6.237 km de canais interiores, bem acima dos 2.251 km existentes em 1760" (Horn, 17).

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Iron Duke Locomotive
Locomotiva Iron Duke
Hugh Llewelyn (CC BY-SA)

A partir de 1825, as ferrovias e seus trens movidos a vapor também necessitavam de carvão. A ideia de ferrovias surgiu a partir das linhas curtas de trilhos que conduziam os vagões de carvão para fora das minas, de onde podiam ser transportados para outros locais por barcaças ou navios. George Stephenson (1781-1848), dono de uma empresa em Newcastle especializada neste tipo de trens, projetou o motor ferroviário Locomotion 1. Esta locomotiva, poderosa o suficiente para puxar vagões de passageiros, permitiu o primeiro transporte deste tipo na linha férrea de Stockton a Darlington, no nordeste da Inglaterra, em 1825. A partir daí, a rede ferroviária cresceu para conectar praticamente todas as cidades grandes e pequenas mais importantes da Grã-Bretanha.

A partir de meados do século XIX, grandes navios a vapor, como o SS Great Britain (1843) e o SS Great Eastern (1858) consumiam centenas de toneladas de carvão a cada viagem enquanto cruzavam o Atlântico e outros oceanos. Mesmo o transporte mais tradicional, como os barcos de canal, receberam motores alimentados a carvão.

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Iluminação a Gás de Carvão

Por volta de 1792-4, o escocês William Murdock (1754-1839) demonstrou pela primeira vez que o gás de carvão podia ser usado na iluminação. Ele foi alertado para esta possibilidade quando encheu um cachimbo com pó de carvão e o gás que escapava incendiou-se quando colocado próximo a um fogo aceso. Esta fonte de iluminação inovadora e mais brilhante substituiu a queima de velas de óleo ou sebo. A partir de 1807, o inventor alemão Frederick Albert Winsor (1763-1830) desenvolveu a ideia de utilizar este gás para a iluminação pública. Winsor demonstrou de forma espetacular o potencial de sua ideia ao instalar postes de luz a gás de Pall Mall a St James' Park, em Londres, sabendo que o rei Jorge III da Grã-Bretanha (r. 1760-1820) passaria por ali em sua carruagem. A demonstração causou sensação e o Pall Mall recebeu 13 postes de iluminação permanentes a gás, tornando-se, assim, a primeira via pública do mundo iluminada com a nova tecnologia.

The First Coal Gas Street Lighting
A Primeira Iluminação Pública a Gás de Carvão
Rowlandson & Woodward (Public Domain)

Após muitas negociações com o Parlamento, Winsor conseguiu em 1812 um contrato para iluminar mais ruas londrinas com sua invenção. Na década seguinte, a capital recebeu 40 mil postes de luz a gás. A iluminação das ruas escuras transformou os hábitos da população, que passou a considerar muito mais seguro sair à noite, atraindo mais clientes para restaurantes e estabelecimentos de entretenimento. Tratava-se de uma ideia vencedora, que logo se disseminou para outras cidades britânicas e outros países. Em 1816, Baltimore tornou-se a primeira cidade dos Estados Unidos a usar iluminação pública a gás de carvão; Paris seguiu o exemplo em 1820.

Em 1900, a produção de carvão da Grã-Bretanha alcançou 224 milhões de toneladas de carvão por ano.

O gás de carvão passou a ser empregado pelos cozinheiros em todos os lares. Na década de 1850, cada cidade de maior porte dispunha de gasômetros. A utilização de carvão e do gás para aquecimento reduziu a necessidade de madeira, dando margem para que a terra antes ocupada por florestas fosse destinada à agricultura.

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Outros Usos do Carvão

O coque, produzido a partir da queima de carvão nos fornos para remoção do maior número possível de impurezas, tornou-se um combustível essencial para a siderurgia. O primeiro alto-forno operacional que usava coque começou a funcionar em 1709 em Coalbrookdale, em Shropshire, numa instalação de propriedade de Abraham Darby (1678-1717). Os altos-fornos a coque atingiam temperaturas muito mais altas do que o combustível tradicional de carvão e não introduziam impurezas no forno, dois elementos essenciais para produzir aço de qualidade superior. Por sua vez, o carvão continuava a ser empregado como fonte de calor em tudo, desde fábricas de tijolos até cervejarias. A alta concentração de fábricas nas West Midlands e o uso intenso de carvão fizeram com que a região se tornasse conhecida como o Black Country [País Negro]. Os subprodutos da fabricação do coque, além do gás, incluíam alcatrão e vários produtos químicos. No último quarto do século XIX, o carvão passou a ser utilizado, como ainda ocorre atualmente, para a geração de eletricidade.

