O termo ciência vem da palavra latina scientia, significando “conhecimento”. Ela pode ser definida como uma tentativa sistemática de descobrir, por meio da observação ou raciocínio, fatos específicos sobre o mundo; para estabelecer leis conectando os fatos uns com os outros; e, em alguns casos, possibilitar a predição de futuras ocorrências. Há outros meios de definir ciência, mas todas as definições referem-se, de um jeito ou de outro, a esta tentativa de descobrir fatos específicos e a habilidade de entender os padrões aos quais estes fatos estejam conectados.
Há uma citação interessante de Carl Sagan sobre a atitude científica:
Se nós vivêssemos num planeta onde nada mudasse nunca, haveria pouco a fazer. Não haveria o que descobrir. Não haveria ímpeto para a ciência. E se vivêssemos num mundo imprevisível, onde as coisas mudassem de formas aleatórias ou muito complexas, não seríamos capazes de compreendê-las. Mas vivemos num mundo médio, no qual as coisas mudam, mas de acordo com padrões, regras ou, como costumamos chamá-las, leis da natureza. Se eu jogo uma vareta para o alto, ela sempre cai. Se o sol se põe no oeste, sempre nasce novamente, na manhã seguinte, a leste. E, assim, torna-se possível compreender o que está ao nosso redor. Podemos fazer ciência e, com ela, melhorar nossas vidas. (Carl Sagan, 59)
Os Primeiros Desenvolvimentos Científicos
A ocorrência regular de eventos naturais encorajou o desenvolvimento de algumas disciplinas científicas. Após um período de observação e registro cuidadoso, até mesmo alguns dos eventos aparentemente aleatórios e imprevisíveis começam a exibir um padrão regular, que inicialmente não parecia óbvio. Eclipses são um bom exemplo.
Na América do Norte, os cherokee diziam que os eclipses eram causados quando a lua (masculina) visita sua esposa, o sol, e os ojibway acreditavam que o sol seria totalmente extinto durante um eclipse, de forma que costumavam atirar flechas para mantê-lo aceso. Stephen Hawking menciona que, de acordo com os vikings, o sol e a lua são caçados por dois lobos, Skoll e Hati. Quando os lobo alcançam suas presas, um eclipse ocorre. Os nórdicos então faziam o maior barulho possível para afugentar os lobos e, assim, salvar as vítimas:
Skoll é como se chama o lobo que persegue o deus iluminado
para as árvores protetoras;
e outro é Hati, ele é o filho de Hrodvitnir
que persegue a brilhante noiva do céu.
(Edda Poético. Os Ditos de Grimnir, 39)
Hawking continua dizendo que as pessoas eventualmente perceberam que o sol e a lua emergiriam do eclipse da mesma forma, independente do barulho que fizessem para resgatá-los. Em sociedades onde se mantinham registros dos eventos celestiais, notou-se com o tempo que eclipses não ocorriam aleatoriamente, mas sim em padrões regulares que se repetiam.
Alguns eventos naturais claramente ocorriam de acordo com regras, mas havia outros que não apresentavam um padrão claro e, assim, suas causas específicas não ficavam claras. Terremotos, tempestades e epidemias pareciam acontecer aleatoriamente, sem uma explicação natural. Assim, surgiram justificativas sobrenaturais para dar conta destes eventos, a maioria das quais misturada com mitos e lendas.
As explicações sobrenaturais deram origem à mágica, numa tentativa de controlar a natureza por meio de rituais e encantamentos. A mágica é baseada na confiança das pessoas de que a natureza pode ser diretamente controlada. O pensamento mágico está convencido de que, ao realizar certos feitiços, eventos específicos vão acontecer. James Frazer sugeriu que há um elo entre a mágica e a ciência, desde que ambos se baseiam no princípio da causa-e-efeito. Na mágica, as causas são incertas e tendem a ser baseadas em pensamentos espontâneos, enquanto a ciência fundamenta-se na observação cuidadosa e no raciocínio e, assim, as causas são melhor definidas e compreendidas. A ciência baseia-se na ideia de que a experiência, esforço e razão são válidas, enquanto a mágica confia na intuição e esperança. Nos tempos antigos, era comum que a ciência se fundisse com a mágica, religião, misticismo e filosofia, já que os limites da disciplina científica ainda não eram inteiramente compreendidos.
