A Guerra Social (também chamada Guerra dos Marsos ou Guerra dos Aliados) de 91-87 a.C. foi o resultado de décadas de disputas entre Roma e seus aliados italianos. A máquina de guerra romana dependia fortemente dos aliados italianos (socii), mas a República não lhes concedia a cidadania. A principal causa da Guerra Social foi esta desigualdade de status.
Causas
A tensão teve suas origens logo nos primórdios da expansão romana através da península italiana. Entre 500 e 275 a.C., os exércitos de cidadãos da República Romana colocaram o Lácio e o restante da península sob controle. Os recém-adquiridos aliados dispunham de certa liberdade de ação governamental, mas Roma exigia uma coisa de todos: lealdade. Esta lealdade trazia consigo um óbvio benefício: um suprimento ilimitado de soldados para campanhas militares. À medida que Roma se expandia através do Mediterrâneo, alcançando com seus longos tentáculos a Espanha, Grécia, Norte da África e Ásia, cresciam as demandas para o exército. A tensão aumentou à medida que os romanos exigiam mais e mais dos aliados italianos.
No campo de batalha, os famosos exércitos romanos dependiam fortemente de seus aliados ou alae (asas em Latim) para complementar suas fileiras. Com frequência, os alae forneciam tantos soldados de infantaria quanto as legiões e três vezes a cavalaria. Nas batalhas, as legiões ficavam no centro, enquanto os alae postavam-se nos flancos. Eram comandados por três comissários (praefecti sociorum), em geral cidadãos romanos. Os melhores entre os alae formavam os extraordinarii, destacamento que reunia cavalaria e infantaria e que era usada de acordo com a vontade do cônsul. Porém, os legionários romanos e seus companheiros aliados não eram iguais, pois o romano era um cidadão e o ala não. Com o tempo, esta diferença se intensificaria e terminaria por ser uma das principais causas da Guerra Social. Outra diferença fundamental que separavam os dois grupos era que o ala pagava impostos, ao contrário dos cidadãos romanos. Sem cidadania e portanto sem voz no governo romano, um ala não podia opinar sobre como o dinheiro dos impostos era gasto.
A Questão Italiana
A recusa repetida da concessão da cidadania vinha consumindo os italianos há décadas. Promessas haviam sido feitas e não cumpridas. Segundo os aliados, tratava-se apenas de um jogo do Senado romano. O historiador M. Beard assinalou que à medida que os aliados "obtinham recompensas consideráveis" na forma de espólios em vitórias romanas, a "'Questão Italiana' agravava o descontentamento e provocava surtos de conflitos violentos" (236). Porém, o direito de votar não era negado a todos os italianos. Após ser anexado em 338 a.C., o Lácio recebera Direitos Latinos ou ius Latii, que permitia uma semi-igualdade com os romanos – poderiam se casar com cidadãos romanos, firmar contratos e fazer reivindicações de terras. Também tinham o direito de voto na Assembleia. Os aliados - foederati ou socii - não tinham sido anexados a Roma e, por conseguinte, não dispunham de direitos políticos ou civis, ainda que tivessem de fornecer efetivos para o exército. Por volta de 100 a.C., eles supriam dois terços do exército romano. O grande reformador militar Caio Mário (c. 157-86 a.C.) sempre apoiara a reivindicação italiana por direitos, tendo lutado ao lado deles em várias batalhas. Como cônsul, ele frequentemente recompensava o serviço exemplar com a cidadania. Infelizmente, isso somente provocou ainda mais descontentamento.