The First Industrial Revolution, c. 1760 - 1840
A Primeira Revolução Industrial, c. 1760 - 1840
Simeon Netchev (CC BY-NC-ND)

A Grã-Bretanha produzia anualmente apenas 2,5 a 3 milhões de toneladas de carvão em 1700, mas em 1900 esse número disparou para 224 milhões de toneladas. No século XIX, a Grã-Bretanha extraía dois terços do carvão do mundo. Um inspetor de manufatura francês chamado Ticquet observou em 1738, durante uma viagem pela Grã-Bretanha, que "o carvão é uma das grandes fontes de riqueza e abundância na Inglaterra e eu o considero a alma das manufaturas inglesas" (Horn, 40). O censo de 1851 registrou 220.000 mineiros atuando no setor em toda a Grã-Bretanha.

O carvão havia se tornado a força vital da Era Industrial e seu valor podia ser demonstrado em estatísticas e gráficos, mas também de maneira mais romântica como, por exemplo, na decisão dos organizadores da Grande Exposição de 1851, no Palácio de Cristal de Londres, de incluir em suas exposições das maravilhas da era moderna um bloco de carvão de 24 toneladas. Bem menos maravilhosa, no entanto, era a grande poluição do ar que a queima de carvão criava nas cidades e regiões com elevadas concentrações industriais.

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As Condições de Trabalho nas Minas

Uma mina jamais pôde ser considerada o mais agradável dos ambientes, mas, nos séculos XVIII e XIX, as condições eram particularmente precárias. Num trabalho físico árduo, a maior parte das paredes era trabalhada com o uso de picaretas. O veio de carvão a ser extraído podia ser muito estreito e, assim, o mineiro precisava atuar num espaço às vezes limitado a 75 cm. As instalações empregavam mulheres e crianças. As mulheres carregavam pesadas cestas de carvão para os vagões de transporte, o que geralmente implicava caminhar sobre a água.

Empregavam-se crianças, desde os cinco anos de idade, para subir em poços de ventilação estreitos, garantindo que os alçapões fossem abertos e fechados regularmente. A maioria, no entanto, ocupava-se deslocando o carvão do nível de extração para a superfície ou na separação do material de outros detritos antes da entrega do produto. Aquelas que puxavam os vagões usando arreios ficaram conhecidas como hurriers [apressados], um trabalho pesado que prejudicava o desenvolvimento físico infantil. Muitos pais não se opunham a que seus filhos trabalhassem, apesar dos riscos para a saúde, uma vez que traziam recursos muito necessários para a família. Além disso, mais da metade delas mantinha seu emprego quando atingia a idade adulta. De 1800 a 1850, as crianças compunham entre 20-50% da força de trabalho da mineração. Uma das consequências da entrada no mercado de trabalho numa idade tão precoce era a ausência de escolaridade, pois a maioria não frequentava a escola por mais do que três anos.

Child Pulling Coal in a Mine
Criança Puxando Carvão numa Mina
Unknown Artist (Public Domain)

Homens, mulheres e crianças geralmente sofriam com problemas de saúde devido ao trabalho físico árduo e longos turnos de 12 horas. A aspiração do pó de carvão, ano após ano, levava ao desenvolvimento de doenças pulmonares. Como o historiador S. Yorke observa enfaticamente: "A indústria de mineração de carvão deve representar uma das piores explorações de homens, mulheres e crianças que já ocorreram na Grã-Bretanha" (98).

A Lâmpada de Segurança

Com mais mineiros trabalhando em profundidades maiores, o número de acidentes inevitavelmente aumentou. Em 1838, houve 97 mortes por desabamentos; em 1864, ocorreram 395. O rompimento de cabos e a queda de grandes pesos era outra ocorrência comum, reduzida somente a introdução de cabos de aço nas minas a partir do início de 1800.

A explosão de gases representava outra séria ameaça à vida e à integridade física. Chamado pelos mineiros de fire-damp ou mine-damp, a mistura letal de gás metano e pó de carvão acumulava-se durante o processo de mineração. A chama das lâmpadas que iluminavam os poços inflamava os gases, causando explosões.

Em 1815, Humphrey Davy (1778-1820) e George Stephenson (1781-1848) inventaram independentemente a lâmpada de segurança, que encerrava a chama em uma malha fina (permitindo que o ar entrasse, mas não que a chama se espalhasse). Além disso, se a chama da lâmpada mudasse de laranja para azul, isso indicava que os níveis de gás estavam perigosamente altos no poço e era hora de sair. Em terceiro lugar, a lâmpada podia detectar quantidades perigosas de dióxido de carbono (choke-damp) no ar à medida que a chama se extinguia, servindo de aviso para que os mineiros deixassem a área antes que o gás se acumulasse até uma concentração letal. A lâmpada de Davy, a mais eficiente das duas, começou a ser utilizada na mina de carvão do Condado de Durham em 1816. Este aparelho salvou incontáveis vidas, mas também é verdade que os mineiros passaram a depender tanto das lâmpadas que corriam maiores riscos, ao explorar passagens potencialmente perigosas em áreas que, de outra forma, seriam abandonadas. O brilho da lâmpada de segurança era menor do que a luz de velas e, assim, muitos mineiros recusavam-se a usar a nova invenção, mesmo após as velas serem proibidas.