Ciência na Babilônia
Como no Egito, os sacerdotes incentivaram bastante o desenvolvimento da ciência babilônica. Os babilônios usavam o sistema numérico de base 60, que permitia a divisão do círculo em 360 graus. O uso de um sistema matemático de base 60 não é fortuito: o número 60 tem muitos divisores (1, 2, 3, 4, 5, 6, 10, 12, 15, 20, 30, 60), o que simplifica as representações de frações: 1/2 (30/60), 1/3 (20/60), 1/4 (15/60), 1/5 (12/60), 1/6 (10/60), e assim por diante. Já por volta de 1800 a.C., os matemáticos babilônicos entendiam as propriedades das sequências elementares, tais como progressões aritméticas e geométricas, e várias relações geométricas. Eles estimaram o valor de pi como 3 1/8, com um erro de apenas 0,6%. É altamente provável que também estivessem familiarizados com o que chamamos atualmente de Teorema de Pitágoras, segundo o qual o quadrado do lado mais longo de um triângulo (hipotenusa) é igual à soma dos quadrados dos outros dois lados (catetos). Porém, não temos nenhuma evidência de que os babilônios tenham provado isso formalmente, já que sua matemática se apoiava mais no conhecimento empírico do que nas provas formais.
Foi na astronomia que os babilônios mostraram um talento admirável – e a mágica, misticismo, astrologia e divinação eram suas motivações principais. Eles acreditavam que o movimento dos corpos celestiais permitia prever certos eventos terrestres. Desde o reinado de Nabonassar (747 a.C.), mantinham listas pormenorizadas de eclipses e, por volta de 700 a.C., já se sabia que os eclipses solares só podiam ocorrer durante a lua nova e os eclipses lunares nas luas cheias. É possível que nesta época os babilônios também soubessem da regra segundo a qual eclipses lunares aconteciam a cada seis meses, ou ocasionalmente a cada cinco meses. Na época em que Nabucodonosor governou a Babilônia, os sacerdotes também já tinham calculado os cursos dos planetas e traçado as órbitas do sol e da lua.
Ciência no Egito
A despeito de suas superstições, os sacerdotes egípcios encorajaram o desenvolvimento de muitas disciplinas científicas, especialmente astronomia e matemática. A construção das pirâmides e de outros incríveis monumentos seria impossível sem um conhecimento matemático altamente desenvolvido. O Papiro Matemático Rhind (também conhecido como Papiro Ahmes ou Amósis) é um tratado matemático antigo, datado de aproximadamente 1650 a.C.. Esta obra explica, usando vários exemplos, como calcular a área de um campo, a capacidade de um celeiro e também lida com equações algébricas de primeiro grau. Na seção de abertura, o autor, um escriba chamado Ahmes (ou Amósis), declara que o Papiro é uma transcrição de uma cópia antiga, possivelmente feita 500 anos antes da sua época.
A inundação do Nilo, que alterava constantemente os marcadores dos lotes agrícolas, também encorajou o desenvolvimento da matemática: os inspetores tinham de realizar medições constantes para restaurar os limites perdidos. De fato, esta é a origem da palavra geometria: "medição da terra". Os inspetores de terra egípcios tinham mentes práticas: para formar ângulos retos, o que era essencial para determinar os limites de um campo, eles usavam uma corda dividida em doze partes iguais, formando um triângulo com três partes num lado, quatro no segundo e cinco no terceiro. O ângulo reto encontrava-se onde o lado com três partes juntava-se ao de quatro. Em outras palavras, os egípcios sabiam que um triângulo cujos lados tinham uma razão de 3:4:5 é um triângulo reto. Este é um princípio básico útil e também um passo adiante do Teorema de Pitágoras, que é baseado em estender o conceito do triângulo 3:4:5 para seu limite lógico.
Os egípcios calcularam o valor da constante matemática pi em 256/81 (3,16) e para o valor da raiz quadrada de dois, usavam a fração 7/5 (a que eles chegavam como 1/5 sete vezes). Para frações, sempre utilizavam o algarismo 1 (com o objetivo de expressar 3/4, escreviam 1/2 + 1/4). Infelizmente, não conheciam o zero e seu sistema numérico carecia de simplicidade: 27 sinais eram requeridos para expressar 999.