Tentativas de Reforma
O esforço em busca da cidadania para os aliados começou pelo menos três décadas antes da deflagração das hostilidades. Em conjunto com Marco Fúlvio Flaco, os irmãos Tibério e Caio Graco defenderam com vigor os direitos dos aliados. Em 125 a.C., Flaco, eleito cônsul, propôs uma lei na Assembleia que concedia cidadania completa aos italianos. Infelizmente, na mesma ocasião, invasores da tribo dos Salúvios faziam pilhagens desenfreadas na Gália. O Senado enviou Flaco ao norte para reprimir os distúrbios. Após seu retorno e o fim do mandato como cônsul, a proposta de lei perdeu a validade. Outro sinal do permanente descontentamento dos aliados com Roma, após o fracasso da iniciativa de Flaco, sobreveio com a revolta de Fregelas. A cidade tinha sido leal aos romanos contra Pirro, durante as Guerras Pírricas (280-275 a.C.) e contra Aníbal, na Segunda Guerra Púnica (218-202 a.C.). O pretor Lúcio Opímio foi enviado para investigar; a cidade acabou brutalmente saqueada e teve os muros destruídos. Acredita-se que o saque tinha o objetivo de enviar uma mensagem às demais cidades da Itália.
Em 122 a.C., o tribuno Caio Graco encaminhou uma proposta à Assembleia referente aos direitos de voto e cidadania para os aliados. Embora não tão abrangente quanto a lei de Flaco, o tribuno propunha que os detentores de Direitos Latinos recebessem a cidadania romana. Os aliados, por seu turno, passariam a desfrutar dos Direitos Latinos. Porém, para que isso ocorresse, os aliados precisavam abrir mão de suas reivindicações de distribuição de terras. Eles recusaram. O fracasso de Caio foi devido, em parte, ao agora cônsul Lúcio Opímio, que queria destruí-lo politicamente. O cônsul teve sucesso. Caio e Flaco teriam o mesmo destino do irmão de Caio: a morte. Flaco acabou executado numa rua lateral na Colina Aventina, enquanto Caio escolheu morrer por conta própria, ordenando ao seu escravo que o esfaqueasse no pescoço. Pelo menos 250 pessoas morreram naquele dia e milhares de outros foram executados nos dias seguintes. Opímio havia eliminado todos os apoiadores de Caio Graco em Roma - até mesmo o filho de Flaco que, ao menos, escolheu sua própria maneira de morrer.
Em 95 a.C., Lúcio Licínio Crasso (140-91 a.C.) tornou-se cônsul e propôs a formação de uma comissão para limpar as listagens de cidadania. Há anos, aliados haviam se mudado para Roma e ilegalmente relacionados como cidadãos. Crasso e seu companheiro de consulado, Quinto Múcio Cévola, propuseram uma lei para expulsar todos os italianos ilegais da cidade e, em consequência, somente os romanos poderiam votar.
A tocha da cidadania italiana foi passada para o rico e ambicioso aristocrata Marco Lívio Druso (O Jovem, c. 124-91 a.C.). Eleito tribuno em 91 a.C., já tendo ocupado os cargos tanto de praetor e aedile, como Caio Graco, ele acreditava na distribuição de terras aos pobres. Druso propôs tanto a fundação de colônias para reduzir a pressão populacional quanto a cidadania completa para os latinos e os aliados italianos. Novamente, como ocorrera na época de Caio Graco, o Senado considerou que a concessão da cidadania aos aliados iria torná-los poderosos demais. E, como seu predecessor, Druso foi assassinado. Em sua obra Cícero, Antony Everitt descreve a hora final da vida de Druso. Enquanto realizava uma reunião em sua casa, "... ele repentinamente gritou que havia sido esfaqueado e caiu com estas palavras em seus lábios." (36) O assassino jamais foi capturado. Suas leis foram anuladas pelo cônsul Lúcio Márcio Filipe.
Fora de Roma, o clima tornou-se tenso e febril após a morte de Druso. Um velho amigo do tribuno falecido, Quinto Popédio Silão, da tribo dos Marsos, ajudara a convencê-lo de que os italianos receberiam com prazer a reforma agrária, mas também buscavam a cidadania completa. O assassinato de seu defensor fez com que muitos aliados decidissem que era a hora de entrar em ação. Quando a guerra finalmente começou, os romanos ficaram em choque; não haviam considerado enfrentar um inimigo treinado e equipado por Roma.