Davy Lamp
Lâmpada de Segurança de Davy
Science Museum, London (CC BY-NC-SA)

Reforma: a Lei de Minas de 1842

Em 1842, a aprovação da Lei de Minas contou com os esforços de lorde Ashley, Conde de Shaftsbury (1801-1885) e o incentivo da indignação pública com a crescente frequência dos acidentes e com a divulgação do fato de que os homens e mulheres trabalhavam juntos e com roupas de baixo, no subsolo, devido ao calor sufocante. Ashley chefiou a Comissão Real que investigou as condições de trabalho em várias minas e compilou testemunhos dos mineiros. Houve oposição à nova legislação, principalmente por parte de proprietários de minas, contrários à interferência governamental na indústria por uma questão de princípio. Esta oposição resultou que uma das maiores recomendações, a redução da jornada de trabalho de 12 para 10 horas, nunca se tornasse realidade. Ainda assim, a lei proibiu o emprego de mulheres, meninas e garotos abaixo de 10 anos para o trabalho no subsolo. Os regulamentos de segurança passaram a ser aplicados com mais rigor e somente aqueles com mais de 15 anos podiam operar qualquer tipo de maquinário. Inspetores de minas, empregados pelo governo, ficaram encarregados de fiscalizar a aplicação das novas regras. A curto prazo, a legislação fez com que muitas mulheres perdessem seus empregos e famílias que só tinham filhas sofreram com dificuldades financeiras.

Para o bem ou para o mal, a indústria carbonífera tornou-se um esteio da economia britânica no século XX. O destacado historiador Alan Macfarlane resumiu a importância do carvão para a Revolução Industrial e a vida como a conhecemos atualmente:

Nossa civilização no mundo moderno é construída inicialmente sobre o carvão e, posteriormente, é claro, sobre outras energias à base de carbono. Sem isso, não teria havido Revolução Industrial, pois ela não teria acontecido na Inglaterra e nós ainda viveríamos numa sociedade agrária. (Dugan, 67)

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Perguntas e respostas

O que a mineração de carvão fez para a Revolução Industrial?

A mineração de carvão foi essencial para a Revolução Industrial, já que criou a necessidade da bomba movida a vapor e forneceu o combustível para máquinas, aquecimento e iluminação.

Para que o carvão foi usado na Revolução Industrial na Grã-Bretanha?

Na Revolução Industrial, o carvão foi usado como combustível para máquinas, trens e navios. Também era empregado para aquecimento e, em forma de gás, na iluminação. O coque, produzido a partir da queima do carvão, tornou-se essencial para a siderurgia.

Por que a mineração de carvão era importante para a Grã-Bretanha?

A mineração de carvão era importante para a Grã-Bretanha porque proporcionava uma fonte de combustível confiável e barata.

Sobre o tradutor

Ricardo Albuquerque
Jornalista brasileiro que vive no Rio de Janeiro. Seus principais interesses são a República Romana e os povos da Mesoamérica, entre outros temas.

Sobre o autor

Mark Cartwright
Mark é um escritor em tempo integral, pesquisador, historiador e editor. Os seus principais interesses incluem arte, arquitetura e descobrir as ideias que todas as civilizações partilham. Tem Mestrado em Filosofia Política e é o Diretor Editorial da WHE.

Citar este trabalho

Estilo APA

Cartwright, M. (2023, março 17). A Mineração de Carvão na Revolução Industrial Britânica [Coal Mining in the British Industrial Revolution]. (R. Albuquerque, Tradutor). World History Encyclopedia. Recuperado de https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-2201/a-mineracao-de-carvao-na-revolucao-industrial-brit/

Estilo Chicago

Cartwright, Mark. "A Mineração de Carvão na Revolução Industrial Britânica." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. Última modificação março 17, 2023. https://www.worldhistory.org/trans/pt/2-2201/a-mineracao-de-carvao-na-revolucao-industrial-brit/.

Estilo MLA

Cartwright, Mark. "A Mineração de Carvão na Revolução Industrial Britânica." Traduzido por Ricardo Albuquerque. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 17 mar 2023. Web. 21 dez 2024.