Ciência na Grécia
Diferente de outras partes do mundo, onde a ciência conectava-se fortemente com a religião, o pensamento científico grego tinha uma conexão mais forte com a filosofia. Como resultado, o espírito científico grego apresentava uma abordagem secular e foi capaz de substituir a noção da explicação sobrenatural com o conceito de um universo governado pelas leis da natureza. A tradição grega credita a Tales de Mileto, por volta de 600 a.C., o desenvolvimento da ideia de que o mundo pode ser explicado em termos naturais. Tales vivia em Mileto, uma cidade grega situada na Jônia, a região central da costa do Egeu na Anatólia, Ásia Menor, atualmente Turquia. Esta cidade foi o principal foco do "despertar jônico", a fase inicial da civilização grega clássica, uma época quando os antigos gregos desenvolveram várias ideias surpreendentemente similares a alguns de nossos modernos conceitos científicos.
Uma das grandes vantagens da Grécia foi a influência dos matemáticos egípcios, quando o Egito abriu seus portos ao comércio grego durante a 26ª Dinastia (c. 685-525 a.C.) e a astronomia babilônica, após a conquista da Ásia Menor e Mesopotâmia por Alexandre, o Grande, no período helenístico. Os gregos foram muito talentosos ao inovar sistematicamente o conhecimento matemático e astronômico egípcio e babilônico. Isso transformou os gregos em alguns dos mais competentes matemáticos e astrônomos da Antiguidade e suas realizações em geometria possivelmente foram as mais expressivas.
Ainda que a observação importasse mais no início, a ciência grega eventualmente começou a valorizá-la menos do que o processo dedutivo, no qual o conhecimento é construído por meio do pensamento puro. Este método é fundamental na matemática e os gregos o enfatizaram tanto que acreditavam erroneamente que a dedução seria o meio de obter o maior nível de conhecimento. A observação foi subestimada, a dedução venceu e o conhecimento científico grego conduzido a um beco sem saída em virtualmente cada ramo do conhecimento com exceção das ciências exatas (matemática).
Ciência na Índia
Na Índia, já encontramos alguns aspectos da ciência astronômica nos Vedas (compostos entre 1500 e 1000 a.C.), no qual o ano é dividido em doze meses lunares (ocasionalmente adicionando um mês para ajustar o ano lunar com o ano solar), seis estações do ano recebem nomes e estão relacionadas a diferentes deuses, e também se observam as fases da lua, personificadas como diferentes divindades. Várias cerimônias e rituais de sacrifício da sociedade indiana aconteciam conforme a posição da lua, do sol e outros eventos astronômicos, o que estimulava um estudo detalhado da astronomia.
A geometria desenvolveu-se na Índia como resultado das regras religiosas estritas para a construção de altares. O Livro 5 do Taittiriya Samhita, que integra o Yajur-Veda, descreve as diferentes formas permitidas para os altares. O mais antigo destes altares tem o formato de um falcão e uma área de 7,50 purushas quadrados (um purusha era uma unidade equivalente à altura de um homem com braços levantados, cerca de 2,3 metros). Em algumas ocasiões requeriam-se outros formatos de altares (tais como uma roda, tartaruga ou triângulo), mas a área deveria permanecer a mesma, 7,5 purushas quadrados. Algumas vezes o tamanho do altar precisava ser aumentado sem o aumento da forma ou da proporção relativa da figura. Todos estes procedimentos seriam impossíveis sem um conhecimento preciso de geometria.
Uma obra conhecida como o Sulbasutras, inicialmente composta na Índia por volta de 800 a.C., contém explicações detalhadas de como realizar as operações geométricas necessárias para apoiar os procedimentos religiosos relativos aos altares. Este texto também aborda tópicos matemáticos, tais como raízes quadradas e a quadratura do círculo. Depois do desenvolvimento de importantes estudos geométricos, as práticas religiosas indianas mudaram e a necessidade de conhecimento geométrico gradualmente morreu, pois a construção de altares caiu em desuso.
Possivelmente a realização mais influente da ciência hindu foi o estudo da aritmética, particularmente o desenvolvimento dos algarismos e da notação decimal que o mundo utiliza atualmente. Os chamados “algarismos arábicos” na verdade originaram-se na Índia; eles já aparecem nos Éditos na Rocha do imperador mauriano Ashoka (século III a.C.), cerca de 1.000 anos antes de serem usados na literatura arábica.