A Guerra Começa
Em 91 a.C., chegaram notícias de que a cidade de Ásculo havia tomado cidadãos romanos como reféns. Um pretor foi enviado para investigar - foi assassinado; outros romanos tiveram o mesmo destino. Tom Holland, em sua obra Rubicão, descreve o tumulto dentro da cidade:
Quando os rebeldes capturaram Ásculo, a primeira cidade a cair em seu poder, eles massacraram cada romanos que puderam encontrar. As esposas daqueles que se recusaram a se juntar a eles foram torturadas e escalpeladas. (51)
Duncan ressaltou que a velocidade “com a qual a revolta se espalhou é uma comprovação do longo planejamento por parte dos italianos” (172). Ele acrescentou que houve uma grande e coordenada insurreição de no mínimo doze tribos. Nem todos, porém, ficaram contra Roma: os latinos, bem como os umbrianos, etruscos e as colônias gregas do sul recusaram-se a aderir à rebelião. As maiores tribos que lideraram o assalto foram os Samnitas e os Marsos - os últimos liderados por Silão. Os representantes dos aliados se encontraram na cidade de Corfínio, renomearam-na como Itália e a fizeram sua nova capital. O novo governo tinha um Senado, magistrados e até mesmo cunhagem de moedas. O exército totalizava 100.000 homens. O conselho italiano apresentou suas demandas a Roma: civitas (cidadania) ou libertas (independência).
Nesse meio tempo, a luta continuava através de toda a península. Os rebeldes assumiram o controle da Campânia, Apúlia e Lucânia. O Senado romano entrou em pânico, tentando organizar uma resposta. As lideranças tentaram - antes de lutar de verdade contra os rebeldes - encontrar alguém para culpar pela insurreição. Quinto Vário Severo Híbrida propôs uma comissão para expurgar todos aqueles favoráveis à cidadania italiana, na crença de que os aliados teriam sido incitados com falsas promessas. A lei foi aprovada e logo se seguiram os exílios. Como os rebeldes continuassem os ataques contra Roma, o governo percebeu que era hora de um contra-ataque. O cônsul Lúcio Júlio César foi encarregado de lutar contra os samnitas no sul, enquanto seu colega de consulado Públio Rutílio Lupo dirigiu-se ao norte para enfrentar os marsos. Por fim, Sexto César dirigiu-se a Ásculo. Entre os que lutaram contra os aliados estava Lúcio Cornélio Sula. Ele logo suplantaria Mário como o maior general romano de sua época.
O Senado finalmente fez uma tentativa de satisfazer os rebeldes. A Lex Julia, proposta por Lúcio Júlio César (c. 134-87 a.C.) ofereceu cidadania total para os italianos que não pegassem em armas contra Roma. Enquanto isso, comunidades da Gália Cisalpina recebiam a cidadania por iniciativa de Cneu Pompeu Estrabão (cônsul em 89 a.C.), e os gauleses ao norte do Rio Pó passaram a ter Direitos Latinos. Outra legislação, a Lex Plautia Papiria, concedeu a cidadania às comunidades italianas que ainda estavam em guerra. Estas leis evitaram que a rebelião se espalhasse.
Conclusão
Ao final do ano 89 a.C., a Guerra Social perdeu seu ímpeto; a população tinha sido devastada com mais de 100.000 mortos, a economia sofrera, a produtividade decaíra, havia falta de grãos e propriedades haviam sido confiscadas. Os combates ao norte chegaram ao fim por uma combinação de diplomacia e luta. Porém, mesmo com a vitória cada vez mais distante, os italianos diferiam em suas reações; alguns estavam determinados a lutar, enquanto outros tentavam um acordo. Entre aqueles que desejam a continuidade da guerra estava Silão, que liderava mais de 10.000 soldados. Silão enfrentou os romanos na Apúlia. Junto com 1.100 de seus seguidores, pereceu na batalha. Isso marcou o fim da guerra.
Na obra Cícero, Anthony Everitt afirma que a guerra assinalou uma nova e sangrenta espiral rumo ao caos político e social. Com o final das hostilidades, o número de cidadãos romanos triplicou. A inclusão dos novos cidadãos nas tribos veio à baila, mas nenhum sistema de registro de eleitores jamais foi implantado. Somente aqueles com dinheiro poderiam viajar para Roma para votar. Entretanto, após o final da guerra, o soldado-ala finalmente teve permissão de se juntar às legiões.