Ciência na China
Na China, o sacerdócio nunca teve poder político significativo. Em muitas culturas, a ciência foi estimulada pelos sacerdotes, interessados na astronomia e no calendário, mas, na China, os oficiais governamentais, que detinham o poder e se preocupavam com estas questões, assumiram esse papel, tornando-se estreitamente ligados ao desenvolvimento do conhecimento científico chinês. Os astrônomos da corte estavam particularmente interessados na astronomia e matemática, pois o calendário era uma questão imperial sensível: a vida no céu e a vida na terra precisavam se desenvolver em harmonia e o sol e a lua regulavam os diferentes festivais. Durante a época de Confúcio (c. 551 a c. 479 a.C.), os astrônomos chineses calcularam com sucesso a ocorrência de eclipses.
A geometria desenvolveu-se como resultado da necessidade de medição de terras, enquanto a álgebra foi importada da Índia. Durante o século II a.C., após muitos séculos e gerações, completou-se o tratado matemático chamado Os Nove Capítulos sobre a Arte Matemática. Esta obra continha principalmente procedimentos matemáticos, incluindo tópicos como a determinação de áreas dos campos de diferentes formatos (para efeitos de taxação), o valor de diferentes mercadorias, taxa de câmbio de commodities e a correta cobrança de impostos. O livro desenvolve temas de álgebra e geometria e também menciona quantidades negativas pela primeira vez na história registrada. Zu Chongzhi (429-500 d.C.) estimou o valor correto de pi até a sexta casa decimal e aperfeiçoou o imã, que havia sido descoberto séculos antes.
Os chineses demonstraram um talento especial nas invenções. Pólvora, papel, impressão em tipos de madeira, o compasso (conhecido como a "agulha que aponta o sul") são muitas das várias invenções chinesas. A despeito de sua imensa criatividade, é irônico que a atividade industrial chinesa não tenha tido nenhum desenvolvimento significativo entre a Dinastia Han (206 a.C. - 220 d. C.) até a queda dos Manchus (1912).
Ciência na Mesoamérica
A astronomia e matemática na Mesoamérica eram altamente precisas. A precisão do calendário maia era comparável a dos egípcios (as duas civilizações fixaram o ano em 365 dias) e, já no século I d.C., os maias utilizavam o zero como indicador de valor em seus registros, muitos séculos antes do seu aparecimento na literatura europeia e asiática.
O registro temporal na Mesoamérica inclui um período de 260 dias conhecido como tzolkin, “contagem dos dias”, e tonalpohualli pelos astecas. Obtinha-se este intervalo combinando-se os ciclos de 20 dias com treze coeficientes numéricos (20 x 13 = 260). Presume-se que a origem deste intervalo ocorreu por volta do século VI a.C., na região meridional da Civilização Zapoteca, e está de acordo com alguns importantes eventos naturais: 260 representa uma boa aproximação do período de gestação humana e, na latitude média mesoamericana, está perfeitamente consistente com o ciclo agrícola. Há também um período de 360 dias, conhecido como tun pelos maias, composto de ciclos de 20 dias e 18 meses (20 x 18 = 360). A maioria dos calendários mesoamericanos baseava-se em um tun mais um mês adicional de cinco dias (360 + 5 = 365), o que representa uma boa aproximação do ciclo solar. Esta contagem regulava os feriados, cerimônias religiosas, sacrifícios, vida laboral, tributos e vários outros aspectos da vida religiosa, política e social.
A contagem de 260 e 365 dias acontecia simultaneamente e a cada 52 anos o ponto inicial de cada um coincidiria, um evento denominado como “calendário circular”. Códices astecas sugerem que nesta época o mundo estaria vulnerável à destruição, e em consequência realizavam a Cerimônia Asteca do Fogo Novo e vários sacrifícios e cerimônias religiosas para aplacar os deuses e garantir a manutenção da existência.
Os maias criaram o mais longo ciclo de calendário mesoamericano ao multiplicar um tun por 20 (360 dias x 20 = 7.200 dias, ou um katun) e um katun por 20 (7.200 dias x 20 = 144.000 dias, ou um baktun). A Contagem Longa Maia compunha-se de 13 baktuns (144.000 dias x 13 = 1.872.000 dias) ou 5.125,37 anos. A Contagem Longa Maia começou em 11 de agosto de 3114 a.C. e terminou em 21 de dezembro de 2012.